Prisão de Lula foi projeto dos Estados Unidos, diz Oliver Stone no Festival de Cannes
"Pegaram o Lula com a Lava Jato, foi selvagem, uma história suja", afirmou o diretor.
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CANNES, FRANÇA (FOLHAPRESS) - A prisão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Operação Lava Jato teve por trás o interesse do governo dos Estados Unidos de desestabilizar líderes latino-americanos de esquerda, afirmou nesta quarta o diretor de cinema americano Oliver Stone, de 74 anos.
"Pegaram o Lula com a Lava Jato, foi selvagem, uma história suja", afirmou Stone, que está em Cannes para a estreia de seu novo documentário "JFK Revisited: Through the Looking Glass", sobre a morte do presidente americano John Kennedy.
Segundo o diretor, que prepara um novo filme no qual o ex-presidente petista será o principal personagem e que deve ficar pronto no primeiro semestre de 2022, a condenação do Lula é consequência do projeto americano de patrulhar o mundo. "É duro, é uma guerra em curso o que está acontecendo", afirmou ele.
O cineasta também afirmou que a grande mídia americana trata de forma parcial países governados pela esquerda, entre eles Cuba, que vive protestos nas ruas e cujo regime foi elogiado por Lula nesta terça.
"A mentalidade no Ocidente agora é completamente anti-Rússia, anti-China, anti-Irã, anti-Cuba, anti-Venezuela. Não se pode falar nada de bom sobre eles. O que mais está na lista? No Brasil, Lula foi para a prisão, eles se livraram do Lula. Eles policiam o mundo", afirmou Stone.
O diretor diz também que há uma enorme censura autoimposta pela indústria cultural. "Meus filmes não foram financiados pelos Estados Unidos, mas pela Inglaterra. O grande teste é se esse novo documentário não for lançado nos Estados Unidos."
Segundo ele, há resistência em aceitar as evidências de "JFK Revisited". "O que meu filme mostra foi que houve um golpe de Estado. O presidente dos Estados Unidos foi removido ilegalmente do seu cargo e seu sucessor reverteu muitas decisões em política externa, incluindo a retirada do Vietnã."
Stone afirma que a grande mídia americana também se recusa a tratar das informações que ele mostra no documentário. "Sabe o que vão dizer? Que não há novidade, não há informação nova no filme. Mas há um monte de novas evidências. Eles já tentaram me descredibilizar muitas vezes", disse.
"JFK Revisited" é a segunda obra de Stone sobre os eventos de 22 de novembro de 1963 em Dallas. A primeira, "JFK: A Pergunta que Não Quer Calar", de 1991, foi indicado a oito troféus no Oscar, incluindo melhor filme e melhor direção, e ganhou os de cinematografia e edição.
Já nessa primeira dramatização, o promotor público Jim Garrison, vivido por Kevin Costner, duvida das versões apresentadas para o crime e se depara com a resistência do governo americano. Apesar do sucesso, o filme foi classificado por muitos como teoria conspiratória.
O novo roteiro se baseia em livro sobre o assassinato publicado em 2018 pelo escritor James DiEugenio, após decisão do então presidente Donald Trump de levantar o sigilo de mais de 3 milhões de documentos e 2.800 relatórios secretos do caso.
O material rendeu quatro horas de documentário, reduzidas à metade para a apresentação no festival e para a versão já vendida para o mercado europeu. Mas, apesar dos novos documentos, parte da crítica continuou fazendo ressalvas à versão de Stone, considerado um diretor parcial depois de entrevistas com os líderes de Cuba, Fidel Castro, da Venezuela, Hugo Chávez, e da Rússia, Vladimir Putin.
Stone afirma que não tem a verdade sobre o que aconteceu, mas pode dizer, por exemplo, que três investigações governamentais feitas em décadas diferentes derrubam a versão de que Lee Harvey Oswald tenha matado Kennedy.
O espectador deve tirar suas conclusões sobre quem é o culpado pela morte do presidente, mas os fatos apontam para a CIA, agência de inteligência dos EUA, afirma o diretor americano.
Segundo ele, "Kennedy foi o último presidente que realmente tentou mudar as coisas, e isso se voltou contra ele". Entre os avanços que atraíram a oposição ele lembra uma abertura nas relações com Cuba, a negociação com a União Soviética do tratado de não proliferação nuclear e a intenção de retirar os Estados Unidos da Guerra do Vietnã.
Historiadores e outros peritos que tiveram acesso aos relatórios na década de 1990 são entrevistados sobre contradições. "Fotos sumiram, houve muitos erros na autópsia, usaram um cérebro que não era o do presidente", diz Stone.
O cineasta afirma que espera agora que o presidente Joe Biden cumpra a lei e libere cerca de 200 documentos considerados os mais cruciais sobre o assassinato de Kennedy. Eles deveriam ter sido abertos em abril deste ano.