© USP/Divulgação
"A universidade, historicamente, sempre foi um ambiente de uma esquerda mais presente. O que a gente não sabia era que o outro lado [direita] viria a se manifestar assim." A análise é de Fábio Frezatti, diretor da FEA (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade), da Universidade de São Paulo.
PUB
Uma das faculdades de maior prestígio da USP, a FEA entrou no centro de uma polêmica nesta segunda-feira (29), após a divulgação de uma fotografia clicada em uma sala da instituição que mostra quatro rapazes com armas, cartazes de ódio às mulheres e simpatia à campanha do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL).
+ USP investiga quem são fãs de Bolsonaro armados em foto na faculdade
"A diversidade de opiniões não é ruim porque é própria do ambiente universitário. O que é ruim é a agressividade e a falta de respeito. Esse tipo de comportamento não era evidenciado até então", completa o diretor que leciona na USP há 21 anos.
De acordo com Frezatti, os três jovens que aparecem na fotografia com o rosto à mostra foram identificados, mas não tiveram os nomes divulgados oficialmente. Eles são estudantes do curso de administração da FEA. O quarto integrante da foto, que segura uma bandeira nacionalista americana, ainda não é conhecido. A Folha de S.Paulo procurou, mas não conseguiu localizar os universitários envolvidos.
Todos eles vão responder a uma sindicância interna aberta pela faculdade para apurar a responsabilidade de cada um na fotografia ofensiva. A comissão de investigação, formada por um professor de cada curso da FEA, terá 60 dias para concluir o caso e emitir uma penalidade, que varia de uma advertência verbal à expulsão.
Os estudantes envolvidos no caso vão poder frequentar as aulas normalmente durante a apuração. "As pessoas esperam soluções muito rápidas, mas temos que seguir todo um roteiro jurídico para garantir uma decisão adequada e justa."
Para o dirigente da FEA, o que mais assustou na fotografia foi a exaltação às armas, mesmo se elas forem de brinquedo. "A gente não imagina em um ambiente que prega a liberdade e respeito exista alguém com esse tipo de pensamento. É um tipo de posicionamento que causa surpresa e decepção."
O caso, segundo o diretor, representa um alerta. "Vamos ter que ampliar os nossos canais de comunicação e acompanhamento dos estudantes para não acontecer nos corredores da FEA o que vimos nas ruas durante as eleições". A FEA possuía 2.622 alunos matriculados em 2016 (dado mais atual), segundo estatística da USP.
Uma das medidas citadas por Frezatti está no fortalecimento da comissão de bem-estar, responsável por prestar auxílio psicológico aos universitários.
Para o Centro Acadêmico Visconde de Cairu, da FEA, apesar de a foto ter um cunho eleitoral, não se trata de uma simples manifestação política. "É um retrato misógino e violento, de caráter fascista, que ameaça os direitos democráticos da coletividade dos estudantes", segundo trecho de nota.
"A foto faz parte de uma onda de extremismo e práticas violentas por todo país. Só em nossa universidade, observamos também suásticas sendo pintadas na porta de residências estudantis e apologia à violência dentro dos campi. Diante deste cenário, é preciso que nós tenhamos posicionamento em nome da democracia e pela paz."
Nesta quinta (1º de novembro), o centro acadêmico, em parceria com a FEA, vai promover um fórum entre estudantes, funcionários e professores para discutir temas como intolerância e insegurança.
PROTESTOS
Dois grupos, um a favor de Jair Bolsonaro (PSL) e outro contrário, fizeram marchas dentro do campus da USP nesta segunda (29), e promoveram uma disputa "ele sim" versus "ele não" entre os prédios da universidade, no Butantã (zona oeste).
O ato em apoio ao presidente eleito reuniu cerca de 20 pessoas -a maioria não estuda na USP. Organizado em resposta, um protesto "contra o fascismo" e pela democracia atraiu em torno de mil pessoas, segundo estimativa da guarda universitária.
O evento "Marcha do Chola Mais", marcado pelo Facebook para "cantar e comemorar" a vitória de Bolsonaro, recebeu mais de 2.800 confirmações de presença até a tarde desta segunda.
Os seguidores do capitão reformado criticavam o que chamam de doutrinação de esquerda nas universidades públicas e de perseguição a militantes de direita. Queriam "mostrar que a USP não é hegemônica da esquerda, dos comunistas".
Um dos organizadores foi o deputado estadual eleito pelo PSL em São Paulo Douglas Garcia, 24, que não estuda na instituição. Cofundador do movimento Direita São Paulo, ele discursou no fim do ato e criticou o que classifica como uso de recursos públicos para difundir ideologias políticas.
De acordo com Garcia, o ato foi organizado a pedido de alunos da USP que se sentem intimidados a se declarar de direita no ambiente universitário. O evento na rede social foi criado pela página USP Livre, uma organização de estudantes identificados com o liberalismo econômico e o conservadorismo. Com informações da Folhapress.