França renova Legislativo com maioria de Macron ameaçada por aliança de esquerda
A eleição legislativa acontece em dois turnos, neste domingo (12) e no próximo (19).
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(FOLHAPRESS) - Menos de dois meses após ser reeleito com uma vitória sobre a ultradireita, Emmanuel Macron disputa a continuidade de seu projeto de governo com o outro extremo do semicírculo político, a ultraesquerda.
Dessa vez, a aliança arquitetada por Jean-Luc Mélenchon ameaça atrapalhar os planos do presidente francês de conquistar a maioria absoluta na Assembleia Nacional, passo crucial para implementar seus planos de reformas. A eleição legislativa acontece em dois turnos, neste domingo (12) e no próximo (19).
A Assembleia é formada por 577 deputados. Para uma coligação conseguir a maioria absoluta, é preciso vencer 289 cadeiras. É em torno desse número que o resultado da votação se tornou incerto. Se há cinco anos a aliança liderada pelo partido de Macron abocanhou 350 assentos, agora a ampla margem pode ser perdida para a união das siglas de esquerda, um novo elemento no cenário partidário francês.
O obstáculo que vem sendo imposto ao presidente foi anunciado pelo próprio Mélenchon poucos minutos após confirmada a reeleição, em 24 de abril. Em seu discurso, vislumbrou uma frente unida que fosse capaz de criar um "terceiro turno" e de transformá-lo em primeiro-ministro. Nos dias seguintes, liderou conversas com outros partidos e, no começo de maio, avisou que a aliança estava formada.
Batizada de Nupes (Nova União Popular Ecológica e Social), a chapa une, além da França Insubmissa, socialistas, comunistas e verdes, que, somados, receberam 30% dos votos no primeiro turno presidencial -em terceiro lugar, Mélenchon obteve 21,95%. De improvável, devido às divergências entre as siglas sobre pontos do programa comum e reprovações de alguns de seus políticos ilustres, a aliança passou a ser a segunda maior força desta campanha e tem chance de virar o maior bloco de oposição na Assembleia.
Segundo o instituto Ipsos, a Nupes e a coligação de Macron, chamada de Juntos, estão empatadas, com 27,5% e 28% das intenções de voto, respectivamente. Em terceiro, com 20%, aparece o partido de Marine Le Pen, derrotada por Macron. No entanto, devido às regras do pleito legislativo, que não é proporcional, esses percentuais não refletem o número de deputados que podem vencer por cada bloco político.
No levantamento divulgado na quarta (8), a projeção de cadeiras que a chapa em torno do presidente poderá obter é entre 275 e 315, enquanto a aliança de esquerda ficaria com uma cifra entre 160 e 200. A sigla de Le Pen, Reunião Nacional, que não fez alianças, aparece com algo entre 20 e 55 cadeiras.
A diferença entre as duas forças que lideram diminuiu. Há cerca de 15 dias, o grupo pró-Macron tinha entre 290 e 330, ante 165 e 195 da Nupes. De acordo com o instituto, apesar da vantagem, a maioria presidencial não está garantida. Pelas regras, para vencer no primeiro turno, um candidato precisa ter mais da metade dos votos válidos e ao menos 25% do total do eleitorado, algo difícil de acontecer –em 2017, somente quatro deputados ganharam na primeira rodada.
Quando não há vencedor, o segundo turno é realizado entre aqueles que tenham recebido ao menos 12,5% dos votos do total do eleitorado.
Segundo analistas, ao disputar cada distrito sob uma mesma chapa, as siglas de esquerda aumentam suas chances de chegar ao segundo turno, já que, em um cenário fragmentado, um único partido tem dificuldades de atingir os 12,5%. "Foi um golpe de mestre de Mélenchon. Trata-se de um dado inédito e importante, que terá consequências partidárias para além desta eleição", avaliou o cientista político Jérôme Jaffré, pesquisador da universidade Sciences Po, ao jornal Le Figaro.
Além disso, Macron teria subestimado o fato de não ser mais novidade, como há cinco anos, e a rejeição de parte dos eleitores, muitos dos quais só votaram nele para evitar que a vencedora fosse Le Pen. A pesquisa mostra que, para 62%, a ação do governo após a eleição tem sido "muito lenta". O poder de compra, um dos principais temas do pleito presidencial, segue como a maior preocupação dos franceses.
Além de ter hesitado em relação à definição do gabinete ministerial, anunciado quase duas semanas após a sua posse, Macron também evitou fazer grandes anúncios sobre os rumos do seu segundo mandato durante a campanha legislativa, o que, segundo a oposição, acabou por esvaziar o debate das propostas.
Mélenchon, por sua vez, continua a prometer, como na campanha presidencial, o aumento do salário mínimo, o congelamento de preços e o controle de aluguéis, além de se contrapor a um dos principais projetos de Macron, o aumento da idade da aposentadoria, de 62 para 65 anos, o que, segundo o presidente, poderia acontecer daqui a um ano. O ultraesquerdista defende que o limite caia para 60 anos.
Desde a semana passada, diante da dinâmica captada pelas pesquisas, ministros próximos a Macron subiram o tom contra os adversários de esquerda, classificados como um "casamento forçado" com fins meramente eleitorais, não para "levar o país adiante". Nos últimos dias, o debate se concentrou na atuação das forças policiais, criticadas pela truculência contra torcedores antes da final da Champions League e pela morte de uma mulher durante uma blitz de estrada no fim de semana. "A polícia mata", publicou Mélenchon no Twitter, levantando nova onda de críticas, inclusive do próprio Macron.
O presidente aproveitou o episódio para apostar em uma campanha do medo, assim como fez na reta final contra Le Pen. "Nada seria mais perigoso do que acrescentar à desordem global a desordem na França que os extremos propõem", disse ele nesta quinta.
Além da conquista da maioria absoluta, outra incerteza ronda o Palácio do Eliseu: a permanência ou não de 15 ministros que também são candidatos a uma vaga na Assembleia. Segundo diretriz do presidente, os derrotados terão que deixar o gabinete.
Uma coisa, porém, parece certa e pode interferir nos resultados. Estima-se que a abstenção se aproximará de 54%, o que seria um recorde e tende a beneficiar a coligação de Macron. "A despolitização pode favorecer uma maioria presidencial, mas é uma lembrança brutal do fraco apoio que o presidente tem na opinião pública", escreveu Brice Teinturier, vice-diretor da Ipsos.