Governo pode excluir afastamento por doença de cálculo da aposentadoria
Proposta que reduz tempo para contagem de benefício afetaria os mais pobres, que se aposentam por idade
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Economia Plano
No plano de passar um pente-fino nas regras do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), a equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, estuda dificultar o acesso à aposentadoria para quem tem de se afastar do trabalho por motivo de saúde.
Segundo pessoas envolvidas nas discussões, está no radar um artigo para que o período de recebimento do auxílio-doença seja, na prática, descontado do tempo que se conta para ter direito a se aposentar.
Em termos técnicos, o que ocorreria seria uma mudança na forma de calcular o chamado tempo de carência: o número mínimo de meses pagos ao INSS para ter direito a benefícios, como auxílios e aposentadoria.
Para se aposentar por idade, é preciso ter no mínimo 180 meses de contribuição, o equivalente a 15 anos.
Se nesse período a pessoa tiver algum problema de saúde e ficar afastada por um ano, por exemplo, recebendo auxílio-doença, não poderá contar esse ano na carência. Terá de trabalhar mais um ano para compensar.
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A proposta de alteração na lei considera que, quando a pessoa está afastada e recebe o auxílio, ela não contribui para o INSS.
O impacto recairia principalmente sobre as aposentadorias por idade, afetando pessoas de baixa renda.
É a população mais pobre que geralmente se aposenta por idade no Brasil, pois essa parcela da população não permanece no mercado formal de trabalho por muitos anos.
Pelas regras atuais, homens (65 anos) e mulheres (60 anos) que tiverem pelo menos 15 anos de contribuições à Previdência conseguem esse benefício. Para trabalhadores rurais, são cinco anos a menos para ambos os sexos.
Atualmente, há cerca de 10,77 milhões de aposentados por idade no país, o equivalente a quase 31% dos benefícios da Previdência Social e 27% dos gastos totais.
No ano passado, o valor médio do benefício era de quase R$ 970 –o salário mínimo era de R$ 954.
O pano de fundo da discussão é que a Justiça tem decidido a favor do trabalhador e determinado que, para cálculo da carência, deve ser considerado o tempo de afastamento.
Por exemplo, um homem que completou 65 anos de idade, trabalhou 14 anos formalmente e recebeu auxílio-doença por um ano teria o direito a se aposentar por idade, segundo a regra atual.
A proposta que vem sendo discutida entre técnicos do Ministério da Economia e especialistas em Previdência é para alterar a legislação e impedir esse cálculo.
A mudança geraria pouco efeito nos casos das aposentadorias por tempo de contribuição –em que não há exigência de idade e o tempo de contribuição é de 30/35 anos (mulheres/homens).
Neste caso, há uma carência de 15 anos, mas, como o tempo de contribuição requerido é muito superior, a exclusão do período sob auxílio-doença não seria representativa.
Para o advogado João Paulo Ribeiro, especialista em direito previdenciário, a proposta fere questões básicas da seguridade social.
"Se a pessoa está doente, ela tem de ser amparada pelo sistema. É uma situação contrária à vontade do trabalhador", disse.
A medida provisória (MP) que passará um pente-fino no INSS ainda está em análise pelo governo. O presidente Jair Bolsonaro (PSL) terá de dar o aval e publicar o texto a ser enviado para o Congresso Nacional.
Nesta quarta-feira (9), o secretário especial de Previdência, Rogério Marinho, afirmou que o pente-fino preparado pelo novo governo deve atingir mais de 2 milhões de benefícios pagos pelo INSS com indícios de ilicitude.
Na saída de uma reunião no Palácio do Planalto com Bolsonaro, ele disse que a medida provisória que revê regras previdenciárias atingirá pessoas que já participam e que estão entrando no sistema e que deve ser assinada até segunda-feira (14).
"Há mais de 2 milhões de benefícios que precisam ser auditados, porque têm algum indício de ilicitude. Não significa que sejam ilícitos. Por isso, há necessidade de se fazer uma espécie de mutirão para que nós zeremos esse estoque", disse.
O INSS paga 35 milhões de benefícios por mês.
O secretário afirmou que relatórios governamentais, convalidados pelo TCU (Tribunal de Contas da União), demonstram uma incidência de 16% a 30% de fraudes no pagamento desses benefícios.
Segundo ele, a economia total que a medida pode trazer ainda não foi fechada pela equipe econômica.
Sem dar detalhes, ele disse também que a proposta fará alterações na atual legislação, com o objetivo de dar segurança jurídica à iniciativa, e que haverá mudanças também no auxílio-reclusão.
Ao benefício, de acordo com pessoas que participam das discussões, seria estabelecido um prazo mínimo de 12 meses de contribuições, mas esse período pode ser estendido.
A MP pode economizar até R$ 20 bilhões por ano, informou na terça-feira (8) o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni.