Dirigente árabe afirma que produtos brasileiros podem sofrer boicote

Ação poderia ocorrer em função da possibilidade da transferência da embaixada do Brasil em Israel

© Reuters Karl Plume

Economia ameaça 30/01/19 POR Folhapress

 

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Secretário-geral da União de Câmaras Árabes, Khaled Hanafy afirma que a transferência da embaixada do Brasil em Israel de Tel Aviv para Jerusalém, se concretizada, pode gerar um boicote dos consumidores árabes a produtos brasileiros.

"Esse tipo de anúncio [a transferência da embaixada em Israel] será entendido pelos consumidores na região árabe de forma negativa. E esses consumidores podem se comportar de uma forma agressiva contra os produtos brasileiros, o que terá um impacto severo nos produtores do Brasil, principalmente nas pequenas empresas", diz Hanafy, dirigente da entidade que representa as câmaras de comércio de 21 países árabes.

Hanafy, que foi ministro de Abastecimento e Comércio do Egito, se encontrou em Brasília nesta terça-feira (29) com o presidente interino Hamilton Mourão (PRTB) e com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina (DEM).

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O Brasil é um grande exportador de proteína animal a países do mundo árabe.

Promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (PSL), a mudança da embaixada em Israel para Jerusalém significaria um endosso do Brasil ao pleito de Israel de ter a cidade reconhecida como sua capital. Os árabes, por outro lado, defendem que a porção oriental de Jerusalém seja a capital de um futuro estado da Palestina.

Mourão tem atuado como um contraponto a Bolsonaro nas relações do Brasil com as nações árabes.

Nesta segunda-feira, por exemplo, o presidente interino disse que, pelo momento, o Brasil não avalia transferir a sua missão diplomática de Tel Aviv para Jerusalém.

A seguir, a entrevista concedida por Hanafy à reportagem pouco depois de se reunir com a ministra da Agricultura.

Pergunta - Qual a mensagem que o senhor transmitiu ao presidente interino Mourão e à ministra Tereza Cristina?

Khaled Hanafy - Eu não estou transmitindo uma mensagem política. A União de Câmaras Árabes não é uma entidade política. O que fizemos, quando chegamos à questão da transferência da embaixada, foi transmitir o ponto de vista do consumidor da região árabe.

Nós apenas traduzimos o nosso entendimento sobre o comportamento dos consumidores na região árabe. Esse tipo de anúncio [a transferência da embaixada em Israel] será entendido pelos consumidores na região árabe de forma negativa. E esses consumidores podem se comportar de uma forma agressiva contra os produtos brasileiros, o que terá um impacto severo nos produtores do Brasil, principalmente nas pequenas empresas. E, claro, terá um grande efeito sobre os empregos aqui.

Se esse movimento dos consumidores ocorrer na região será muito difícil pará-lo ou revertê-lo. Hoje as redes sociais são muito ativas e isso provoca todo mundo a reagir.

P - O senhor está dizendo que os consumidores árabes podem reagir ao alinhamento do Brasil a Israel no tema do conflito com a Palestina?

KH - É um tema muito sensível e ninguém pode controlar a reação. Por que é uma reação dos consumidores.

Nós tivemos alguns exemplos no passado, em relação a produtos muito famosos, que os consumidores árabes decidiram boicotar por motivos parecidos. Ninguém conseguiu resgatá-los e eles saíram do mercado.

Até agora, os produtos brasileiros são muito bem recebidos na região árabe. Os árabes veem os brasileiros e os produtos brasileiros de uma forma muito positiva. Nós tememos que essa percepção seja danificada.

P - Em novembro o Egito se negou a receber uma delegação brasileira chefiada pelo então chanceler Aloysio Nunes. Mais recentemente, a Arábia Saudita removeu alguns exportadores brasileiros da lista de empresas autorizadas a vender carne de frango para o país. O senhor considera que esses dois eventos foram retaliações à promessa de Bolsonaro de transferir a embaixada em Israel?

KH - Eu não posso comentar porque não tenho o contexto desses dois incidentes. Mas o que eu posso dizer é que, até o momento, o mercado árabe e os consumidores árabes não estão muito cientes do anúncio da mudança da embaixada do Brasil em Israel. Quando esse anúncio ficar mais conhecido, ninguém poderá controlar as ações.

P - Qual o impacto financeiro para as empresas brasileiras que isso pode representar?

KH - Uma das empresas me mencionou hoje que mais de 30 mil empregados podem ser afetados aqui no Brasil. Isso é apenas uma empresa. Se fizer as contas em relação ao volume atual de negócio, você pode imaginar que há centenas de milhares de empregos que serão afetados. Mas se você também considerar o potencial das relações do Brasil com os países árabes, isso será com certeza muito maior. Porque não estamos falando apenas sobre o estado atual dos negócios. Estamos falando sobre ter no futuro mais e melhores negócios em dimensões diferentes. Então isso pode ser afetado de uma forma negativa e dramática.

P - Qual o potencial da relação comercial do Brasil com os países árabes?

KH - Aumentar as exportações é só uma coisa, que é manter o padrão atual dos negócios. O que estamos propondo e discutindo aqui é ter um padrão diferente de fazer negócios. Em vez de exportações, importações e comércio, estamos falando sobre aliados estratégicos. Neste caso estamos falando sobre criar hubs logísticos na região árabe para armazenar e distribuir os produtos brasileiros para os países árabes e outras nações. Também estamos falando em agregar valor aos produtos brutos exportados do Brasil, de forma que o retorno seja maior para os produtores e para os consumidores na região árabe.

Também estamos falando sobre um sistema marítimo de transporte que reduzirá o custo do transporte e aumentará a competitividade dos produtos brasileiros.

P - Essa reação dos consumidores que o senhor mencionou é algo que pode ocorrer em todo o mundo árabe ou pode ficar restrito a apenas alguns países?

KH - Eu acho que isso afetará quase todos os países árabes. E será negativo para os produtos brasileiros. De novo, eu não estou falando sobre um boicote oficial ou sobre ações políticas. Eu estou falando sobre mercado, sobre consumidores e sobre o comportamento dos pequenos empresários nos países árabes.

Seria algo muito forte, porque nós temos alguns exemplos que aconteceram, na última década, quando os consumidores reagiram de forma negativa em relação a determinados produtos.

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