© José Cruz/Agência Brasil
A procuradora-geral da República, Raquel Dodge, emitiu pareceres em série contra a reforma trabalhista. As manifestações foram apresentadas ao STF (Supremo Tribunal Federal) dias antes do início do recesso do Judiciário.
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Parte das ações aguardava pela opinião da PGR para a corte dar prosseguimento à análise dos casos. Na quarta-feira (19), quatro posicionamentos de Dodge entraram no sistema do STF.
Todos eles são contrários total ou parcialmente a novas regras da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), em vigor desde 11 de novembro de 2017. As mudanças foram aprovadas pelo Congresso e implementadas pelo governo Michel Temer.
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As manifestações de Dodge se dão às vésperas do início do mandato do presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL). Ele propõe maior flexibilização das leis trabalhistas.
Em todas as ações, a Câmara dos Deputados diz que seguiu a tramitação legal. Senado Federal, AGU (Advocacia-Geral da União) e Presidência da República defendem a constitucionalidade da lei.
Dodge, porém, rejeita a correção de dívidas trabalhistas pela TR (taxa referencial) e a de depósitos judiciais pela poupança.
São dois pareceres. O tema é discutido em uma ADI (ação direta de inconstitucionalidade) e uma ADC (ação declaratória de constitucionalidade).
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Para Dodge, a correção pela TR é uma violação do direito de propriedade.
"A inovação trazida pela lei 13.467 [reforma trabalhista], com adoção do índice da caderneta de poupança para a atualização monetária, foi positivada com ofensa aos esteios constitucionais, sendo imperiosa a utilização de outro índice", diz a procuradora-geral.
Ela ainda lembra que decisões do STF sobre correção monetária em condenações impostas ao poder público exigem a reposição da inflação.
Dodge sugere que a Justiça do Trabalho adote o IPCA-E (Índice de Preços ao Consumidor Amplo-Especial), do IBGE.
Hoje, parte dos juízes já usa esse índice, cuja divulgação, ao contrário do IPCA, a inflação oficial do país, é trimestral. O IPCA é mensal.
A procuradora-geral também é contra a fixação de indenização por dano moral atrelada ao salário.
A nova CLT prevê uma escala de ofensas. Elas vão de natureza leve a gravíssima. O juiz pode conceder uma indenização que varia de três vezes o salário do empregado a 50 vezes a sua remuneração.
Antes da reforma, cabia ao juiz estabelecer o valor.
Para Dodge, as novas regras são discriminatórias e afetam o direito da personalidade.
"Ao utilizar esse parâmetro, a norma valora a reparação do dano moral sofrido pelo trabalhador conforme a posição salarial por ele alcançada no mercado de trabalho, submetendo a dignidade humana, objeto da tutela, à estratificação monetária por status profissional", afirma.
Outro ponto atacado é o trabalho de gestante ou lactante em local insalubre. Pela reforma, o afastamento se dará após apresentação de atestado médico com essa recomendação.
"A (suposta) proteção -ou melhor, desproteção- que encerra não atende à urgência reclamada pela situação de vulnerabilidade da trabalhadora gestante ou lactante, nem condiz com a relevância dos bens jurídicos em questão (vida, saúde, maternidade, infância e trabalho digno e seguro)", afirma Dodge.
Para ela, a regra significa "retrocesso social".
Em outra ação, no fim de outubro, Dodge se manifesta sobre um dispositivo da nova lei que obriga a definição do valor da causa (quanto o trabalhador quer receber) já na petição inicial. Ela propõe uma interpretação à lei que tire seu caráter compulsório.
Para o advogado Jorge Pinheiro Castelo, do escritório Palermo e Castelo, os pareceres adequam regras da reforma justamente para que possam ter aplicação e trazer segurança jurídica. "A reforma em alguns pontos saiu da curva", afirma Castelo.
O presidente da Anamatra (associação de juízes trabalhistas), Guilherme Feliciano, destaca os aspectos jurídicos das manifestações da PGR.
"A crítica [da Anamatra, autora de ADIs] era técnica, e isso agora se revela pela caneta da PGR, que, a partir de uma análise equidistante e ponderada, aponta vários dos vícios de inconstitucionalidade da reforma", diz Feliciano.
De sete pontos polêmicos, a PGR defendeu a constitucionalidade de dois.
Dodge apoiou o fim do imposto sindical obrigatório. Ela deu aval ao trabalho intermitente -sem carga horária predefinida-, cujo julgamento foi suspenso e será retomado no dia 12 de junho de 2019.
Não há previsão para a análise dos outros casos.
Projeto de lei sobre gestante e lactante é aprovado no Senado
O Senado aprovou na terça-feira (18) o projeto de lei que altera regras sobre o afastamento de gestantes e lactantes em trabalho insalubre. O texto seguirá para a Câmara.
Segundo o projeto do senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), apenas poderá trabalhar em local de insalubridade mínima ou média a gestante que apresentar laudo de médico de confiança atestando sua capacidade de continuar no serviço.
O assunto foi tratado em medida provisória que caducou em abril, porque não foi votada pelo Congresso.
O texto da MP era parte de acordo do governo Michel Temer para que se aprovasse a reforma no Senado sem alterações, ou o texto teria de voltar para a Câmara.
A proposta aprovada na reforma de 2017 estabelecia o contrário: para ser afastada de local insalubre mínimo ou médio, a mulher deveria apresentar atestado comprovando a necessidade de afastamento.
Estoque de ações à espera de julgamento cai a patamar de 2012
Com a reforma trabalhista, o número de processos pendentes de julgamento caiu ao menor volume em seis anos.
Segundo o TST (Tribunal Superior do Trabalho), em outubro deste ano, últimos dados disponíveis, a Justiça do Trabalho tinha 1,2 milhão de ações à espera de julgamento.
O número é igual ao registrado no fim de 2012.
Desde o começo do ano, a redução é de 33%, e o estoque não para de baixar. Em dezembro de 2017, a Justiça do Trabalho acumulava um estoque de processos pendentes de 1,8 milhão.
As mudanças introduzidas pela reforma trabalhista impactaram diretamente o dia a dia das varas de todo o país.
Além de desafogar os estoques de processos e agilizar os julgamentos, a nova lei também fez cair o número de novas ações ajuizadas.
Neste ano, houve uma queda de 37% nos novos casos.
OS QUESTIONAMENTOS NO SUPREMO
Quem ajuizou as ações?
- PGR (Procuradoria-Geral da República)
- Confederações sindicais
- Entidades de classe de âmbito nacional
31
ações diretas de inconstitucionalidade ou declaratórias de constitucionalidade ao menos foram ajuizadas no Supremo com questionamentos a pontos da reforma trabalhista
11
processos estão pendentes de julgamento -de uma só vez, 20 ações caíram quando o Supremo julgou constitucional o fim do imposto sindical obrigatório
Como funciona o julgamento
- Pela Constituição, a PGR deve ser ouvida em todas ADIs (ações diretas de inconstitucionalidade)
- Apontado o relator por sorteio, ele deve organizar o processo e enviá-lo ao pleno, com 11 ministros
Temas à espera de julgamento
- Contrato intermitente (julgamento em 12 de junho de 2019)
- Gratuidade da Justiça
- Valor da causa
- Correção monetária
- Indenização por dano moral
- Trabalho insalubre de gestante e lactante