Gastos obrigatórios devem crescer R$ 74 bilhões
Para os economistas, também ficou claro que o governo, no curto prazo, não consegue fazer o ajuste sem aumento de impostos
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Economia Ajuste fiscal
O governo apertou o cinto e cortou onde pôde na tentativa de conter gastos e deslanchar o ajuste fiscal em 2015. Na prática, porém, este será mais um ano de aumento de despesas - especificamente das despesas obrigatórias. São aqueles gastos como aposentadorias e pensões, transferências para serviços de saúde e educação, enfim, o conjunto de benefícios previstos em leis que o governo não tem autonomia para mexer.
Segundo o economista Mansueto Almeida, especialista em contas públicas, o próprio governo projeta que as despesas obrigatórias vão ter um aumento de R$ 74 bilhões neste ano. É muito, segundo ele, em um período de inflação a 10% e retração de 3% do Produto Interno Bruto (PIB). Para o ano que vem, o governo chegou a estimar alta de R$ 105 bilhões nesses gastos. Depois voltou atrás, e prevê aumento de R$ 75 bilhões - o que Mansueto considera complicado. "A combinação de recessão com inflação tende a piorar o resultado."
O que chama a atenção é que mais da metade do aumento é gasto com a Previdência: R$ 42 bilhões neste ano e quase R$ 55 bilhões no próximo. Há esse salto no valor de um ano para outro porque o peso da Previdência é crescente. Para se ter uma ideia, estima-se que os gastos com o INSS crescerão 0,9% do PIB neste e no próximo ano. Trata-se de uma alta igual à vista de 2003 a 2014. "Em apenas dois anos, os gastos do INSS vão crescer o mesmo que em toda a década passada", diz Mansueto.
Na avaliação dos economistas, o aumento do gasto fixo ressalta a importância de dois pontos recorrentes na discussão do ajuste fiscal. O primeiro é que se tornou urgente fazer a reforma da Previdência. Ela não teria impacto agora, mas mudaria o cenário, que é muito ruim. Estima-se que o gasto com a Previdência vai atingir R$ 1 trilhão ao fim de 2050 (ler matéria abaixo). Para se ter uma ideia do que isso representa, o valor equivale a praticamente todo o orçamento do governo hoje.
"Apesar de o Brasil ainda ser jovem, os gastos com a previdência têm um padrão espetacular de crescimento e vão se acelerar ainda mais nos próximos anos porque a população está envelhecendo", diz Paulo Tafner, economista e pesquisador na área de Previdência
Em proporção ao PIB, o gasto brasileiro já é semelhante ao da Alemanha e do Japão, onde a maioria da população é idosa. Aliás, no mundo, só dois outros países com população jovem têm padrão de gasto semelhante: Polônia e Turquia.
Razões
Segundo Tafner, o Brasil gasta demais com previdência por inúmeras razões, mas ele destaca três. A primeira é que as regras de concessão dos benefícios são muito generosas. O brasileiro consegue se aposentar com cerca de 55 anos, quando em países mais velhos a média é de 65 anos. Também pode acumular mais de um benefício: receber a própria aposentadoria e a pensão de um companheiro falecido, por exemplo.
O segundo problema é o rápido envelhecimento da população. No curto prazo de quatro décadas, entre os anos de 2010 e 2050, o número de idosos vai praticamente se multiplicar por três: vai passar de 19,6 milhões para 66,5 milhões.
Pesa ainda o fato de os benefícios serem indexados. O piso da aposentadoria segue o salário mínimo, os demais têm reposição pela inflação. Aliás, cerca de 48% da despesa do governo é indexada. Tafner apresentou os dados no Seminário Desafios da Previdência, promovido pelo Insper, na quinta-feira.
Impostos
Para os economistas, também ficou claro que o governo, no curto prazo, não consegue fazer o ajuste sem aumento de impostos. De um lado, porque não obteve apoio no Congresso para aprovar todos os cortes que desejava. De outro, porque a recessão veio pior do que o previsto e derrubou a arrecadação. "Se você traçar um gráfico com receitas e despesas, vai ver que a despesa é rígida e crescente, e a receita é sensível ao ciclo econômico: está despencando", diz a economista Vilma da Conceição Pinto, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (IBRE/FGV).
Para Mansueto, o dramático é que, ao final, este será um ano perdido para o superávit primário (a economia para o pagamento de juros da dívida). "Viramos 2014 com déficit de 0,6% do PIB e projetando superávit de 1,2%, mas terminamos com um déficit de quase 1%: não é que o ajuste não tenha avançado, ele retrocedeu", diz. Ou seja: a economia prevista de R$ 66 bilhões foi se transformando em um rombo de R$ 52 bilhões. Se for incluído o gasto com as chamadas "pedaladas", as contas públicas fecham o ano com um buraco de R$ 120 bilhões. Com informações do Estadão Conteúdo.