Cannes: americano mostra suspense com erotismo e matador de cachorros
Under the Silver Lake" é o que seria se um filho bastardo de Hitchcock fizesse um longa-metragem sob efeito de opioides
© REUTERS/Eric Gaillard
Cultura Pop
GUILHERME GENESTRETI - Na disputa pela Palma de Ouro, "Under the Silver Lake" é o que seria se um filho bastardo de Hitchcock fizesse um longa-metragem sob efeito de opioides. É um suspense com clima de "Janela Indiscreta" salpicado com referências pop, teorias da conspiração, erotismo e assassinos de cachorros.
Some-se a isso o fato de que o diretor americano David Robert Mitchell encena toda essa balbúrdia na região leste de Los Angeles, mote para incluir personagens que vão de milionários new age a prostitutas que se passam por vencedoras do Oscar.
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Andrew Garfield interpreta Sam, vagabundo de 33 anos que passa o tempo entre as HQs e os binóculos com os quais espiona o topless da vizinha. Numa dessas, topa com Sarah (Riley Keough), loura insinuante recém-chegada ao prédio.
Os dois chegam a trocar beijos, mas ela some na manhã seguinte, deixando o apartamento completamente vago. Na busca por Sarah, Sam se enreda em um mistério noir que pode (ou não) ter a ver com um maníaco matador de cachorros e um magnata desaparecido.
Novato na competição de Cannes, Mitchell é um diretor de 44 anos que caiu na moda depois do terror "Corrente do Mal" (2015), sobre uma entidade maligna que infecta as pessoas por meio do sexo. Embora aplaudido, seu "Under the Silver Lake" é tão embebido em citações ao universo de Hollywood que dificilmente comoverá um júri multicultural como o do festival.
É também uma obra escapista, que perde pontos para o outro dos únicos dois filmes americanos na disputa pela Palma de Ouro, o politizado "BlacKkKlansman", de Spike Lee. Greve na tela Na contramão do verniz pop de "Under The Silver Lake", está o francês "En Guerre", de Stéphane Brizé, longa de estilo quase documental que fala sobre os efeitos de uma greve numa fábrica no sul da França.
Esse "drama sindical" não poderia ser mais oportuno. Enquanto ele era exibido no suntuoso Palais, na noite de terça (15), o noticiário local tratava de uma greve real, encampada por funcionários da companhia aérea Air France.
A paralisação fictícia de Brizé não é lá muito diferente. Vincent Lindon ("O Valor de um Homem") vive Laurent, líder operário que comanda a sublevação proletária contra uma indústria de autopeças que pretende fechar as portas e se mudar para a Romênia, onde as leis trabalhistas são menos rígidas e os salários, bem menores.
Fora Lindon, o filme conta com um elenco majoritariamente formado por atores não profissionais, oriundos do mesmo universo que ele quer retratar, o da política laboral. Os patrões, sediados na Alemanha, não estão dispostos a ceder, e Laurent enfrenta a debandada de parte dos trabalhadores, seduzidos por uma quantia de dinheiro que pode surgir caso interrompam a greve.
Brizé filma os debates acalorados como se fosse um documentarista invisível, preocupado apenas em abordar o levante, e não a vida pessoal de seus agitadores. Ecoa a mesma estética seca dos irmãos Dardenne. Com poucas chances no festival, "En Guerre" é um longa que tem ressonância numa Europa que debate os efeitos do neoliberalismo e os custos do bem-estar social, principalmente na França.
No país em que a agitação trabalhista é particularmente aguda, fala-se numa paralisação dos serviços ferroviários durante o verão. Na bolha de Cannes, contudo, greve só ressoa quando um ou outro voo da Air France é atrasado. Com informações da Folhapress