Falta de investimento trava acesso a drogas contra câncer de mama
O Instituto Nacional do Câncer estima que mais de 66 mil novos casos de tumores na mama serão identificados no país neste ano
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SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) -Mesmo recomendados pela Conitec (Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), novas drogas que ajudam no controle do câncer de mama metastático e podem dar mais qualidade de vida às pacientes ainda não chegam a elas por falta de investimento público.
É o que dizem as especialistas da mesa de abertura do 7º Seminário Sobre Câncer, realizado pelo jornal Folha de S.Paulo na segunda (15), com patrocínio da Bristol Myers Squibb, do Hospital Sírio-Libanês e da Pfizer. O evento foi conduzido por Vera Guimarães, ex-ombudsman da Folha de S.Paulo.
O Inca (Instituto Nacional do Câncer) estima que mais de 66 mil novos casos de tumores na mama serão identificados no país neste ano.
No estudo Amazona 3, realizado pelo Gbecam (Grupo Brasileiro de Estudos em Câncer de Mama) com 2.950 pacientes de câncer de mama, cerca de 6% delas tiveram diagnóstico já com metástase. A pesquisa foi feita de 2016 a 2018 e publicada em 2020.
"Receber o diagnóstico de um câncer já é difícil -em fase metastática, é muito mais. Isso acontece também porque não estamos garantindo que a mulher seja examinada, faça uma mamografia de qualidade em tempo hábil e comece o tratamento nos prazos especificados", afirma a psico-oncologista Luciana Holtz, presidente e diretora-executiva do Instituto Oncoguia.
Para Holtz, o conhecimento sobre a doença é maior hoje e isso permite a escolha da melhor terapia para cada caso, sobretudo em estágios avançados. O acesso esbarra, no entanto, na falta de priorização do câncer na gestão do SUS e de investimento suficiente para adquirir novas drogas e tecnologias de alto custo.
O Hospital A.C.Camargo, referência no tratamento do câncer em São Paulo, chegou a anunciar na semana passada que deixaria de receber pacientes do SUS a partir de dezembro, devido à defasagem dos valores pagos por consultas, procedimentos e cirurgias. Dias depois, foi anunciado um acordo com o Governo de São Paulo para a manutenção desses atendimentos.
O descompasso entre o custo e o repasse do Ministério da Saúde pode fazer com que esse cenário, apesar da reviravolta, seja cada vez mais recorrente, diz a especialista.
Graças aos novos medicamentos contra o câncer de mama metastático, a atendente de telemarketing Patrícia Nascimento, 39, controla o avanço da doença descoberta em 2017 já em grau 3 (a variação, de acordo com a gravidade, vai de 1 a 4).
No primeiro tratamento contra um tumor positivo para receptores de estrogênio, progesterona e HER2, ela fez quimioterapia, radioterapia e hormonioterapia, além de mastectomia para evitar a metástase para outros órgãos. Mesmo assim, uma recidiva no pulmão foi identificada em abril deste ano.
"É muito difícil descobrir que se tem câncer, é um baque. Quando é metastático, vem um pensamento de finitude, mas a medicina avançou muito. Tem equipe multidisciplinar, de cuidados paliativos, e eles dão uma gana de vida para a gente, mostram que não é um decreto de morte."
Hoje, Patrícia usa medicamentos para bloquear os receptores de hormônios nas células do tumor e o abemaciclibe, um inibidor de CDK4/6, ou seja, uma droga que ajuda a evitar a resistência à hormonioterapia e possibilita que esse tratamento funcione e seja usado por um período mais prolongado, explica Daniela Rosa, oncologista do Hospital Moinhos de Vento e presidente do Gbecam.
A categoria de inibidores de ciclina inclui também o ribociclibe e o palbociclibe, e é recomendada pela Conitec desde novembro de 2021, mas segue indisponível para as pacientes do SUS mesmo após o vencimento do prazo de 180 dias para incorporação, diz Holtz.
"O medicamento não chegar à paciente mesmo com aprovação no sistema público é o maior absurdo que se vive hoje no Brasil. Não adianta saber que o tratamento reconhecidamente funciona e faz a pessoa viver mais, mas ela não receber algo que, teoricamente, está aprovado e disponível", diz Rosa.
Para a especialista, um dos caminhos para mudar esse cenário é ampliar o acesso às informações sobre a doença para a população geral, para que mais pessoas passem a pressionar o poder público pela compra dos remédios.