Samu anuncia paralisação em protesto contra mudanças no serviço

Expectativa é de corte de gastos, mas de fragilização do serviço

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Brasil são paulo 30/03/19 POR MARIANA ZYLBERKAN E ARTUR RODRIGUES para Folhapress

MARIANA ZYLBERKAN E ARTUR RODRIGUES, SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - A gestão Bruno Covas (PSDB) anunciou uma reorganização no Samu que cortará gastos e tende a fragilizar um serviço de urgências já estrangulado na cidade de São Paulo.

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A mudança visível é o fechamento de 31 contêineres espalhados pela cidade especificamente para abrigar os socorristas, previsto para a primeira semana de abril. Em reação, funcionários anunciaram paralisação parcial do serviço para a próxima segunda (1º).

Sem os contêineres, as equipes ocuparão salas em postos de saúde, hospitais e centros de atendimento psicossocial.

A prefeitura argumenta que isso constitui aumento no número de bases, mas funcionários afirmam que o desmonte de uma estrutura que vinha se aperfeiçoando havia anos vai se refletir no aumento do tempo de resposta a emergências.

Na capital, o intervalo entre a chamada de emergência e a chegada da ambulância é mais do que o dobro do preconizado em casos graves.

Nessas ocasiões, em que há risco de o paciente morrer, o tempo médio de atendimento é de 30 minutos -18 a mais do que recomendam organizações médicas internacionais.

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Além da demora, metade das chamadas que viram ocorrência (descartados trotes e ligações duplicadas) nunca é atendida pelas ambulâncias.

A mãe da advogada Rachel Lucena Malheiros, 33, teve uma forte crise de asma quando voltava do trabalho em outubro de 2018 em uma rua do bairro do Paraíso.

Clélia Cristina Cardoso Lucena, 68, ficou mais de uma hora na calçada a espera do Samu, que não veio. "Uma médica a levou em seu carro ao hospital Santa Catarina, a dois quarteirões dali", diz Rachel.

Ao dar entrada no hospital, Clélia teve parada respiratória e entrou em coma. Morreu três meses depois. "Os médicos disseram que ela poderia ter sobrevivido se o atendimento não tivesse demorado tanto", diz a advogada, que questionou a prefeitura formalmente sobre o Samu.

A Secretaria de Saúde afirmou que o chamado foi encerrado porque houve comunicação de que a vítima fora removida pelos bombeiros.

As mudanças anunciadas devem tornar o atendimento ainda mais lento, dizem funcionários. As bases vão deixar de operar em pontos estratégicos, perto de locais de maior incidência de chamados, e a estrutura para as equipes terá caráter improvisado.

Há casos em que a sala cedida ao Samu não oferece condições para higienização de ambulâncias, materiais e uniformes após as ocorrências, em que derramamento de sangue é comum. As bases atuais contam com espaços propícios.

Outro problema apontado é que, dentro de hospitais e unidades de saúde, as ambulâncias enfrentarão obstáculos que vão de portões a congestionamentos nos quais se perdem minutos preciosos em uma emergência. Há endereços que só funcionam de dia e impossibilitam a permanência no plantão noturno.

Os funcionários temem que, uma vez em hospitais, fique mais comum a prática de usar as ambulâncias do Samu para fazer transferências. É o que servidores chamam de "Samuber", com a UTI móvel usada em transporte sem urgência.

A Secretaria de Saúde nega essa intenção. Afirma que a descentralização trará melhorias para a população paulistana, com um aumento de 20 bases. "A crítica interessa somente a quem privilegia interesses particulares em detrimento dos interesses da coletividade", diz nota da pasta.

A secretaria se refere aos cerca de 150 cargos administrativos do Samu que serão cortados com o fim dos contêineres. São, na maioria, enfermeiros e auxiliares de enfermagem que vão passar a atuar nos atendimentos na rua, segundo a administração.

Dois sindicatos ligados às categorias ativas no Samu, dos servidores municipais e dos médicos, criticam a economia em um serviço essencial alvo de cortes passados.

No orçamento do município, em valores atualizados, o gasto na operação do serviço caiu de R$ 75 milhões em 2016 para R$ 65 milhões em 2018. Em 2013, eram R$ 146 milhões.

As mudanças também são vistas pelos sindicatos como um passo da gestão Covas rumo à terceirização do serviço.

A ideia seria entregar o custeio da operação de atendimento de emergência pré-hospitalar a organizações sociais contratadas para gerirem as unidades de saúde que abrigarão equipes do Samu.

O coordenador de regulação do município, Marcelo Takano, nega e afirma que a reestruturação ocorre de forma escalonada desde 2017. "A estratégia de gerenciamento vai se tornar mais eficaz. O Samu foi feito de uma maneira não tão racional como deveria."

Desde o fim do ano passado, contratos importantes para manter a estrutura do Samu, como o que rege a instalação dos contêineres, não puderam ser renovados por terem extrapolado o prazo.

Sem nova licitação, os pagamentos mensais têm sido feitos via indenização. A prática afetou também a manutenção do sistema de chamadas.

Em relação à operação das ambulâncias, o sindicato dos servidores municipais afirma que mais veículos vão passar a rodar em turnos alternados de 12 horas, em vez de 24 horas, por causa das novas bases.

A prática visa economizar o repasse do governo federal referente a cada ambulância. A secretaria de Saúde diz que a informação "é mentirosa".

Na distribuição das equipes registrada no Diário Oficial, há escalas atreladas a determinadas ambulâncias que preenchem um só turno do dia.

"A descentralização possibilitará o contrário", diz a secretaria. "Graças à integração com os serviços de saúde, mais equipes poderão atuar simultaneamente, com mais ambulâncias na rua por 24h."

Denúncias em relação à descentralização do Samu foram apresentadas à Promotoria de Saúde Pública, que arquivou as investigações por entender se tratar de alterações das relações de trabalho, sem provas de prejuízo ao serviço.

Para a promotora Dora Martin Strilicherk, o problema do Samu é a falta de repasse do governo estadual, responsável por 25% da verba, o que é questionado em ação civil pública. A gestão do governador João Doria (PSDB) não nega a falta de repasses, mas alega manter o próprio sistema de atendimento a emergências, a R$ 200 milhões ao ano.

O vereador Celso Gianazzi (PSOL) entrou com projeto de lei contra a mudança. Entre outras coisas, cita a retirada da base de Marsilac, no extremo sul da cidade. "Com a base em Parelheiros, levará de 40 a 90 minutos para chegarem. Muita gente morrerá."

Com informações da Folhapress.

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