Bailarina brasileira brilha em NY e sonha ser vista pela mãe em cena
Ingrid Silva estrela curta-metragem que vem circulando pelo Brasil
© Reprodução/Facebook
Cultura Superação
Uma das mais promissoras bailarinas de Nova York é negra, brasileira, pouco favorecida financeiramente. Estas palavras não deveriam ser as primeiras usadas para apresentar um talento nato das sapatilhas, mas o balé costuma ter uma realidade racista quase tão limitante quanto a falta de oportunidade agregada à pobreza no Brasil.
A mãe de Ingrid, a empregada doméstica Maureny, nunca presenciou a aclamação da filha em nenhum dos espetáculos destes oito anos de Dance Theatre of Harlem, nos Estados Unidos. “Minha mãe, infelizmente, não conseguiu o visto, não sei ao certo o motivo”, conta a profissional de 26 anos que saiu da comunidade do Benfica, no Rio de Janeiro, para brilhar no cenário da dança mundial - tendo como base o projeto social Dançando para não Dançar, no Morro da Mangueira.
O vídeo que apresenta Ingrid Silva ao mundo, e vem circulando na internet na última semana, foi lançado há cerca de três meses. O sentimento evocado pelos dois minutos de imagens é, no entanto, tão atual quanto este exato segundo: superação. Para ter a imagem destacada nos cartazes da turnê do Dance Theatre of Harlem que estreará nos Estados Unidos, em abril, foi preciso que o talento de Ingrid fizesse um “pas de deux” com a resiliência.
Ultrapassei muitos limites com o meu corpo e a minha mente, mas não me arrependo de nada”, cravou a bailarina no texto oficial de divulgação do curta-metragem, parte de uma campanha da Activia.
O vídeo resume, sem palavras, a vida de Ingrid, desde os oito anos de idade, quando subia a Mangueira para dançar. Nenhum detalhe parece ter escapado ao diretor e roteirista Ben Briand: a casa humilde, o carinho dos pais, a importância da professora, a rotina dura, o nascimento do sonho, o foco, a despedida dos pais e do irmão.
As imagens nos Estados Unidos mostram a chegada, o inverno marcante (“Não estava pronta para o frio ou para a neve. Não tinha sequer um casaco”), os próprios limites superados no balé (as aulas eram das 9h às 17h), o “segundo turno” que Ingrid fazia como babá ou garçonete para pagar as contas, o estudo do inglês. A lição também é gritante: oportunidades transformam realidades. Leia abaixo trechos da conversa da bailarina com o Cultura ao Minuto.
Como surgiu o curta-metragem que está conquistando o Brasil?
Eu recebi a proposta para ser Embaixadora Global da Activia. Eles queriam contar a minha história. Esse foi um trabalho maravilhoso, que me deu muitas oportunidades e que serviu para inspirar muita gente.
Em que ponto sua carreira mudou?
Quando vim para Nova York, em 2008, e comecei a dançar com o Dance Theatre of Harlem. Foi ali que comecei as minhas primeiras apresentações profissionalmente.
E antes disso? Fala um pouco do começo de tudo...
Eu fazia ballet desde os meus 8 anos, no Projeto Dançando para não Dançar. Através dele, consegui bolsa para Escola de Dança Maria Olenewa, do Centro de Movimento Deborah Colker, e fiz estágio com o Grupo Corpo. Em 2007, uma professora, Bethania Gomes, que já foi bailarina principal do Dance Theatre of Harlem, sugeriu para a diretora do projeto, Theresa Aguilar, que enviássemos um vídeo para audição. Vim pessoalmente, em 2008. Cheguei em Nova York com Theresa, que ficou um mês comigo. Consegui a bolsa e tive a oportunidade maravilhosa de trabalhar com Arthur Mitchell, fundador da companhia.
Como foi a transição de estudante para profissional?
Eu fiquei uns três meses na escola. Depois, ingressei na companhia jovem, chamada Dance Theatre of Harlem Ensemble. Em seguida, sob direção de Virginia Johson, a companhia seguiu e estamos no nosso quinto ano.
Você já conquistou uma grande parte do seu sonho. O que deseja agora?
Acho que a conquista é diária, a luta é diária. É um sonho cheio de possibilidades infinitas… e eu acredito que ter me tornado bailarina profissional, em uma das melhores companhias do mundo, e me tornado bailarina principal, já é um grande passo. Meu próximo sonho é ter um dia minha mãe na plateia me assistindo a dançar com a companhia.
O Brasil passa por um momento conturbado, como os Estados Unidos. Como o vídeo tem inspirado brasileiros, gostaria de deixar alguma mensagem?
Nunca desistam dos seus sonhos, por mais impossíveis que pareçam. Nada na vida é impossível. Sonhar é apenas o início de uma longa jornada quando você tem foco.
Não posso deixar de perguntar: há planos para ir ao Brasil?
Sim, claro! Talvez no fim deste ano, para o réveillon, mas não está certo ainda.
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