Magalu cria 'ecossistema' para não depender de móveis e eletro
Querendo modernizar a imagem da loja, ela criou um concurso na rádio local para que os clientes escolhessem o novo nome do empreendimento.
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Economia MAGAZINE-LUIZA
(FOLHAPRESS) - Tudo começou com A Cristaleira, em 1957, quando um casal de vendedores, Luiza Trajano e Pelegrino José Donato, comprou uma loja de presentes em Franca, a 409 km da capital paulista. Querendo modernizar a imagem da loja, ela criou um concurso na rádio local para que os clientes escolhessem o novo nome do empreendimento.
Os magazines estavam na moda e não tardou para que o público associasse a expressão ao nome da proprietária, uma vendedora simpática que se esforçava para deixar todos muito à vontade para comprar.
Quase 50 anos depois, em 2003, o sobrinho-neto de Luiza, Frederico Trajano, também sentiu necessidade de modernizar a imagem do Magazine Luiza e criou a Tia Luiza, uma personagem virtual que recebeu o nome da fundadora com a missão de apoiar os consumidores que começavam a fazer suas compras pela internet.
Passados mais de 20 anos, a Tia Luiza se tornou "Lu", influencer e garota-propaganda oficial do Magalu, a nova marca do Magazine Luiza, um negócio que foi muito além da venda de móveis, eletroeletrônicos e eletrodomésticos e fatura R$ 46 bilhões ao ano.
Hoje o Magalu é um conglomerado de empresas, ou "ecossistema", que reúne companhias de logística (Magalog), anúncios digitais (Magalu Ads), computação em nuvem (Magalu Cloud), serviços financeiros (Magalu Bank), além das plataformas de comércio eletrônico Netshoes (roupas e artigos esportivos), Época Cosméticos, Zattini (calçados), KaBum! (games), Aiqfome (delivery de comida) e Estante Virtual (livros). Tudo isso sem abrir mão das 1.245 lojas que se transformaram em hubs logísticos, para entrega de produtos vendidos online.
"O Magalu é uma plataforma digital com pontos físicos e muito calor humano", diz Bernardo Leão, diretor de marketing do Magazine Luiza, entrevistado do videocast da Folha de S.Paulo, Arena do Marketing, desta quinzena. "A gente mantém não só com clientes, mas também com fornecedores, sellers [vendedores das plataformas digitais do grupo] e funcionários uma relação de confiança e parceria. É o legado da construção dessa marca ao longo dos últimos 67 anos."
Como exemplo, ele cita um dos "rituais" do Magazine Luiza, perpetrado pela atual chairman, Luiza Helena Trajano, sobrinha da fundadora, que esteve à frente da varejista até 2015. "Toda segunda-feira de manhã, às 8h30, os funcionários têm um rito de comunhão: cantamos o Hino Nacional e o hino do Magalu. É uma empresa que aposta muito no Brasil, isso faz parte dos valores da família fundadora e é repassado para a empresa como um todo."
Fred Trajano, filho de Luiza Helena, assumiu o comando dos negócios em 2015 e deu impulso à expansão digital do grupo, com a criação do "ecossistema". "Nessa primeira fase, até 2020, o foco esteve na digitalização das operações, o que foi acelerado pela pandemia", diz Leão. "Em 2025, vamos encerrar o segundo ciclo, com a consolidação de um grupo de empresas que opera em sinergia e diversifica a atuação do Magalu."
Uma das tacadas mais recentes neste sentido foi a associação com o rival chinês AliExpress, uma das maiores plataformas globais de comércio eletrônico. Hoje, milhares de produtos do AliExpress são vendidos por meio dos canais digitais do Magalu, enquanto produtos do Magalu são oferecidos na plataforma brasileira do parceiro chinês.
"O Magalu já é líder nas vendas online dos produtos que custam mais de R$ 1.000, como geladeiras, celulares, aparelhos de TV e de ar-condicionado", diz Leão. Com as demais plataformas, como Netshoes e Época Cosméticos, também conseguiu espaço no tíquete-médio intermediário, entre R$ 200 e R$ 1.000. "Faltava crescer nos produtos de até R$ 200, o que está sendo possível a partir da parceria com o AliExpress", diz.
Ao expandir os negócios para muito além do varejo que nasceu no interior, o Magazine Luiza também procura se blindar contra os solavancos da economia. Nos últimos anos, as empresas que vendem móveis e eletro, categorias altamente dependentes de crédito, passaram por maus bocados: o escândalo da Americanas fez secar o crédito e a concorrência está cada dia mais acirrada, com o avanço dos rivais asiáticos. Além disso, a taxa de juros a dois dígitos vem minando o caixa das empresas. O próprio Magalu enfrentou uma sequência de trimestres de prejuízo, mas já voltou ao lucro.
"Estamos, rapidamente, nos transformando num negócio à prova de Selic", disse Fred Trajano, ao anunciar os resultados do terceiro trimestre deste ano. "Não é pouca coisa num país como o Brasil."
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