Brasil estava desesperado antes de ganhar cubanos, diz membro da Opas

Joaquín Molina disse saber que rompimento era uma possibilidade

© Ueslei Marcelino/Reuters

Brasil MAIS MÉDICOS 27/11/18 POR Folhapress

Para o representante da Opas (Organização Pan-Americana de Saúde) no Brasil, Joaquín Molina, a chegada de médicos cubanos para atuar no Mais Médicos representou uma resposta emergencial a um momento em que o país "estava desesperado" devido à falta de profissionais no interior.

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Segundo Molina, que está no país desde 2012 e acompanhou o programa desde o início, "a necessidade de médicos estrangeiros era óbvia".

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"Quando o Brasil criou o programa Mais Médicos, ele estava em uma situação desesperada, com milhares de vagas lançadas sucessivamente todos os anos [pelos municípios] e não ocupadas. E as que estavam ocupadas eram de forma parcial. Havia médicos por oito horas, 20 horas na semana, mas nunca com jornada de 40 horas", afirma.

Cinco anos depois, ele diz que o alto número de médicos intercambistas em lugares onde não houve interesse de brasileiros mostra que problema da carência e má distribuição de médicos no país ainda persiste. "A situação se mantém. Hoje o Mais Médicos tem mais de 12 mil médicos, somando cubanos, brasileiros e estrangeiros formados no exterior. É um número expressivo."

No dia 14, Cuba anunciou o fim da parceria com o Mais Médicos. Desde 2013, a vinda era intermediada pela Opas, que firmou convênio com Brasil e Cuba. A decisão foi atribuída a declarações do presidente eleito, Jair Bolsonaro, que vinha manifestando interesse em modificar o acordo com os médicos do país.

Para Molina, a possibilidade de rompimento já era esperada. Segundo ele, a entidade já mantinha planos de contingência prontos para caso tivesse que ser organizada a saída dos médicos.

"A decisão foi de Cuba, mas não surpreende. Seria difícil que continuassem nas condições atuais", disse em entrevista após evento de 30 anos do SUS.

Embora evite se posicionar sobre as declarações de Bolsonaro, o representante da organização internacional rebate as críticas sobre a formação dos médicos do país.

Cubano, Molina se formou em odontologia no país caribenho antes de se especializar em saúde internacional e ingressar na Opas em Washington, em 1989. Ainda no país onde nasceu, trabalhou três anos -exigência que vale para outras profissões na saúde, diz.

"É um médico com prática. Cuba nunca mandou para o Brasil um médico recém-graduado, só aqueles com experiência. Também estava sob um supervisor e tutor", afirma ele, que lembra que a atuação de médicos sem diploma revalidado também ocorre em cooperação com outros países.

"Quantas missões solidárias não recebem outros países? E as operações internacionais de grupos de muito prestígio, como Médicos Sem Fronteiras? Todos são médicos sem CRM".

MAIS DE MIL JÁ VOLTARAM

Dados da Opas divulgados nesta terça apontam que 1.307 médicos já retornaram a Cuba após o fim da participação do país no programa Mais Médicos. Eles atuavam em 16 Dseis (distritos sanitários especiais indígenas) e em 733 municípios de 26 estados.

A previsão é que todos os profissionais deixem o país até 12 de dezembro.

Segundo Molina, durante o processo de organização dos voos, alguns médicos têm pedido para ficar no Brasil. "Muitos nos falaram: não compre passagem para mim, porque vou ficar", disse.

Ele afirma não ter dados de quantos médicos pediram para continuar.

Por outro lado, segundo ele, a Opas já recebeu pedidos de cubanos que se casaram com brasileiros para que a família possa ir junto no voo ao país caribenho.

A saída, porém, é restrita aos profissionais do programa, informa. Atualmente, a Opas estima que 1.400 cubanos tenham se casado com brasileiros.

Questionado, Molina rebate as críticas de que médicos eram submetidos a trabalho "escravo", argumento que tem sido repetido por Bolsonaro.

"O médico cubano tem vantagem que não tem nenhum outro médico estrangeiro por aqui. Ele mantém seu posto de trabalho em Cuba, seu salário e seu benefício de previdência. Para qualquer médico português ou espanhol isso não conta."

Para ele, além de manter os benefícios aos médicos, o período de cooperação teve vantagem "notável" ao Brasil. "Se um médico deixava o trabalho por um motivo que for, era substituído sem custo. Se um brasileiro com CRM diz 'vou embora', você tem que aguardar um edital para substituir".

PROGRAMA 'SÓLIDO'

E como fica o Mais Médicos com a saída dos cubanos?

Questionado, o representante diz não ver motivo nega que o programa esteja ameaçado, mas avalia que, em algum momento, é esperado que ele seja revisto. "Sabemos que não é para sempre."

Para ele, porém, dados de avaliações mostram que o Mais Médicos teve sucesso.

"Poucos programas de saúde têm o suporte de uma lei criada em 2013 e renovada em 2016, em duas legislaturas diferentes, além de uma decisão da Suprema Corte. Por isso falamos que o Mais Médicos é um programa de Estado, não de governo." Com informações da Folhapress.

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