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Premiê da Holanda pede desculpas por legado de escravidão do país

"Hoje eu peço desculpas. Durante séculos, o Estado holandês e seus representantes permitiram e estimularam a escravidão e lucraram com isso", disse Mark Rutte

Premiê da Holanda pede desculpas por legado de escravidão do país
Notícias ao Minuto Brasil

06:30 - 20/12/22 por Folhapress

Mundo Holanda

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O primeiro-ministro da Holanda, Mark Rutte, pediu desculpas nesta segunda-feira (19) em nome do Estado holandês por seu papel histórico na escravidão e reconheceu que o tráfico negreiro praticado pelo país foi um crime contra a humanidade.

"Hoje eu peço desculpas. Durante séculos, o Estado holandês e seus representantes permitiram e estimularam a escravidão e lucraram com isso", disse Rutte em um discurso transmitido pela televisão, a partir dos Arquivos Nacionais, em Haia.

"É verdade que ninguém vivo hoje carrega qualquer culpa pessoal pela escravidão. No entanto, o Estado holandês carrega a responsabilidade pelo imenso sofrimento que foi feito para aqueles que foram escravizados e seus descendentes."

Rutte também pronunciou as desculpas em inglês, papiamento e surinamês, línguas faladas nas ilhas do Caribe e no Suriname.

O pedido de desculpas é uma resposta ao relatório "Correntes do Passado" -elaborado por um painel consultivo formado depois do assassinato de George Floyd, nos Estados Unidos, em 2020- e ocorre em meio a uma reconsideração mais ampla do passado colonial do país, incluindo esforços para devolver obras de arte saqueadas.

A data escolhida pelo governo para se desculpar, que vazou para a imprensa holandesa em novembro, provocou uma polêmica feroz no país e no exterior. As organizações de memória contra a escravidão queriam as desculpas em 1º de julho de 2023, data em que é lembrado o fim da escravidão em uma celebração anual chamada "Keti Koti" (quebrar as correntes) no Suriname.

"São necessários dois para dançar um tango -desculpas devem ser recebidas", disse Roy Kaikusi Groenberg, da Fundação de Honra e Recuperação, uma organização afro-surinamesa holandesa.

Ele disse, contudo, que parecia errado que ativistas descendentes de escravos lutassem por anos para mudar a discussão nacional sobre o tema mas não tivessem sido suficientemente consultados. "A maneira como o governo está lidando com isso está parecendo um arroto neocolonial", afirmou.

Ao mesmo tempo em que Rutte discursava em Haia, vários de seus ministros estavam presentes nas ex-colônias de Bonaire, São Martinho, Aruba, Curaçao, Saba, Santo Eustáquio e Suriname, para discutir o tema com os habitantes locais.

A primeira-ministra de Aruba, Evelyn Wever-Croes, disse nesta segunda que o pedido de desculpas foi bem-vindo e é um "ponto de virada na história do Reino".

Os membros do painel afirmaram que a participação holandesa na escravidão representou crimes contra a humanidade e, no ano passado, recomendaram um pedido de desculpas e reparações.

Mas o premiê descartou as reparações em uma entrevista coletiva na semana passada, embora o governo holandês esteja estabelecendo um fundo educacional de € 200 milhões (R$ 1,1 bilhão) para promover a conscientização sobre crimes e abusos cometidos no período.

"O que faltou completamente neste discurso foi responsabilidade e prestação de contas", disse Armand Zunder, presidente da Comissão Nacional de Reparações do Suriname, embora tenha dito que o pedido de desculpas foi um "passo à frente".

"Se você reconhece que crimes contra a humanidade foram cometidos, o próximo passo é dizer que sou responsável por isso, somos responsáveis por isso. Na verdade, estou falando de reparações."

No início deste mês, o rei da Holanda determinou a abertura de uma investigação independente sobre o papel da monarquia durante o período colonial.

Os holandeses desempenharam um papel importante no comércio global de pessoas escravizadas durante os séculos 17 a 19. A Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, formada por mercadores do país, operou navios que traficaram ao todo cerca de 600 mil pessoas, segundo dados do Estado holandês.

As pessoas escravizadas foram forçadas a trabalhar sob condições duras e desumanas em plantações nas colônias holandesas ultramarinas no Caribe e na América do Sul. No Brasil, os holandeses entraram em confronto com forças de Portugal e instalaram uma colônia no Nordeste, com sede no Recife, de 1630 a 1654.

A escravidão foi abolida no Suriname e em outros territórios controlados pela Holanda em 1º de julho de 1863, mas não terminou antes de 1873, depois de um período de transição de 10 anos.

Muitos holandeses se orgulham da história naval do país e de suas proezas como nação comercial. No entanto, as crianças aprendem pouco sobre o papel no comércio de escravos desempenhado pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais e pela Companhia Holandesa das Índias Orientais, principais fontes de riqueza nacional.

Apesar da reputação holandesa de tolerância, o racismo é um problema significativo no país. Cidadãos de ascendência antilhana, turca e marroquina relatam altas taxas de discriminação em suas vidas cotidianas e estudos recentes mostraram que eles enfrentam desvantagens significativas no mercado de trabalho.

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