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Oposição vai perder ou perder na Venezuela, diz instituto de pesquisas

O pleito acontece no dia 6 de dezembro

Oposição vai perder ou perder na Venezuela, diz instituto de pesquisas
Notícias ao Minuto Brasil

06:31 - 21/07/20 por Folhapress

Mundo LUIS VICENTE-LEÓN

BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) - Nas eleições legislativas marcadas para 6 de dezembro, a oposição venezuelana só tem uma alternativa: perder ou perder, afirma Luis Vicente León, economista e presidente do Instituto Datanálisis, principal e mais respeitada empresa de pesquisas da Venezuela.

Para o pleito, a ditadura de Nicolás Maduro já tomou algumas decisões que não estão de acordo com a Constituição: aumentou, de 167 para 277, o número de deputados eleitos para a Assembleia Nacional; e aprovou a nomeação, via Tribunal Superior de Justiça, de novos membros para o Conselho Nacional Eleitoral (CNE). Pela lei, os integrantes do órgão deveriam ser escolhidos pelo parlamento.

Também trocou o diretório dos principais partidos de oposição que formam o chamado G4, grupo dos que apoiam o líder opositor Juan Guaidó.

Tiveram seus comandos trocados por deputados leais à ditadura o Ação Democrática (AD), o Primeiro Justiça, o Vontade Popular -de Guaidó e Leopoldo López- e o Um Novo Tempo.

Por fim, a nova diretora do CNE, Indira Alonso, permitiu o registro de 87 novas agrupações políticas, a maioria ligada ao chavismo, diluindo assim o apoio majoritário à oposição no parlamento.

Os opositores agora se dividem entre os que afirmam crer que é melhor se abster das eleições e os que dizem que é preciso participar, mesmo em condições desfavoráveis.Em entrevista por telefone, Vicente León explica que, de uma maneira ou outra, a votação não deve representar uma mudança real na Venezuela.*PERGUNTA - Por que o sr. considera que as duas posições da oposição constituem um falso dilema?

LUIS VICENTE LEÓN - Porque a oposição perderá das duas formas. A tese dos abstencionistas reside na ideia de que, se não participarem da votação e se recusarem a aceitar o resultado, o que deveria valer é a ideia de continuísmo. Ou seja, defenderão que, como a eleição foi fraudulenta, devem seguir em seus cargos mesmo depois de 5 de janeiro, quando termina o atual mandato da Assembleia Nacional. É possível que vários países apoiem isso e sigam dando respaldo por um tempo.

Mas será uma legitimidade frágil, que não se sustentará a médio prazo. Afinal, se quando tinham os cargos os parlamentares opositores não conseguiram os objetivos do mantra "fim da usurpação, governo de transição, eleições livres", não será como poder alternativo, que sequer tem a ratificação do voto popular, que irão conseguir.

P - E a hipótese de participar, mesmo com a situação adversa?

LL - Também é ruim, porque o governo vai atuar como fez nas últimas eleições de governadores e nas últimas presidenciais. Só permitirá candidatos amenos ou cooptados pelo regime. Ou seja, será uma oposição já resignada de origem. Uma vitória deles, mesmo que aceitem participar sabendo que serão cerceados, mas que ainda assim vale a pena, vai parecer ao eleitor uma aceitação do regime. E, por consequência, eles terão uma popularidade muito baixa, porque não representam uma mudança.

P - Qual é o tamanho da rejeição à ditadura de Nicolás Maduro agora?

LL - Segundo as nossas pesquisas, hoje 83% da população venezuelana querem uma mudança de governo e se definem como anti-Maduro. Porém, isso não significa que sejam antichavistas.

P - Qual o tamanho do apoio ao chavismo hoje e qual poderia ser seu futuro?

LL - O chavismo possui os ingredientes para perdurar a longo prazo, como o peronismo da Argentina ou o sandinismo na Nicarágua. Numa primeira eleição de fato livre e com todos os atores políticos participando, não creio que o chavismo possa ganhar, devido ao desgaste da atual crise econômica e humanitária. Porém, os chavistas podem voltar a ser de fato competitivos a médio e longo prazo. Prova disso é que a aprovação popular de Maduro hoje é de 13%, enquanto a de [Hugo] Chávez [1954-2013], mesmo morto, é de 52%.

Veja o que aconteceu recentemente com o peronismo. Houve uma gestão longa dos Kirchner [2003-2015], com grande desgaste por conta de casos de corrupção e da crise econômica. Aí apareceu Mauricio Macri, uma cara nova, com uma solução rápida a problemas muito complexos. Não deu certo. E o resultado é que, em menos de quatro anos, as pessoas já queriam o peronismo de novo no poder. Isso explica também o retorno de Daniel Ortega e o que restou do sandinismo ao poder na Nicarágua.

P - Mas mesmo 13% parece muito, para o tamanho da crise. Quanto disso é pragmático, quanto é ideológico?

LL - A maior parte deste apoio é de gente relacionada ao Estado, servidores públicos, ou que, na atual conjuntura, têm a ganhar mais com as coisas como estão do que com uma mudança. Ou, ainda, quem quer evitar processos no futuro, por ter sido cúmplice de atos ilícitos do regime. Eu diria que, hoje, apenas uma minoria desses 13% é ideológica, e que coloca em Maduro uma confiança por alguma nostalgia do chavismo de Chávez.

P - O que aconteceu com a imagem de Juan Guaidó?

LL - Primeiro, Guaidó nunca teve uma popularidade que dependesse apenas dele. A popularidade sempre foi baseada na esperança de mudança que ele representa. Quando surgiu, em janeiro do ano passado, e se declarou presidente, disparou para 63% de aprovação popular. Para isso, contribuíram o sucesso de sua estratégia internacional, as sanções dos EUA ao regime e a esperança real de mudança. Na época, nossos números revelavam que mais de dois terços da sociedade afirmavam acreditar que uma mudança de regime ocorreria em, no máximo, três meses.

Mas o tempo passou, e as promessas não foram cumpridas. Além disso, Guaidó cometeu erros, como o levante falido de 30 de abril, e a consequência foi o desgaste de sua imagem. Hoje, Guaidó tem 25% de aprovação popular. Ainda é o líder político mais bem posicionado na Venezuela, mas vem se debilitando, em parte por perda de confiança, em parte pela ideia de que o regime é muito mais forte do que se pensava.

P - E é?

LL - Não, mas a estratégia de Maduro é clara justamente por isso. Ele sabe que se fortalece apenas desgastando e deslegitimando Guaidó. Daí as ações de perseguição a pessoas de seu entorno terem se acirrado, daí a tentativa de, mesmo à força, impedir a votação legítima de sua reeleição à Assembleia Nacional, em janeiro. E essas atitudes recentes de debilitar as chefias dos principais partidos que o apoiam, trocando os diretórios por gente de sua confiança. A estratégia de Maduro é fragmentar a oposição, causar esse cruzamento de ideias, confundi-la. Uma oposição que se una contra ele é uma ameaça, uma oposição pulverizada, que é o que está ocorrendo, é boa para a continuidade do regime, ainda que não tenha respaldo popular.

P - Uma alternativa para Guaidó seria voltar a convocar as pessoas às ruas. Mas a pandemia atrapalha, correto?

LL - Sim, ainda que as pessoas sempre tenham saído às ruas em protesto ao regime mesmo antes de Guaidó. Quando há raiva, rejeição real, as pessoas vão às ruas, desde os primeiros anos do chavismo. O desgaste de Guaidó é anterior à pandemia. No dia da votação de 5 de janeiro, por exemplo, quando ele foi impedido de entrar na Assembleia Nacional, a população foi convocada às ruas e quase ninguém foi. Esse poder de convocatória já estava sendo perdido por esse grupo da oposição.

O que a pandemia dificultou foi a série de protestos pontuais, de reclamações por falta de água, de luz, de comida, de problemas concretos. E esses sempre foram intensos, pela urgência, e serviram de motor inicial para as grandes manifestações. A declaração da quarentena justifica ainda mais o regime proibir e reprimir esses atos, que por ora ficam descartados, portanto, como opção de manifestação de repúdio.

P - Quão confiáveis são os números que o regime divulga sobre o coronavírus? A situação é muito mais grave do que aparenta?

LL - Há dois fatores aí. Seguramente não se pode confiar nos números do governo, assim como não se pode confiar em estatísticas oficiais em nenhuma área há anos. Mas não creio que estejam minimizando tanto a pandemia. Um exemplo hipotético: eles podem estar dizendo que há 500 casos, mas de fato deve haver uns 1.500. Mas não 5.000 ou 10 mil [de acordo com dados coletados pela Universidade Johns Hopkins, até esta segunda-feira o país registrou 11.891 casos e 112 mortes].

Não porque o sistema de saúde seja eficiente, muito pelo contrário, já colapsou muito antes do coronavírus e sequer tem os insumos mínimos para combatê-lo. O que creio é que o país não está tão afetado pela pandemia muito devido a seu isolamento do mundo. Imagine que, pouco antes do coronavírus, entrava no aeroporto internacional de Caracas o mesmo número de pessoas que chegavam do exterior a Bogotá em uma hora e meia de um dia comum. Ou seja, o isolamento é real, e esse vírus é importado.

Agora, estamos tendo um avanço da doença, e é justamente por conta dos refugiados e imigrantes que estão tendo de deixar os países aos quais foram. É nas regiões fronteiriças, nas "trochas" [caminhos ilegais para atravessar a fronteira] com a Colômbia. É na região de Maracaibo. Digo que a pandemia não se mostra tão grave também porque há outros medidores, além do número oficial. Se estivesse muito grave, estaríamos vendo e ouvindo mais histórias de hospitais lotados, de enterros em massa, de gente morrendo em casa. Isso ainda não está ocorrendo como ocorreu em Guayaquil, por exemplo. Maracaibo, porém, é um local em que isso começa a ser visto e onde há mais preocupação. Também em cidades fronteiriças com a Colômbia, como San Cristóbal e San Antonio del Táchira. Creio que os números na Venezuela vão se agravar, mas ainda estamos numa fase anterior em relação a outros países da região.

P - Como poderia ser um processo de transição democrática que funcionasse, de fato, na Venezuela?

LL - Nesses anos todos de chavismo, creio que houve um desgaste muito grande da classe política. Tanto que Maduro e Guaidó têm níveis de aprovação baixas. E a vontade de votar na próxima eleição também não se mostra alta, está em torno de 20%, pelo menos nesse momento em que não estão estabelecidas as regras e os personagens do jogo. Ao mesmo tempo, 57% dos venezuelanos preferem uma solução democrática. O que concluo disso é que as pessoas já não acreditam que se possa confiar apenas em deputados, em políticos, para realizar isso. Tendo a achar que há uma conscientização em curso de que outros setores da sociedade têm de se envolver: a Igreja, as associações de direitos humanos, os familiares de vítimas, os refugiados, os acadêmicos. É preciso uma triangulação entre eles, a oposição e o poder. E há que se pensar que será um processo, não acontecerá num só dia. A história mostra que as transições de sucesso são processos.

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