Em reunião privada, embaixador dos EUA dá ultimato a Bolsonaro em metas ambientais
"As relações entre nossos países dependerão muito dessa postura ambiental do Brasil", disse Chapman
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WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) - O governo dos EUA considera a Cúpula de Líderes sobre o Clima, marcada por Joe Biden para a próxima semana, como a última chance de o Brasil mostrar preocupação ambiental para recuperar a confiança dos americanos e ampliar as relações com a Casa Branca.
O recado contundente foi dado pelo embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, durante reunião virtual privada no domingo (11) com políticos, economistas, diplomatas e empresários brasileiros.
Participantes do encontro, promovido pelo Grupo Parlatório, relataram à reportagem que Chapman foi firme ao dizer que o meio ambiente vai nortear as relações entre Brasil e EUA, e que acordos comerciais entre os dois países e a entrada do Brasil na OCDE, por exemplo, dependem da latitude do plano que o governo Jair Bolsonaro vai apresentar na cúpula organizada por Biden, entre os dias 22 e 23 de abril.
"As relações entre nossos países dependerão muito dessa postura ambiental do Brasil", disse Chapman. O diplomata afirmou que existe uma percepção de que o desmatamento ilegal na Amazônia cresceu muito e que esse "não é um problema de comunicação", como justificam auxiliares de Bolsonaro, mas uma realidade que precisa ser revertida, inclusive com o envolvimento do setor privado.
De acordo com dados divulgados pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o desmatamento na Amazônia voltou a bater recordes em março e foi o maior dos últimos seis anos. A destruição da floresta no mês passado teve crescimento de 12,6% em relação ao mesmo período de 2020, ano em que o desmatamento atingiu os níveis mais elevados em 12 anos, mesmo em meio à pandemia da Covid-19.
O embaixador americano classificou a cúpula do clima como "uma oportunidade" para o Brasil virar o jogo e resgatar a preocupação ambiental diante dos olhos do mundo, e disse que o país vai "se tornar herói" se fizer uma "declaração contundente" e retomar seu papel de protagonista no debate sobre meio ambiente.
A mensagem foi vista pelos participantes da reunião como a forma mais firme de traçar as prioridades da agenda de Biden e dar um ultimato a Bolsonaro diante de influentes nomes dos setores público e privado, que podem capitanear pressões sobre o Planalto quando o assunto for mudanças climáticas.
Os EUA querem que o Brasil se comprometa durante a cúpula com metas objetivas de redução de desmatamento ilegal, zerando a prática até 2030, e apresente resultados ainda neste ano.
O ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), por sua vez, insiste na ideia de que o Brasil vai se comprometer com números apenas se receber dinheiro antecipado de países estrangeiros, mas os americanos condicionam o financiamento a resultados concretos.
Nos últimos dias, equipes técnicas dos governos brasileiro e americano mergulharam em uma série de reuniões em busca de um acordo. Chapman conversou nesta semana também com Salles e com integrantes da Apib (Articulação dos Povos Indígenas), que pediram abertura de um canal direto com o governo Biden para tratar da preservação da Amazônia. A entidade questiona o comprometimento americano com uma gestão como a de Bolsonaro, que patrocina políticas ambientais negligentes.
Entre os convidados para a reunião com Chapman no domingo, estavam o ex-ministro da Justiça Sergio Moro e o ex-embaixador dos EUA no Brasil Rubens Barbosa, que quis saber o motivo de o Brasil ter ficado de fora da primeira viagem do enviado de Biden à América do Sul.
Diretor sênior para o Hemisfério Ocidental no Conselho de Segurança Nacional, Juan Gonzalez viajou nesta semana para Colômbia, Argentina e Uruguai na esteira da agenda verde e da pandemia. Chapman respondeu que Gonzalez passaria pelos países onde as conversas estavam mais avançadas, o que foi entendido pelos presentes como a sinalização de que as tratativas com o Brasil não caminham no ritmo desejado.
Moro, por sua vez, perguntou se haveria alguma coisa que o setor privado pudesse fazer caso o governo brasileiro não cooperasse com o meio ambiente, e ouviu de Chapman que muitas empresas americanas estão exigindo uma resposta mais contundente sobre meio ambiente, porque não querem pagar a conta de quem está envolvido com ilegalidades e desmatamento. Segundo o diplomata, não há marca melhor que "salvar a Amazônia", e é preciso um acordo global sobre mercado de carbono.
Outro tema em que Chapman destacou a necessidade de envolvimento do setor privado foi o 5G. Os EUA tentam banir ou ao menos limitar a participação da empresa chinesa Huawei no leilão da frequência no Brasil.
O embaixador disse que a decisão sobre a tecnologia é do Brasil, mas que é preciso decidir se o país quer "tecnologia de ponta ou tecnologia sem compromisso com proteção de dados".
"O setor privado precisa se manifestar", insistiu Chapman.
O argumento dos americanos é que a Huawei repassa informações sigilosas ao governo chinês, o que ameaça a segurança de dados do Brasil e a cooperação com os EUA.