© Valter Campanato/Agência Brasil
O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tomou posse nesta quarta (2) com um discurso conciliador e apelando à oposição por um pacto para que ajude a gestão Jair Bolsonaro (PSL) a governar o país. Na frente do chefe, afirmou que ele não "recebeu um cheque em branco" da população ao ser eleito no segundo turno contra Fernando Haddad (PT).
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Na véspera, o presidente havia citado a necessidade de apoio parlamentar em discurso no Congresso, mas sua fala pública na praça dos Três Poderes retomou a retórica agressiva da campanha eleitoral, dizendo que havia começado a libertar o país do "socialismo" associado ao PT.
A modulação do discurso parece indicar uma nova dinâmica no Planalto sob nova gestão, em que declarações incendiárias para galvanizar a base de apoio de Bolsonaro são intercaladas por falas apaziguadoras destinadas aos atores políticos.
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Bolsonaro deu posse, no Palácio do Planalto, a Onyx e ao secretário-geral da Presidência, Gustavo Bebianno (PSL-RJ). Os dois generais de quatro estrelas da reserva que integram o novo núcleo duro palaciano, Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Carlos Alberto dos Santos Cruz (Secretaria de Governo), também assumiram. O presidente não discursou ou deu declarações, saindo do evento para receber o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo.
Onyx, usualmente um crítico ácido do PT e da esquerda, afirmou que "o governo vai surpreender" por sua capacidade de diálogo com o Congresso, incluindo aí a oposição. "Não podemos errar, e uma das formas [para isso] é ter bons ouvidos para aqueles que se opem ao nosso governo", afirmou Onyx.
"Não é possível que a oposição não possa compreender, assim como o governo, que vamos ter que olhar primeiro para o Brasil, para as famílias brasileiras, presente das pessoas e garantir o futuro", completou.
O novo ministro disse ainda que as disputas políticas "podem e devem ser travadas", mas que "o diálogo será necessário" daqui para frente.
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Onyx era deputado do DEM-RS quando aderiu, há quase dois anos, ao projeto presidencial de Bolsonaro. Lembrou o preceito bíblico de que "muitos são chamados, poucos são escolhidos", e disse que o presidente foi "chamado por Deus". Citou o atentado a faca que ele sofreu em 6 de setembro, em Juiz de Fora. "Disse que estaríamos juntos para matar ou morrer", afirmou, completando que não imaginava que seria algo literal.
Ambos, ministro e presidente, demonstraram estar bastante emocionados durante o discurso. Elogiou a todos os presentes, em especial o general Heleno, conselheiro principal de Bolsonaro nos últimos dois anos. O chamou de "nosso guru" em mais de uma ocasião. O antecessor de Onyx, Eliseu Padilha, defendeu o legado de Michel Temer (MDB) e disse que o novo governo terá de mostrar serviço. "Desejo que tenha tanta ou mais sorte do que tivemos. E que consiga fazer mais, porque a expectativa do Brasil é muito grande e temos de corresponder, temos de ter ações para corresponder", afirmou.
Na mão inversa da fala de Onyx, Bebianno empunhou a bandeira retórica do bolsonarismo em seu discurso. Homem-forte da campanha, mas enfraquecido durante a transição, ele disse que "o amor à nossa Pátria seja resgatado, amplificado da mentalidade bolivariana que insiste em ameaçar democracias na América do Sul".
Além disso, assim como o chefe no discurso da posse da terça (1º), remeteu à facada e disse que houve "suor, lágrimas e literalmente sangue, sangue derramado no covarde atentado". Afirmou esperar que o "liberalismo econômico seja implantado em favor de nós" e acenou aos ministros militares, com quem teve diversas divergências na campanha e na transição.
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Já o general e "guru" Heleno foi econômico na fala, mas criticou duramente a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) por ter desmontado o sistema de inteligência do governo. Ao tomar posse, elogiou a gestão Michel Temer (MDB) por ter recomposto o GSI e o sistema brasileiro de inteligência. "Ele foi derretido pela senhora Rousseff, que não acreditava em inteligência", afirmou, em meio a risadas e aplausos da plateia. Dilma, ex-integrante de um grupo da luta armada contra a ditadura de 1964, havia extinguido o GSI em seu governo.
Ele é um dos mais duros críticos dos governos do PT, e foi colocado num cargo burocrático em 2009, após quase ser comandante do Exército sob o governo Lula, por ter criticado a política indigenista do petista. Também elogiou o antecessor, o também general Sérgio Etchgoyen, pela segurança rígida na posse de Bolsonaro. Agradeceu ao apoio da mulher, Sônia, pelo apoio.
Etchegoyen, em sua despedida, afirmou que Temer optou por ter como mote a coragem, e não a crise, a despeito dos turbulentos dois anos de seu mandato após o impeachment de Dilma em 2016. Elogiou Bolsonaro, dizendo que ele foi eleito porque "acredita em valores, ética e honestidade".
Em sua fala, o general Santos Cruz seguiu na linha conciliadora abraçada por Onyx. Ele disse que o governo estará aberto a todos os movimentos sociais, independentemente de quaisquer restrição ou dúvida. Bolsonaro já classificou o MST (Movimento Nacional dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), por exemplo, de grupo terrorista por suas ações de invasão de propriedade no campo. Outras entidades são genericamente classificadas como a serviço de alguma ideologia de esquerda.
O general afirmou que a secretaria continuará sendo "ponto de entrada e de relacionamento" da Presidência da República. "Estaremos sempre de portas abertas a todos os prefeitos, governadores, instituições e movimentos sociais, independentemente de qualquer consideração", afirmou. "Esse é o nosso espirito, independentemente de qualquer consideração que imponha qualquer restrição ou dúvida", disse ele, que já afirmara que iria receber integrantes do PT, maior rival de Bolsonaro à esquerda.
Em discurso de despedida da mesma pasta, Carlos Marun, disse que sua mulher fez uma homenagem ao novo governo na cerimônia de transmissão de cargo. "Ela veio de roupa verde-oliva hoje", brincou, em referência à cor do uniforme do Exército –há generais ocupando diversos cargos de alto escalão.
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A cerimônia ocorreu com um atraso mínimo para padrões brasilienses, sete minutos. Bolsonaro ainda não adotou uma logomarca própria, como fez, por exemplo, Temer ao assumir. O palco tinha um fundo verde e o brasão da República, sem as tradicionais frases alusivas ao evento. Os discursos foram todos curtos, com exceção do obscuro Rolando Fonseca, deputado licenciado e pastor da Assembleia de Deus que ocupava a secretaria-geral. Ele fez diversos elogios à nova gestão e ao sucessor, Bebianno. "Ouvi muitas críticas, que o senhor é advogado, lutador [de jiu-jítsu], mas que de política [não entende]", disse Fonseca.
Em seguida, afirmou que rebate os comentários dizendo que Bebianno ajudou Bolsonaro a vencer a eleição presidencial. "Imagina se não entendesse", afirmou, ressaltando que o presidente foi "ungido por Deus". Com informações da Folhapress.