Estudo aponta aumento de câncer em população de 20 a 49 anos
Um estudo mostrou que a incidência por ano do câncer da glândula tireóide registrou uma elevação de 8,8%
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O aumento dos casos de câncer na população entre 20 e 49 anos, de 1997 a 2016 chamou a atenção de especialistas. Nesse período, a incidência por ano do câncer da glândula tireóide registrou uma elevação de 8,8%, o de próstata 5,2% e o de cólon e reto 3,4%. Os dados fazem parte do estudo elaborado pelo Observatório de Oncologia, que teve como tema Câncer antes dos 50: como os dados podem ajudar nas políticas de prevenção.
O trabalho foi apresentado nesta quarta-feira (17), durante o Fórum Big Data em Oncologia, que ocorreu no Museu do Amanhã, no Rio de Janeiro. O encontro foi organizado pelo Movimento Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC).
De acordo com o estudo, houve aumento ainda na mortalidade por alguns tipos da doença. O maior percentual foi de câncer no corpo do útero, que subiu 4,2% por ano; seguido por cólon e reto com 3,2%, mama 2,5%, cavidade oral 1,2% e colo de útero 1%.
A líder do TJCC e presidente da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), Merula Steagall, disse que após pesquisas da Sociedade Americana de Câncer, divulgadas em fevereiro, nos Estados Unidos, identificando a ligação entre obesidade e o aumento nos casos de câncer em indivíduos mais jovens, especialistas do Observatório de Oncologia, que pertence ao TJCC, se dedicaram ao estudo para verificar o que ocorria no Brasil e analisaram dados gerados no setor de Saúde. Foram analisados dados do DATASUS e do Inca.
O resultado, além de um alerta, vai servir para indicar tipos de políticas que podem ser adotadas pelos gestores e impedir que a tendência tenha um crescimento maior.
“Os que aumentaram na incidência e na mortalidade eram cânceres relacionados ao tipo de vida. A gente está pressupondo que álcool, tabaco, alimentação não saudável e falta de prática de exercício podem estar refletindo no aumento de incidência”, detalhou Merula Steagall.
A pesquisadora ainda diz acreditar que o aumento da mortalidade se deu porque as pessoas procuram o tratamento em estágio avançado da doença. ”Como se espera que o câncer é uma doença depois dos 50 anos mais predominantemente, porque as células estão mais envelhecidas e começa uma produção irregular que acarreta no câncer, a pessoa entre 20 e 50 não está atenta para isso. O sistema não facilita o fluxo para ir rápido para um diagnóstico”.
No encontro, os especialistas destacaram dois fatores que contribuem para esses números: a falta de acesso a informações e aos tratamentos. “Esse fator da demora de acesso a um especialista e a um centro adequado também acarreta na mortalidade e a pessoa perde o controle da doença”, contou.
Merula acrescentou que em termos de tecnologia, nesses 20 anos, houve avanços, então, para o especialista é triste verificar que o progresso científico não teve impacto na vida das pessoas. “Não teve resultado para muitos tipos de cânceres. Dos 19 analisados, 10 aumentaram a mortalidade”, observou, destacando a importância da mídia no alerta e na divulgação da vida saudável.
“Você tem que planejar a sua terceira idade enquanto é jovem. Só que as pessoas jovens acham que a mortalidade para elas está distante. Falo isso como uma pessoa com doença genética e como a morte estava sempre próxima sempre me cuidei, me tratei, procurei fazer esportes e tive alimentação saudável. É importante alertar porque precisamos planejar o nosso envelhecimento.”
A médica mastologista, Alice Francisco, teve uma experiência própria com diagnóstico precoce. Ao fazer um exame de rotina para verificar um histórico familiar de hipotireoidismo ficou constatado, mesmo sem ter sintomas, que tinha câncer na tireóide. A avaliação foi há 12 anos, o tratamento foi feito, o tumor sumiu, mas dois anos depois voltou. “Precisei fazer novamente o tratamento. Foi uma coisa bem inesperada para a situação do meu diagnóstico naquele momento”, revelou.
Alice completou que foi muito importante ter o diagnóstico precoce e que pôde ver o quanto é relevante o impacto nos resultados dos tratamentos. A médica reforçou a necessidade de ter bons hábitos alimentares e físicos. “Para mim, isso foi muito importante e adaptar ao meu dia a dia. Hoje eu repercuto muito isso como profissional de saúde e estudo tudo. Uma das minhas linhas de estudo é a atividade física, então, mudou muito a minha forma de ser profissional depois de ter passado por isso”, indicou.
Segundo a presidente da Abrale, o objetivo da entidade é trabalhar junto com o Ministério da Saúde para a definição, entre outras medidas, de maior divulgação de informações sobre o que é a doença, como pode ser diagnosticada e quais são os fatores de risco.
No encontro, foi apontada a diferença de acesso das informações e à disponibilidade de tratamento entre as regiões do país, com maior dificuldade no Norte, no Nordeste e no Centro-Oeste. O diretor do Departamento de Informática do SUS (DATASUS/SE/MS), Jacson de Barros, que participou dos debates, reconheceu que é preciso qualificar mais as equipes de atendimento, que podem apresentar um diagnóstico precoce, facilitar o tratamento e em muitos casos evitar a morte do paciente. Para ele, isso pode também reduzir as sub-notificações. “A gente quer mudar a forma de disponibilizar os dados do DATASUS para que todo mundo consiga além do acesso, poder fazer estudos longitudinais, acompanhar o desfecho. A ideia é aprimorar todo esse sistema”, disse.
O diretor afirmou que falta infraestrutura para permitir o registro adequado da informação. Um estudo do ano passado dos hospitais que têm mais de 50 leitos mostra que mais da metade não tem prontuário eletrônico, ou seja, faz o básico quando o paciente entrou, se precisou ficar internado e quantos dias permaneceu na unidade, mas não é feita uma análise clínica. “Mesmo assim, com as informações que a gente tem ainda dá para sair muito suco de laranja, mesmo não tendo as informações clínicas”, afirmou.
Para resolver o problema das regiões onde há carência de acesso à informação, ao diagnóstico e ao tratamento, o diretor disse que o Ministério da Saúde está fazendo um mapeamento para adequar o primeiro atendimento a fazer o registro adequado. “Será um mapeamento baseado na classificação do IBGE, e para cada região vamos subsidiar soluções para investimento de infraestrutura na ponta e para melhor atender e registrar”, disse.