Entenda a turbulência na Petrobras e o histórico de crise na estatal
Perguntas e respostas sobre o caminho da empresa até o pedido de demissão de Pedro Parente
© REUTERS/Diego Vara
Economia Empresa
Nesta segunda-feira (4), as ações da Petrobras abriram em alta, mostrando uma recuperação após o tombo da semana passada. No Ibovespa, os papéis preferenciais avançam 6,31%, enquanto os ordinários sobem 6,14%.
O respiro vem após duas semanas de turbulência, nas quais a Petrobras perdeu R$ 137 bilhões em valor de mercado. Só na última sexta-feira (1º), com o pedido de demissão de Pedro Parente da presidência da Petrobras, as ações da estatal despencaram quase 15%.
O que provoca essa turbulência é a possível mudança no estilo de gestão e na política de preços da empresa.
Leia abaixo perguntas e respostas sobre a queda de Parente, o que acontece a partir de agora e os percalços da empresa desde que começou a Operação Lava Jato.
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Por que as ações caíram nos últimos dias?
A saída de Pedro Parente foi vista como um sinal de as necessidades do governo interferiram na empresa durante a crise dos caminhoneiros, e de que essa ingerência pode aumentar no futuro. A política de preços de combustíveis, implementada no fim de 2016, já sofreu um arranhão e pode ser sacrificada se o governo Temer quiser efetuar mais mudanças.
O que é a política de preços da Petrobras?
A política permite que a estatal faça reajustes no preço dos combustíveis com base na variação do valor internacional do barril de petróleo e a cotação do dólar, o que agrada investidores, já que dá previsibilidade ao lucro da Petrobras.No passado, a Petrobras passou por períodos em que os combustíveis foram subsidiados, para prevenir que choques no mercado externo aumentassem repentinamente o preço da gasolina e do diesel nos postos, como ocorreu neste ano.
O que o governo Temer mudou por causa dos caminhoneiros?
Cedendo à pressão dos caminhoneiros, o governo anunciou, em 27 de maio, uma redução de R$ 0,46 no preço do diesel por 60 dias. Depois disso, os reajustes serão mensais. Quem vai cobrir essa diferença nos preços não é a Petrobras, e sim o Tesouro Nacional.
O subsídio será determinado pela diferença entre o preço de referência, definido com base na cotação internacional do petróleo, e o preço de comercialização, que será praticado nas refinarias. Se o preço de comercialização for inferior ao de referência, o governo vai subsidiar até o limite de R$ 0,30 por litro -acima disso, autorizará o repasse.
Se é o governo que paga a conta, por que isso desagradou Parente?
O embate entre a Petrobras e o Ministério de Minas e Energia girou em torno do preço de referência. A Petrobras pleiteou o direito de estabelecer ela mesma esse valor, enquanto Minas e Energia defendeu que essa é uma atribuição da ANP (Agência Nacional de Petróleo). A posição do ministério prevaleceu.
Sob condição de anonimato, pessoas próximas à estatal dizem que basta a ANP não repassar corretamente a variação do petróleo para que o governo -que controlaria na prática os preços de comercialização e de referência- determine o tamanho da subvenção conforme sua disponibilidade de caixa.
Além disso, o preço do petróleo no mercado internacional é apenas um dos itens que a Petrobras considera para definir seus preços. Também estão embutidos no seu cálculo variáveis como despesas administrativas, investimentos e margens de lucro. Na prática, a empresa perdeu autonomia na sua política de preços e sofreu um tabelamento indireto.
Essa nova regra entra em vigor quando?
Estamos, agora, na primeira fase do programa de subvenção, que dura até 8 de junho. Ainda não foi publicado o decreto que vai regulamentar a segunda fase do programa de subvenção ao óleo diesel, que estabelecerá as regras para a subvenção até o final do ano. É nessa fase que entra o novo preço de referência estabelecido pela ANP.
E os outros combustíveis?
O governo garantiu que a política de preços vai continuar para os demais combustíveis, mas há uma especulação de que o mesmo que já aconteceu com o diesel poderia ser estendido à gasolina e ao gás de cozinha.
De onde veio o novo presidente interino, e o que o nome dele representa?
Até então diretor financeiro da Petrobras, Ivan Monteiro esteve à frente de ajustes nas finanças da companhia nos últimos anos. É um nome conhecido no mercado financeiro: foi vice-presidente de gestão financeira e de relações com investidores do Banco do Brasil, além de gerente executivo da diretoria internacional do banco.
Quando seu nome foi anunciado, Temer disse que não haveria qualquer interferência na política de preços da companhia e que "Ivan Monteiro é a garantia de que este rumo permanece inalterado".
Para quem não tem ações da Petrobras, qual o impacto dessa turbulência na empresa?
Economistas debatem se a política de preços é benéfica para a sociedade como um todo. Não há um consenso quanto a isso, mas 87% dos brasileiros apoiaram as paralisações de caminhoneiros para abaixar o preço dos combustíveis, segundo pesquisa Datafolha.
O prejuízo mais claro dos acontecimentos das últimas semanas é que o subsídio do diesel será compensado com um corte nos orçamentos de saúde e educação do governo federal ainda neste ano.
ENTENDA O HISTÓRICO DE CRISE DA EMPRESA
Que motivos levaram à queda das ações e ao mau desempenho da Petrobras antes da gestão de Pedro Parente?
A empresa foi vítima de loteamento político, foi usada para combater a inflação a partir de um controle de preços do Estado e teve prejuízos bilionários por decisões injustificadas de seus executivos.
Como se deu o uso político da companhia?
A partir da nomeação de executivos que desviavam recursos de obras da estatal para financiar os políticos que os mantinham em seus cargos, como apontado pela Operação Lava Jato.
Entre os executivos do alto escalão da companhia que foram presos em decorrência da operação estão o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa, Nestor Cerveró, ex-diretor da área internacional, e Pedro Barusco, ex-gerente de serviços da estatal.
Quais os reflexos desse loteamento?
Foi identificado superfaturamento em diversos projetos da companhia pelo Tribunal de Contas da União e por relatórios internos da própria estatal.
No caso da compra da refinaria de Pasadena, em 2006, nos EUA, o TCU estimou que a operação resultou num prejuízo de US$ 792 milhões (cerca de R$ 3 bilhões).
Já o prejuízo estimado com a refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, foi de ao menos US$ 3,2 bilhões em 2015. A obra, que foi orçada em US$ 2,4 bilhões, já tinha custo previsto de US$ 18,5 bilhões naquele ano.
No Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro), a estatal comprou equipamentos antes de definir o modelo de negócio e a estrutura de produção da refinaria, o que gerou um prejuízo calculado em mais de mais de R$ 1 bilhão em 2015, considerando gastos para evitar a deterioração de aparelhos e unidades sem uso.
Como a propina foi contabilizada?
No balanço anual que a companhia publicou em abril daquele ano, foi registrado perda de R$ 6,194 bilhões relacionadas à corrupção.
Quais as consequências da identificação dos problemas?
No início de 2015, Graça Foster, a então presidente da Petrobras, renunciou ao cargo junto a outros cinco dos sete diretores. Foi substituída por Aldemir Bendine, que comandava o Banco do Brasil.
Além disso, a empresa foi alvo de uma ação coletiva movida por investidores americanos que buscavam reaver seus prejuízos. O caso foi encerrado em janeiro deste ano, quando a companhia fechou um acordo de 2,95 bilhões.
Antes da chegada de Parente, os problemas foram resolvidos?
Não. Bendine, que foi presidente da Petrobras até meados de 2016, foi preso pela Lava Jato em julho de 2017. Ele é suspeito de ter recebido R$ 3 milhões em propina da Odebrecht para proteger a empreiteira em contratos mantidos com a Petrobras.
Quando a companhia chegou ao fundo do poço?
A soma da corrupção com os problemas de gestão da empresa, o controle de preços para combater a inflação e a queda da cotação internacional do petróleo fizeram a ação da companhia cair para menos de R$ 5 em janeiro de 2016.
Com informações da Folhapress.