Filme sobre gays em defesa de vítimas da Aids é quase documental
"Não é um filme para passar uma mensagem", disse o diretor na entrevista coletiva
© REUTERS/Eric Gaillard
Cultura Cannes
O título do filme "120 BPM" não esclarece a que batidas por minuto se refere: se às do coração acelerado dos militantes da trama, às da pulsão do orgasmo a que se entregam os protagonistas ou ao ritmo da música house que embala a história.
Pode ser tudo isso, diz o diretor francês Robin Campillo, que compete com o longa no Festival de Cannes. Em seu novo trabalho, o diretor faz um recuo pessoal ao início dos anos 1990 para retratar os gays parisienses do Act Up, grupo aguerrido de defesa de vítimas da Aids.
"Não é um filme para passar uma mensagem", disse o diretor na entrevista coletiva seguinte à exibição do longa. "É para lembrar um grupo de pessoas que se uniram quando a epidemia provocava resultados trágicos e ninguém ousava falar dela."
Entre atos que envolvem interromper seminários de saúde e despejar sangue falso em empresas farmacêuticas, a história do filme se tece em torno da relação entre dois desses militantes, um veterano soropositivo e outro novato soronegativo.
O diretor fez parte do Act Up naquela década. "Vivi coisas que aparecem no filme, como os debates acalorados e ter de vestir amigos que morreram. São momentos ambíguos, até ingênuos. Seria até mais fácil se fossem puramente emocionais."
O registro quase documental com que "120 BPM" retrata os protestos encampados pelos personagens tem ecos de "Entre os Muros da Escola", vencedor da Palma de Ouro em 2008 e dirigido por Laurent Cantet, colaborador frequente de Compillo.A semelhança entre as duas obras talvez explique a acolhida mais calorosa que o filme teve entre o público francês do festival.
DESANCANDO O MUNDO DA ARTE
Outro título em competição é a comédia de tintas surrealistas "The Square", do sueco Ruben Östlund. O diretor de "Força Maior" (2014) volta aqui a mirar a câmera para dilemas morais, mas agora para desancar o universo da arte contemporânea.Estão ali a incompreensibilidade dos textos de catálogo de exposição, os performers que não têm noção alguma de limites e as obras de arte pós-moderna de qualidade inquestionável.
Christian (Claes Bang), epítome do europeu urbano, é o curador de um museu que sente que precisa "viralizar" para atrair mais visitantes. A solução que lhe dão, contudo, toma rumos catastróficos numa história repleta de situações à beira do absurdo.
"Qualquer coisa pode acontecer num filme em que um macaco aparece num apartamento", diz Östlund. E de fato, "The Square" traz um chimpanzé aleatório numa das cenas. "Gostamos de macacos porque eles são nossos espelhos, mas despidos de cultura. São o que seríamos caso fôssemos puro instinto. O filme é muito sobre isso."
(Folhapress)