Saída do acordo nuclear isolou EUA e gerou incerteza sobre o petróleo
No aspecto das relações exteriores, a maioria dos analistas vê a saída norte-americana do Plano de Ação Integral Conjunto, nome oficial do acordo, como um erro estratégico
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A retirada dos Estados Unidos do acordo nuclear com o Irã representou um isolamento dos parceiros europeus. Os impactos externos, internos e econômicos da decisão tomada pelo presidente Donald Trump devem ser percebidos de forma gradual. Essa é a análise de acadêmicos e economistas ouvidos pela Agência Brasil.
No aspecto das relações exteriores, a maioria dos analistas vê a saída norte-americana do Plano de Ação Integral Conjunto, nome oficial do acordo, como um erro estratégico. Na questão energética, a avaliação é de que a influência no preço do petróleo vai depender do alcance e das sanções a serem aplicadas pelos Estados Unidos.
Internamente, a decisão do presidente Donald Trump foi vista como mais um movimento para agradar ao eleitorado conservador. Na terça-feira (8), o republicano anunciou oficialmente a retirada dos Estados Unidos do pacto e assinou memorando presidencial para reestabelecer sanções econômicas, que classificou de “poderosas” e “de mais alto nível”.
Ainda na campanha eleitoral, Trump faz severas críticas ao pacto e o classificou como o “pior acordo da história”. O compromisso foi assinado em 2015 pelo antecessor Barack Obama e pelos líderes de Reino Unido, França, Alemanha, China e Rússia.
Organizações da sociedade civil e pesquisadores norte-americanos se somaram a países europeus na crítica da decisão tomada por Trump. O ex-presidente Barack Obama,que defende o acordo como uma conquista da diplomacia democrata, classificou o anúncio de “um grande equívoco”.
A Organização Não-Governamental Nuclear Threat Initiative (Iniciativa de Ameaça Nuclear, NTI na sigla em inglês), que atua em Washington, afirmou que o abandono viola o acordo nuclear com o Irã.
O diretor executivo da NTI, Ernest J. Moniz, afirmou que a medida foi um “erro estratégico” e que “os Estados Unidos estão agora violando os termos do acordo sem oferecer uma alternativa verossímil”. Ele acrescenta que a decisão prejudica tanto a capacidade dos Estados Unidos de impedir que o Irã adquira material para construir uma arma nuclear, como também prejudica a capacidade de inibir a disseminação e o uso de armas nucleares no mundo.
Para o especialista, a retirada dificulta ainda o trabalho norte-americano com aliados e parceiros em questões de interesse global e causa danos aos interesses do país no Oriente Médio por anos ou talvez décadas. Moniz fez as declarações em um comunicado enviado por e-mail à Agência Brasil e publicado na página da instituição.
O diretor-presidente da Foundation for Defense of Democracies (Fundação em Defesa das Democracias, FDD), Jonathan Schanzer, discorda das críticas. A ONG conservadora norte-americana, com sede em Washington, defende que o acordo nuclear tem profundas falhas que o inviabilizaram. “Se houvesse uma maneira de consertar, isso provavelmente teria sido ótimo”, afirmou.
Em um artigo publicado na página do FDD, Schanzer defendeu que os termos tinham “lacunas". E argumentou que não foi possível encontrar uma solução no diálogo entre Washington e os europeus (Reino Unido, França e Alemanha).
Schanzer, que é ex-analista sobre terrorismo do Departamento do Tesouro, argumentou que “Trump seguiu seus instintos”. O que vem agora, na visão dele, depende de como os Estados Unidos articularão a aplicação de sanções.
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Como no abandono do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, a saída do pacto multilateral com o Irã aprofunda movimentos isolacionistas da Casa Branca da atual gestão.
O professor de Ciências Políticas do Colorado College, em Colorado Springs, Robert Lee, afirmou em uma entrevista por e-mail à Agência Brasil, que a decisão de Trump afasta o país da Europa e parece “encorajar os europeus a se unirem em defesa de uma política externa única e independente”.
Lee acredita que “essa (nova) política pode ser levemente hostil às iniciativas dos Estados Unidos em todo o mundo e mais receptiva às iniciativas russas e chinesas”. A avaliação dele é compartilhada pelo diretor da NTI, Ernest Moniz, que acredita que Trump “criou uma profunda divisão entre os Estados Unidos e os aliados na Europa”.
Para a ONG conservadora FDD, no entanto, o retorno das sanções é a "única chance" de fazer com que o Irã realmente abra mão de seus programas nucleares. “Se quisermos restabelecer a pressão financeira e diplomática sobre o regime em Teerã, essa pressão deve ser esmagadora. Deve impor tanta dor econômica que o Irã permanentemente deixe de procurar armas nucleares”, acredita o diretor da instituição.
As economias mundiais observam o movimento do mercado energético. Analistas esperam os reflexos da esperada restrição dos Estados Unidos à compra do petróleo iraquiano para saber como isso influenciará o mercado global nos próximos meses. As sanções norte-americanas no setor petrolífero devem ser retomadas daqui a 90 dias.
O Centro de Estudos e Referência Petroleum Economist (Economista do Petróleo) avalia que embora o acordo nuclear iraniano se mantenha com seis outros signatários comprometidos, o papel dominante dos Estados Unidos na economia global garante que a decisão de Trump causará impacto nas linhas de abastecimento de petróleo e gás do mundo. A instituição reúne especialistas em política e economia na área de energia e combustível no mundo.
Além disso, a subida de preços do petróleo tipo brent durante a semana representou um alerta ao mercado. Mas a resposta iraniana amenizou um pouco os ânimos, segundo o analista Justin Jacobs, da Petroleum Economist. Para ele, “o governo iraniano se posicionou com uma alternativa responsável”.
No mesmo dia do anúncio de Trump, o presidente do Irã, Hassan Rouhani, disse que manterá o acordo nuclear. Rouhani ordenou ao Ministério de Relações Exteriores do país que faça consultas e discussões com a França, Alemanha, o Reino Unido, a Rússia e China, para a permanência do pacto.
Jacobs afirma, no entanto, que não é possível antecipar os desdobramentos dos próximos meses. “As forças conservadoras no Irã, que há muito criticam o acordo, se sentirão encorajadas e pressionarão por uma abordagem mais adversa aos Estados Unidos, o que pode incluir a retomada do programa nuclear”, avalia.
A questão-chave para o especialista é entender quanto petróleo será retirado dos mercados globais à medida que as sanções forem restabelecidas.
O anúncio de Trump poderá ecoar positivamente junto ao seu eleitorado, mas é pouco provável que melhore a avaliação do governo. Atualmente a aprovação do republicano está abaixo dos 40%. A análise é do professor Robert Lee, em entrevista à Agência Brasil.
Para o professor de Ciência Política, o acordo com o Irã constituiu uma conquista importante de Barack Obama. Mas Trump, segundo ele, parece estar competindo contra o legado do democrata, tanto em questões de política externa, quanto interna.
Lee acredita ser difícil enxergar o sentido político ou estratégico para justificar a decisão de abandonar o pacto iraniano. “Será que ele (Trump) vai convencer os norte-americanos de que um conflito armado com outro país do Oriente Médio é do interesse nacional? Eu acho isso implausível”, concluiu. Com informações da Agência Brasil.