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O Acnur pretende, por meio da campanha, colocar em evidência “as consequências devastadoras para toda a vida da condição de apátrida” e pressionar os países a retificarem as suas leis a fim de garantir que não seja negada nacionalidade a ninguém.
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“Muitas vezes são excluídos desde o berço até ao túmulo, sendo-lhes negada uma identidade legal quando nascem, acesso à educação, cuidados de saúde e oportunidades de trabalho durante toda a vida e mesmo a dignidade de um funeral oficial e de um certificado de óbito quando morrem”, destacou Guterres, em seu relatório, à agência da ONU. A condição de apátrida “faz com que as pessoas sintam que a sua própria existência é um crime”, disse o alto comissário.
As pessoas podem tornar-se apátridas por uma série razões como a discriminação com base na etnia, religião ou gênero, ou quando um Estado se desmorona. A guerra e o conflito também dificultam, muitas vezes, o registo dos nascimentos. O relatório não contabiliza o caso dos palestinos, uma vez que a Assembleia Geral da ONU reconheceu o Estado da Palestina, disse Guterres.
O problema de muitos dos 4,5 milhões de palestinos na Faixa de Gaza e dos milhões que vivem como refugiados em todo o mundo é que o Estado da Palestina tem ainda de aprovar as suas leis de nacionalidade, ressaltou Guterres. Ele insistiu que se trata de “uma situação muito específica” que requer uma “solução política”.
O maior número de apátridas encontra-se na Birmânia, país que nega cidadania a cerca de 1 milhão de muçulmanos de etnia Rohingya, de acordo com António Guterres. A Birmânia considera os Rohingya imigrantes ilegais oriundos do Bangladesh que, por sua vez, olha para os que atravessam a sua fronteira como ilegais provenientes daquele país. Em ambos os países, esse grupo, considerado pela ONU uma das minorias mais perseguidas do planeta, enfrenta restrições generalizadas, incluindo a liberdade à circulação, à educação e ao casamento. Quando uma nação se divide, as pessoas são frequentemente deixadas em um limbo. A título de exemplo, mais de 600 mil pessoas continuam como apátridas depois da desintegração da União Soviética há mais de 20 anos.
Em cenários de guerra, conflito ou tumulto, também é frequente ser difícil registrar nascimentos, especialmente entre os refugiados, o que faz com que os bebês fiquem sem pátria. António Guterres deu um exemplo: 70% dos bebês de refugiados sírios nascidos nos vizinhos Líbano ou Jordânia não recebem certificados legais de nascimento.
Em paralelo, há determinados países, como o Irã ou Catar, que nega às mulheres o direito de passar a sua nacionalidade para os filhos em condições de igualdade com os homens, “situação que pode criar cadeias de apátridas que se estendem por gerações”, advertiu o Acnur. Como parte da campanha lançada – sob o título “I Belong” (Eu pertenço), António Guterres e outras 20 personalidades, incluindo o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Zeid Ra'ad Al Hussein, os laureados com o Nobel da Paz Shirin Ebadi e Desmond Tutu, e a enviada especial do Acnur, a atriz Angelina Jolie, apresentam uma descrição do que significa viver sem nacionalidade.
“Pode significar uma vida sem educação, sem assistência médica, sem emprego legal, sem liberdade de circulação, sem esperança nem perspetivas de futuro”, diz a campanha, em que se sublinha que a condição de apátrida é “desumana”. “Acreditamos que é chegada a hora de acabar com esta injustiça”.
A campanha pretende reunir 10 milhões de assinaturas com a petição na tentativa de erradicar a condição de apátrida nos próximos dez anos. A boa notícia é que foram feitos muitos progressos no sentido de resolver o flagelo, com mais de 4 milhões de apátridas ganhando uma nacionalidade na última década devido a mudanças políticas e legislativas, indicou a agência da ONU.
Em 2008, por exemplo, um tribunal no Bangladesh permitiu que 300 mil apátridas, que falam urdu, se tornassem cidadãos daquele país.