Em almoço com banqueiros, Haddad diz que pode discutir novos cortes se necessário
Segundo ele, daqui a três meses pode estar discutindo o pacote de corte se for necessário. "Se tiver algum problema, vamos voltar para a planilha, para o Congresso, para o presidente Lula."
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Economia FERNANDO-HADDAD
ALEXA SALOMÃO, ANA PAULA BRANCO E JÚLIA MOURA
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - "Não vamos conseguir fazer tudo que precisa ser feito numa bala de prata. Esse conjunto de medidas não é o 'gran finale' de tudo que precisa fazer", afirmou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, sobre o pacote do governo federal para o corte de gastos, anunciado neste semana e mal recebido pelo mercado.
Segundo ele, daqui a três meses pode estar discutindo o pacote de corte se for necessário. "Se tiver algum problema, vamos voltar para a planilha, para o Congresso, para o presidente Lula."
As declarações foram feitas em almoço anual promovido pela Febraban (Federação Brasileira de Bancos), nesta sexta-feira (29). O evento reúne os CEOs e as principais lideranças da indústria bancária do país.
Além de Haddad, falou no almoço o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, que em janeiro assumirá a presidência da autoridade monetária. Estavam presentes as ministras do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet; da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, O ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, teve o voo cancelado e enviou um representante da pasta.
O ministro da Fazenda sentou-se entre o presidente do BTG Pactual, André Esteves, e o CEO do Itaú, Milton Maluhy, do Itaú. À sua frente, estava o presidente do conselho do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco. O clima era de descontração.
Durante sabatina conduzida pelo presidente da Febraban, Isaac Sidney, e João Borges, diretor de Comunicação da entidade, Haddad repetiu que o governo atual está "pagando até hoje gastos que foram herdados de governo passado".
Também procurou reduzir as preocupações do mercado com a proposta de isenção de IR para quem ganha até R$ 5.000. "Quem decidirá a isenção é o Congresso", afirmou. Pouco antes, os presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco, e da Câmara, Arthur Lira, divulgaram mensagens dizendo que a medida só será apreciada no próximo ano e só será aprovada se não houver impacto para as contas públicas.
Haddad foi em linha com Pacheco e disse que há um acordo que a reforma da renda ocorra com um pressuposto: ele não será votado sem neutralidade tributária, ou seja, sem que novas receitas compensem a perda de arrecadação.
O ministro afirmou ter uma boa relação com pessoas do mercado financeiro, mas relembrou que as projeções financeiras erraram o crescimento do PIB e o resultado fiscal do governo.
"Só não vamos ter déficit zero porque não consegui aprovar tudo o que eu queria", citando, entre outras medidas, o fim do Perse, programa de redução de tributos criado durante a pandemia para aliviar perdas de empresas principalmente do setor de eventos e entretenimento.
Durante a conversa, o ministro disse que cálculos de alguns analistas que prevêem uma economia menor que a projetada pelo governo estão equivocados e que a economia do Brasil está bem: citou recorde da indústria automobilística, crescimento da concessão de crédito e do PIB (Produto Interno Bruto).
"Se o governo estivesse se descuidando do fiscal, não haveria bloqueio de R$ 20 bilhões", afirmou.
Haddad disse que o alinhamento com o Congresso "não poderia ser melhor" e reforçou a possibilidade de abrir o semestre legislativo do próximo ano com medidas corretivas.
O presidente da Febraban lembrou ao ministro que, se a isenção de IR foi uma promessa de campanha, o governo Lula também prometeu contas públicas equilibradas. "Para qual lado o presidente Lula irá pender?", questionou.
Em resposta, o ministro -que afirmou ter uma relação com o presidente Lula "mais informal do que deveria ser"- voltou a dizer que o mandatário entende que o ajuste fiscal é importante.
Apesar de sinalizar a possibilidade de ampliar o pacote, o ministro não detalhou eventuais medidas quando o presidente da Febraban perguntou o "que estava na caixa de ferramentas" do governo.
Tebet também tentou acalmar ao mercado, afirmando que ela, "uma liberal", não estaria até o momento no governo "se o presidente Lula não tivesse compromisso com o fiscal".
A ministra afirmou que o pacote de ajuste fiscal divulgado nesta semana "é uma entre tantas medidas que vão ser apresentadas, quantas forem necessárias para cumprirmos o déficit zero". "Nós precisamos garantir sustentabilidade da dívida pública. É isso que vai fazer que os juros do Banco Central caiam."
Tebet reforçou que o programa Pé-de-Meia -que prevê pagamentos mensais e poupança para alunos de baixa renda do ensino médio financiado por meio de recursos do FGO (Fundo Garantidor de Operações)- vai ser incluído no Orçamento federal a partir do ano de 2026 e que "foi um erro" não estar neste ano.
Sobre saúde e educação não terem entrado no corte neste ano, a ministra afirmou que o governo teria dois problemas: o político, que provavelmente atrasaria a aprovação, e a necessidade de "colocar um pouquinho mais de dinheiro", sendo que estão trabalhando aquém do limite do arcabouço.
A ministra falou também sobre a prorrogação da DRU (Desvinculação de Receitas da União), instrumento que permite ao Executivo usar livremente até 30% das receitas vinculadas. Sua vigência iria até o final deste ano, e o governo propõe prorrogá-la até 2032.
"Nós estendemos a desvinculação da receita para algumas contribuições patrimoniais. Isso vai diminuir a pressão e a emissão de dívida pública. Isso vai permitir que nós tenhamos espaço fiscal, porque o grande problema do Brasil, lamentavelmente, é a indexação. O problema do Brasil é não ter espaço para gastar naquilo que chamam de despesas discricionárias."
Após semanas de expectativa pelo anúncio, a proposta final do governo federal decepcionou o mercado financeiro, que esperava medidas de maior impacto fiscal e viu o anúncio como populista a inclusão neste momento a elevação para até R$ 5.000 a faixa de isenção de IR (Imposto de Renda), tendo como fonte a taxação de quem tem renda superior a R$ 50 mil mensais.
A reação negativa levou o dólar a superar pela primeira vez na história a barreira nominal de R$ 6. A moeda americana recuou após as mensagens de Pacheco e Lira.
O futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, disse que as expectativas sobre o pacote de medidas estão desencoradas e causam desconforto no BC. Ele relembrou que o mercado de trabalho está aquecido, com desemprego de 6,2% no trimestre terminado em outubro, o menor patamar da história da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), divulgada pelo IBGE nesta sexta (29).
"Acredito que a reação muito imediata do mercado foi fruto talvez de uma falta de comunicação. Os textos não foram apresentados e todo mundo saiu fazendo conta e não acreditou muitas vezes nos números que estavam sendo apresentados", disse Tebet.
"A sustentabilidade da dívida é o que vai fazer com que a gente facilite a vida do novo presidente do Banco Central. Os juros no Brasil precisam cair, mas para cair nós também precisamos fazer o dever de casa. Nós sabemos qual é o dever de casa. Garantir justiça social para as pessoas com responsabilidade fiscal", afirmou a ministra.
O pacote federal prevê uma economia de R$ 71,9 bilhões em 2025 e 2026 e economia de R$ 327 bi até 2030.
O corte inclui ainda o salário mínimo, o teto do funcionalismo público e medidas para a Previdência de militares, com a instituição de idade mínima para a ida para a reserva e a limitação de transferência de pensões. A idade de aposentadoria deve ser fixada em 55 anos, e o governo deve colocar fim ao pagamento de pensão para familiares de militares expulsos das Forças, os chamados "mortos fictícios", que custam só para o Exército cerca de R$ 20 milhões por mês.
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