© Marcos Corrêa/PR
PAULO SALDAÑA - BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Enquanto uma crise coloca em dúvida a permanência do ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, a pasta registra atrasos que preocupam os atores do sistema educacional. Um edital para produção e compra livros do ensino médio não vai ser publicado neste ano e os detalhes para avaliação federal dos alunos de 2019 continuam indefinidos.
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Também seguem sem resposta a continuidade de políticas em torno da Base Nacional Comum Curricular (que define o que os alunos devem aprender) e de apoio a escolas de tempo integral. O MEC, por outro lado, faz os últimos ajustes para publicar uma portaria que vai reorganizar o sistema alfabetização, meta dos 100 primeiros dias do governo Jair Bolsonaro (PSL).
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As redes de ensino ainda não receberam orientações sobre como será o Saeb, avaliação que compõe o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Não está garantida a aplicação de uma prova de ciências (para alunos do 9º ano), como planejado no ano passado.
Além de criar avaliação de ciências (hoje os alunos só respondem a questões de português e matemática), a gestão Michel Temer (MDB) decidiu adiantar a avaliação da alfabetização, passada do 3º para o 2º ano do ensino fundamental. Mas, até agora, o tema não foi decidido internamente.
"A gente não recebeu nenhuma informação oficial por parte do MEC com relação às avaliações. É uma questão que deixa inquietação nos gestores, que não sabem sobre qual matriz a avaliação ocorrerá", diz Alessio Costa Lima, presidente da Undime (que agrega secretários municipais de Educação de todo país).
O Saeb costuma ocorrer em novembro. O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), que nega atrasos nesse processo, deve publicar nova portaria sobre o Saeb, ainda sem data. "A discussão em torno da aplicação do Saeb neste ano segue internamente e eventuais alterações serão oportunamente divulgadas tão logo haja definição concreta", informou o Inep em nota.
O órgão divulgou que trabalha em um processo de redução de custos nas avaliações, cuja economia deve alcançar R$ 42 milhões. A principal iniciativa é a redução de folhas usadas na prova do Enem.
Já o edital do PNLD (Programa Nacional de Livros Didáticos) 2021, do ensino médio, era previsto para ser publicado em fevereiro, mas não sairá neste ano. A partir do documento, as editoras produziriam as obras em 2019 e os livros chegariam às escolas em 2021. Integrantes do mercado editorial informaram à reportagem, de modo reservado, que já não há mais tempo para esse cronograma.
É grande a expectativa com as regras do PNLD 2021 porque o edital faria a adequação dos livros à reforma do ensino médio (que flexibilizou a grade curricular) e à Base Curricular. Sem ele, a implementação fica suspensa. Secretarias estaduais de Educação aguardam, ainda, a definição de continuidade de apoio financeiro para a construção dos currículos do ensino médio à luz da Base.
Em nota, o MEC diz que o edital está em discussão. "[A base] apresenta mudanças bastante expressivas em relação ao antigo modelo e que demandaram, após sua publicação, um estudo pormenorizado do impacto da Base para o PNLD", diz o MEC.
O atrasos se devem, como em outras questões internas, a embates ideológicos sobre os rumos das políticas. Integrantes do grupo mais ideológico dentro do MEC são contrários à Base Nacional. As disputas impedem uma posição clara do ministério com relação à continuidade de várias políticas.
Vélez Rodriguez está no centro de uma crise depois que um processo de mudanças de cargos no MEC atingiu alunos do escritor Olavo de Carvalho, considerado ideólogo do governo Bolsonaro. Após pressão de olavistas, o ministro precisou se desfazer de dois auxiliares próximos, o assessor Ricardo Roquetti e o secretário-executivo Luiz Antonio Tozi.
O ministro chegou a anunciar dois nomes para a secretaria-executiva, mas ambos foram barrados pelo governo após críticas do grupo olavista. Iolene Lima foi a última indicada para o posto, na quinta-feira (14), mas já é certo que não será nomeada. Ainda não há definição de um novo nome.
Em sua última reunião, o Consed (órgão que reúne os secretários estaduais de Educação) decidiu entregar ao ministro um documento em defesa de programas prioritários. Entre os pontos, estão a continuidade do programa de fomento a escolas de tempo integral e maior transparência com relação a avaliações de larga escala.
"Estamos muito preocupados com a demora nas definições. Não temos clareza [sobre] o que o MEC vai propor", diz a presidente do Consed, Cecilia Motta.
Embora não haja detalhes, o MEC já tem definido a minuta do decreto que vai organizar uma Política Nacional de Alfabetização. O documento não irá impulsionar apenas um método específico de alfabetização e a previsão é de que as ações dependam de adesão voluntária das redes de ensino.
A Secretaria de Alfabetização realizou reuniões com especialistas e recebeu representantes das secretarias. "[O objetivo é] estabelecer uma política de alfabetização eficaz, baseada em evidências científicas, ou seja, na ciência cognitiva da leitura, que foi a base para experiências bem-sucedidas em diversos países", diz nota do MEC.
Aléssio Lima, da Undime, participou de discussões e elogia o trabalho, apesar de não ter conhecido ainda a estrutura final do decreto. "A política precisa se ancorar em vários aspectos, como estratégia de formação, material didático, um modelo de gestão do programa e criar condições de avaliações diagnósticas", diz.
O MEC não respondeu aos questionamentos da reportagem relacionados ao ensino médio, base e escolas de tempo integral.