PM após bomba em bloco: 'Não tenho cerimônia em quebrar cara de mulher'

Vítimas relataram que o bloco do qual participavam já tinha se dispersado e poucas pessoas permaneciam nas ruas da região quando foram surpreendidas pela ação

© Imagem ilustrativa (Nacho Doce/Reuters)

Justiça SP 06/03/19 POR Estadao Conteudo

Policiais militares usaram bombas e balas de borracha contra foliões na Barra Funda, zona oeste de São Paulo, na noite desta terça-feira, 5, deixando ao menos três pessoas feridas. As vítimas relataram que o bloco do qual participavam já tinha se dispersado e poucas pessoas permaneciam nas ruas da região quando foram surpreendidas pela ação, que classificaram como truculenta. Ao pedir providências no batalhão depois de ser ferida, uma mulher foi ameaçada por um policial militar, que disse que não tinha "cerimônia para quebrar cara de mulher". Na delegacia, policiais civis se recusaram a registrar o caso.

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De acordo com a artista Paula Klein, de 42 anos, diretora do Bloco Agora Vai, o grupo seguiu todas as orientações previstas para dispersão e não havia motivo para atuação violenta da Polícia Militar. Junto à Prefeitura, o bloco registrou que esperava até cinco mil pessoas para, das 15h até as 20h, seguir um curto trajeto por ruas da Barra Funda. Paula diz que por causa da chuva, o bloco foi encerrado mais cedo, às 19h, e às 22h todas as vias da região estavam liberadas para tráfego de carros.

"A Polícia Militar sempre foi grande parceira do nosso bloco. O relacionamento é ótimo há 15 anos e esse ano não foi diferente. Por isso que a ação nos surpreendeu. Mandaram um pessoal despreparado para lidar com o público de carnaval. Trataram foliões como marginais. O carnaval foi manchado pela polícia", disse.

Segundo ela, a polícia chegou ao local às 20h para conversar. Nesse horário, o som do bloco já estava desligado, segundo relatou. "Já estava acontecendo a dispersão natural. Não precisava atuar de modo truculento, estávamos dentro do horário. Fomos conversando com os nossos foliões e havíamos liberado a via (rua João de Barros)", disse. Depois, segundo ela, por volta das 22h30, a tropa voltou, dessa vez com bombas e tiros de borracha.

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Um dos atingidos pelos disparos foi a atriz Thaís Campos Soares, de 36 anos; o seu namorado, o músico Lincoln Antonio, de 48 anos, também ficou ferido. Ela disse que estava na rua João de Barros, "com muito pouca gente na rua", quando os policiais apareceram enfileirados, "já tacando bomba e sem conversar com ninguém". "Começaram a dar tiro, spray de pimenta. Bem truculento", disse Thaís, que foi atingida na costela.

A atriz buscou providências primeiro na sede da 3ª Companhia do 4º Batalhão da PM, em Perdizes, responsável pelo patrulhamento da área. Lá, se envolveu em uma discussão em que acabou ameaçada por um policial militar que não carregava nenhuma identificação em seu fardamento. O agente primeiro pediu que ela mantivesse distância. À reportagem, Thaís disse que permaneceu parada. Depois, ao ser questionado por Lincoln sobre o motivo do disparo que o atingiu, o policial disse que tem de garantir "direito previsto pelo artigo 5º da Constituição, das pessoas que pagam IPVA de passarem com seus carros ali, o direito das pessoas de ter o seu devido descanso". O homem responde que estava na calçada durante todo o tempo e que o tráfego na rua estava liberado já que a rua estava vazia.

Depois, o policial fala para Thaís: "Aponta o dedinho não, se aproxima não. Você vai tomar um atropelo aqui, estou falando para você, toma distância. Não tenho nenhuma cerimônia em quebrar cara de mulher, não. Você presta atenção." O grupo então decide deixar o 4º Batalhão e busca registrar a ocorrência no 91º Distrito Policial (Ceasa). Lá, recebe a resposta de que o caso não pode ser registrado e que as vítimas devem procurar a Corregedoria. Os feridos disseram que pretendem denunciar o caso.

Quem também ficou ferido após ser atingido com um tiro de bala de borracha nas costas foi o professor Alexandre Rosa, de 36 anos. Segundo ele, o policial que o atingiu agiu depois de ter visto que ele estava filmando o que estava acontecendo. "Peguei o celular e comecei a filmar durante a correria. A PM agiu com muita violência sem nenhuma necessidade, estava tudo muito tranquilo e tinha criança e família. Ouvi quando o policial falou: 'Atira naquele que está filmando'. Virei e saí correndo e senti o tiro nas costas", relatou. A diretora Paula Klein disse que pretende reunir queixas de truculência policial não só no seu bloco para fazer uma representação ao Ministério Público.

Secretaria diz que PM agiu para desobstruir via

Em nota, a Secretaria da Segurança Pública disse que a Polícia Militar foi acionada "por conta de interdição de via pelo Bloco Agora Vai, na rua Brigadeiro Galvão, após o horário permitido". "As equipes policiais fizeram contato com os organizadores do evento, solicitando a desobstrução da rua, mas sem acordo. Para restauração da ordem pública, foi necessária a intervenção direta para desobstrução da via pública ocupada sem autorização, com técnicas de controle de distúrbios civis no local."

Sobre o comportamento do policial que ameaçou a atriz, a SSP disse que a "instituição não compactua com eventuais desvios de conduta, colocando-se à disposição da vítima para formalização de denúncia por meio da Corregedoria da Polícia Militar".

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