© Marco Bello/Reuters
Enquanto os congressistas da Assembleia Nacional da Venezuela, declarada nula pelo Supremo Tribunal de Justiça na segunda (21), se reuniam para debater o esboço de um plano de transição no caso de queda do ditador Nicolás Maduro, as ruas de Caracas já mostravam sinais de dias inquietos.
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Depois da rebelião dos 27 oficiais da Guarda Nacional Bolivariana, também na segunda, que terminou com a prisão dos revoltosos, os "coletivos" (milícia civil de apoiadores de Maduro) passaram a vigiar os movimentos dos habitantes do bairro em que se deu o levante, Cotiza.
Além de gás lacrimogêneo, usaram também armas de fogo assassinaram uma mulher de 38 anos, Nicar Bermúdez, com um tiro na cabeça.
É neste cenário de tensão que vai ocorrer nesta quarta (23) uma marcha para pedir a renúncia de Maduro. O ato, que sairá de distintos pontos de Caracas, foi convocado pela Assembleia Nacional, presidida por Juan Guaidó, 35.
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"Eu não tenho dúvida de que será um êxito, e que as forças de segurança já não são as mesmas de 2017, houve muitas baixas, e não poderão nos conter. De nossa parte, nós queremos que seja uma marcha pacífica", disse Guaidó à Folha de S.Paulo no último sábado (19).
Ele se referiu a onda de atos em 2017 que durante três meses tomou as ruas da capital para protestar contra a criação da Constituinte (inteiramente dominada pelo chavismo) e que deixou 130 mortos.
"Temos que sair, todos, basta de aguentar tudo isso, as crianças morrendo sem remédio. Essa marcha tem de ser um êxito", diz a produtora Maria Carolina Ocque, sobre o ato desta quarta.
O governo, porém, promete responder a manifestação. Nesta segunda, o ministro da Comunicação, Jorge Rodríguez, acusou o partido de Guaidó, o Vontade Popular, de estar por trás da rebelião militar de Cotiza - que classificou como terrorista. Ele disse ainda que o deputado "vem recebendo ordens diretamente do vice-presidente dos EUA, Mike Pence".
O americano publicou um vídeo nesta terça no qual mistura palavras em inglês e em espanhol para declarar apoio a Guaidó e aos protestos.
O chanceler brasileiro Ernesto Araújo também manifestou, de forma indireta, apoio a oposição ao chamar Maduro de "ex-presidente" nesta terça (22) - a Assembleia Nacional não reconhece o atual mandato do ditador.
Líderes opositores no exterior também se manifestaram a favor dos protestos, como Antonio Ledezma (ex-prefeito de Caracas) e Julio Borges (ex-presidente da Assembleia Nacional).
Embora a manifestação desta quarta seja a de maior destaque, os protestos antiditadura já começaram na madrugada desta terça nos municípios de Libertador e Catia (próximos a Caracas).
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As duas regiões são tradicionalmente enclaves chavistas, diferentemente das áreas de classe média e alta no lado leste de Caracas, onde os atos anti-Maduro se concentraram nos últimos anos.
Nos dois locais as forças de segurança e as milícias que apoiam Maduro reprimiram os atos com violência, mas não há informação de feridos graves.
Alguns, porém, tem medo que as cenas de violência de dois anos atrás voltem a se repetir. "Nós também achávamos que as manifestações de 2017 iam colocar freios a esse governo ou até fazer Maduro renunciar. E o resultado, para mim, foi um sobrinho morto. Eu não sairei nem deixarei que meus filhos saiam", afirmou Eulimar Gutiérres, 39.
O sucesso da marcha, assim, depende de como será a resposta a uma possível repressão do governo - e também se a oposição conseguirá se manter unida.
"A oposição venezuelana se desmoralizou diante da população depois do referendo de julho de 2017", disse à reportagem María Corina Machado, que lidera uma das alas da oposição, a Vente Venezuela.
Na ocasião, afirma ela, a população votou massivamente na oposição para que esta lutasse por eleições diretas. "E o que esses líderes fizeram? Foram negociar com Maduro, e Maduro os enganou, prometeu coisas que não fez e roubou todas as eleições", afirmou María Corina.
A opinião é compartilhada pela vendedora Yuli Ortíz, 25, uma dos milhões de venezuelanos que fugiram do regime Maduro - ela mora em Buenos Aires. "Ou muda tudo lá, inclusive a oposição, ou a gente não volta, e ainda vamos mandar trazer minha mãe, que ficou lá sozinha", disse.
Juan Guaidó tem, assim, a chance de se consolidar como principal nome da oposição, sem a bagagem dos antigos líderes. Com informações da Folhapress.