Cidadão comum puxa aumento de registros de novas armas na PF
A categoria respondeu por 84,4% dos registros de novas armas em 2021 contra 72,6% em 2018
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Justiça Posse
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O aumento nas armas liberadas pela Polícia Federal foi liderado pelo cidadão comum. A categoria respondeu por 84,4% dos registros de novas armas em 2021 contra 72,6% em 2018.
É pela Polícia Federal que o cidadão comum pode ter a posse de arma para defesa pessoal. Também são liberadas pelo órgão as armas da Polícia Civil, guarda municipal, caçador de subsistência, servidor público, segurança privada e lojas de armas.
Os dados apontam que o cidadão comum foi responsável pelo registro de 170,9 mil armas em 2021. O quantitativo é 361% maior que em 2018, quando chegou a atingir 37 mil novos registros.
Os dados sobre novas armas registradas foram obtidos pela Folha de S.Paulo a partir de um pedido de LAI (Lei de Acesso à Informação) enviado à PF.
O crescimento ocorre em paralelo a atos e discursos de Bolsonaro desde a campanha de 2018. O presidente, sua família e vários de seus apoiadores são ferrenhos defensores do armamento da população.
Desde quando foi eleito, o presidente editou 19 decretos, 17 portarias, duas resoluções, três instruções normativas e dois projetos de lei flexibilizando as regras para acesso a armas e munições no Brasil.
As medidas adotadas por seu governo ampliam o acesso da população a armas e munições e, por outro lado, enfraquecem os mecanismos de controle e fiscalização de artigos bélicos.
Na sua gestão, Bolsonaro estimulou o cidadão comum a se armar. Inclusive, deu acesso à população a calibres mais poderosos, como pistolas 9mm e .40, antes restritas às forças policiais.
"O crescimento era esperado tendo em vista as normas editadas no governo Bolsonaro que flexibilizam o acesso a armas e munições e também pelo incentivo público do presidente e de outras figuras públicas à compra de armas", disse Natália Pollachi, gerente de projetos do Instituto Sou da Paz.
Ivan Marques, advogado e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, acrescentou que o crescimento também é marcado pela deterioração da confiança das pessoas nas instituições de segurança pública e a promoção da ideia de que ter armas resolve o problema de segurança.
Para o especialista, mudanças nas regras também facilitaram o acesso da população a armas adquiridas pela Polícia Federal.
A declaração de efetiva necessidade, por exemplo, continua a ser necessária por constar no Estatuto do Desarmamento -mas a veracidade passou a ser presumida. Com isso, o simples documento é suficiente para comprovação.
"Em 2019, o governo Bolsonaro extinguiu a possibilidade do controle de concessão de licenças pela PF ao decretar o fim da avaliação de necessidade de ter uma arma. Esse era o único controle político do processo de obtenção de armas. O processo virou algo meramente burocrático", disse.
Pollachi destaca ainda que o cidadão comum no governo Bolsonaro pode apresentar parte dos documentos online, sem precisar ir à sede da PF, o que pode influenciar na agilidadade da análise do pedido.
Na avaliação da pesquisadora, a flexibilização ocorreu muito mais por parte do Exército e, por conta disso, muitas pessoas têm optado por virar CAC (caçador, atirador e colecionador).
No Brasil, as armas são liberadas pela PF e pelo Exército. Na Força, ficam registradas armas de CACs, das Forças Armadas e o armamento particular de militares (incluindo policiais e bombeiros).
O porte de arma, por sua vez, é concedido pela PF, sendo restrito a determinados grupos, como profissionais de segurança pública, membros das Forças Armadas, policiais e agentes de segurança privada.
Aos CACs foi permitido carregar a arma no trajeto entre sua casa e o local de prática (clube de tiro ou local de caça), sem restrição de rota ou de horário. Segundo especialistas, significa autorização para o porte, dada a subjetividade da regra.
Além disso, tem ocorrido a aprovação de projetos apresentados por parlamentares em assembleias estaduais e até em Câmaras Municipais que tentam garantir ao CAC o direito de andar armado, justificando que essa seria uma atividade de alto risco, embora esse seja assunto de competência exclusivamente federal.
Como a Folha de S.Paulo mostrou, o registro de armas novas pela Polícia Federal cresceu mais nos estados nos quais o presidente Jair Bolsonaro (PL) venceu no segundo turno das eleições de 2018.
Entre 2018 e 2021, o número de novas armas registradas passou de 39 mil para 163,7 mil nas 16 unidades da federação que preferiram Bolsonaro, uma alta de 320%.
Já nos 11 estados nos quais Fernando Haddad (PT) venceu no segundo turno, o aumento foi de 223%, saindo de 12 mil para 38,8 mil.