Ernesto e principal diplomata de Biden conversam em novo esforço de aproximação
Os temas abordados pelas duas autoridades foram cooperação regional, ações de combate à pandemia de Covid-19 e conservação ambiental, entre outros itens da agenda bilateral
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Mundo EUA-BRASIL
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - No primeiro contato de alto nível entre os governos de Jair Bolsonaro e Joe Biden, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, conversou no final da manhã desta quinta-feira (11) com o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken.
A chamada telefônica vinha sendo solicitada pelo Itamaraty, que busca abrir interlocução com as novas autoridades americanas -muitas delas críticas a Bolsonaro.
Os temas abordados pelas duas autoridades foram cooperação regional, ações de combate à pandemia de Covid-19 e conservação ambiental, entre outros itens da agenda bilateral.
De acordo com interlocutores, Blinken aproveitou o telefonema para convidar o presidente Bolsonaro a participar da cúpula sobre mudanças climáticas que Biden deve organizar em 22 de abril. Ernesto disse ao americano que o líder brasileiro pretende fazer parte do evento. Diante da crise sanitária, a expectativa é que esse encontro de líderes internacionais ocorra de forma virtual.
"Tive hoje longa e produtiva conversa com o Secretário de Estado Antony Blinken. Agenda 100% positiva. Ficou claro que há excelente disposição e amplas oportunidades para continuarmos construindo uma parceria profunda entre o Brasil e os Estados Unidos", escreveu Ernesto no Twitter.
"Encontramos convergência de visões sobre a centralidade da democracia e grande empenho em trabalhar juntos nas questões do comércio, do clima e promoção dos direitos humanos. EUA seguem sendo parceiro-chave na transformação do Brasil em torno da liberdade econômica e política", disse o chanceler brasileiro.
Na tarde de quinta, Blinken também comentou sobre a ligação com Ernesto. "Um prazer falar hoje com o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. Eu estou ansioso para trabalhar com o Brasil para expandir nossas parcerias nas áreas econômica, de segurança e de democracia", escreveu o americano no Twitter.
Como mostrou o jornal Folha de S.Paulo, apesar da pressão da ala mais à esquerda do Partido Democrata e de ativistas que pedem medidas punitivas dos EUA contra o governo Jair Bolsonaro, as primeiras ações de Biden sobre a preservação da Amazônia não vão incluir sanções ao Brasil.
A ordem na Casa Branca é apostar em um plano colaborativo para a proteção da floresta, antes de aplicar qualquer punição ao Brasil. Até segunda ordem, o Planalto seguirá tratado como aliado dos americanos.
Já o porta-voz do Departamento de Estado, Ned Price, disse que, durante a reunião, Blinken e Araújo "expressaram seu compromisso em combater a pandemia da Covid-19 e as mudanças climáticas, bem como aumentar a cooperação regional, apoiando a conservação ambiental e os direitos humanos."
A conversa entre os dois já estava sendo esperada para esta semana, período que Blinken reservou para tratar de assuntos com países da América Latina.
A vitória de Biden foi um revés para Bolsonaro, que apoiou abertamente a reeleição de Donald Trump na corrida pela Casa Branca.
O líder brasileiro foi um dos últimos a cumprimentar Biden pela vitória e, poucos dias antes da posse, deu declarações mal vistas por aliados do americano.
Bolsonaro repetiu acusações de Trump -sem provas- de que houve fraude no pleito dos EUA. Em outra frente, Ernesto se referiu aos manifestantes pró-Trump que invadiram o Congresso americano como "cidadãos de bem".
Após a posse de Biden, no entanto, o tom do governo brasileiro mudou e Bolsonaro passou a enviar sinais de conciliação e moderação.
No dia da posse nos EUA, o presidente do Brasil enviou uma carta a Biden na qual defendeu parcerias entre os dois países "em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente".
"Estamos prontos, ademais, a continuar nossa parceria em prol do desenvolvimento sustentável e da proteção do meio ambiente, em especial a Amazônia, com base em nosso Diálogo Ambiental, recém-inaugurado. Noto, a propósito, que o Brasil demonstrou seu compromisso com o Acordo de Paris com a apresentação de suas novas metas nacionais", escreveu Bolsonaro.
A ênfase dada ao tema não foi ao acaso, uma vez que diplomatas preveem que Biden deve colocar forte pressão sobre o Brasil em assuntos ligados à sustentabilidade. O americano elegeu o tema como prioridade e indicou John Kerry, ex-candidato a presidente e ex-secretário de Estado, como seu enviado especial para o clima.
Entre políticos do Partido Democrata, Bolsonaro é visto como um líder de tendências autoritárias que não tem compromisso com a preservação da Amazônia.
No final de janeiro, Ernesto também enviou uma mensagem a Blinken. Na correspondência, o chanceler destacou a agenda e os interesses em comum entre os dois países em áreas como a econômica, a comercial e a ambiental.
O secretário de Estado é o chefe da diplomacia americana, e o cargo tem funções semelhantes ao de ministro de Relações Exteriores no Brasil.
A preocupação no Itamaraty é impedir que as diferenças de opinião entre as administrações Bolsonaro e Biden levem o governo brasileiro a perder interlocução com Washington.
Auxiliares do presidente sabem que setores da sociedade civil críticos a Bolsonaro estão tentando estabelecer diálogo com a administração Biden.
No início de fevereiro, um documento elaborado por professores de universidades e diretores de ONGs internacionais foi entregue a membros da administração americana. O informe defende o congelamento de acordos, negociações e alianças políticas com o Brasil enquanto Bolsonaro estiver na Presidência.
No Itamaraty, o dossiê tem sido tratado como uma proposta elaborada fora do governo americano, mas ele reforçou a necessidade de fazer chegar a Washington os argumentos do governo Bolsonaro.
Assessor próximo a Biden, Blinken foi confirmado no cargo pelo Senado em 26 de janeiro.
Especialistas destacam que a agenda da diplomacia americana deve estar centrada nas relações com China e Rússia, além da reaproximação com aliados tradicionais na Europa. Mas o Brasil foi tema recentemente de uma fala da secretária de Imprensa da Casa Branca, Jen Psaki.
Ela foi questionada sobre o relatório produzido pelas ONGs, mas deu ênfase à parceria comercial entre Estados Unidos e Brasil.
"Nós permanecemos fortemente empenhados numa relação econômica significativa. Somos [os EUA] de longe o maior investidor no Brasil, inclusive em muitas das empresas brasileiras que são mais inovadoras e focadas em crescimento. E nós vamos continuar, nos próximos meses, a fortalecer nossos laços econômicos e a aumentar nossa grande relação comercial, que segue em expansão", disse.