Eleição no Japão pode derrubar primeiro-ministro que acaba de assumir
Pesquisas divulgadas nesta semana por alguns dos principais jornais japoneses, Asahi Shimbun, Yomiuri Shimbun e o financeiro Nikkei, indicam que o PLD, mesmo quando somado à legenda aliada, Komeito, pode não alcançar as 233 cadeiras necessárias para a maioria. Quando o Parlamento foi dissolvido, no dia 8, o PLD somava 256 cadeiras, o Komeito, 32.
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Mundo JAPÃO-ELEIÇÕES
NELSON DE SÁ
PEQUIM, CHINA (FOLHAPRESS) - A eleição parlamentar deste domingo (27) no Japão, para a Câmara Baixa, pode tirar a maioria do Partido Liberal Democrático (PLD) e, no limite, levar à queda do primeiro-ministro Shigeru Ishiba, que ainda não completou um mês no cargo.
Pesquisas divulgadas nesta semana por alguns dos principais jornais japoneses, Asahi Shimbun, Yomiuri Shimbun e o financeiro Nikkei, indicam que o PLD, mesmo quando somado à legenda aliada, Komeito, pode não alcançar as 233 cadeiras necessárias para a maioria. Quando o Parlamento foi dissolvido, no dia 8, o PLD somava 256 cadeiras, o Komeito, 32.
A principal explicação é um escândalo de contas secretas do partido, que está completando um ano e envolveu sua facção dominante até recentemente, identificada com o ex-primeiro-ministro Shinzo Abe (1954-2022) e agora dissolvida.
Fundos de campanha de 600 milhões de ienes (R$ 22,5 milhões) não teriam sido declarados. Ao mesmo tempo, o imposto sobre consumo era elevado em 10% no país, contrastando com o privilégio dado aos políticos governistas.
Izuru Makihara, especialista em política e gestão pública e professor da Universidade de Tóquio, diz não acreditar em queda imediata do PLD, mesmo perdendo a maioria, porque ele pode recorrer a partidos hoje na oposição, inclusive negociando votações, não necessariamente cargos.
Mas seria "um golpe duro", causando instabilidade até a eleição para a Câmara Alta, em julho do ano que vem, quando teria mais chance de ser derrubado, na visão de Makihara. Antes, avisa o acadêmico, outras alas podem avaliar que Ishiba não tem como conduzir o partido à vitória -e, desde já, retirá-lo.
Ishiba é da ala considerada moderada da legenda governista, em comparação aos grupos anteriores, mais à direita, mas fracassou em se distanciar do escândalo por manter candidatos vinculados aos fundos secretos. Ele havia se comprometido a reformar o partido.
Na última quinta, o jornal Akahata Shimbun, ligado à oposição, publicou que Ishida teria não só mantido os candidatos acusados, mas estaria financiando suas campanhas. O primeiro-ministro negou, dizendo que a distribuição dos recursos é para diretórios locais e visa fortalecer o partido.
Questionado, Makihara afirmou que o escândalo e seus efeitos políticos ameaçam uma das principais bandeiras dos governos japoneses desde Abe, sob incentivo do governo americano: o aumento nos gastos militares do país, para se contrapor à China.
"A dúvida é se o PLD, enfrentando seu próprio problema com os fundos secretos, está qualificado para aumentar os gastos com defesa", diz ele. "Ishiba falou que vai levar essa questão a uma conclusão firme, mas não creio que será fácil."
Com a mudança recente de governo, para um grupo moderado que fala em "não desacoplar" da China, Pequim se reaproximou. Nas últimas semanas, o chanceler Wang Yi ligou para membros do novo gabinete, saudando a "retomada estável" das relações.
A pesquisa Nikkei/Yomiuri indica crescimento da principal legenda de oposição, o Partido Constitucional Democrático, que poderia chegar a 150 cadeiras. Mas não houve acordo entre este e outros três partidos, Inovação, Comunista e Democrático para o Povo, para as composições locais, reduzindo o risco para a coalizão governista.
Isso pode mudar, segundo Makihara. "Parecia que, apesar da insatisfação com o LDP, muitos eleitores não se dispunham a votar. De repente, com as notícias de que pode perder a maioria, cresce a visão de que não dá para continuar como está. Candidatos do LPD estão tendo dificuldades [em seus distritos]."
O partido domina a democracia japonesa desde 1955, quando foi formado pela reunião de duas legendas conservadoras, incentivada pelos Estados Unidos diante da reunião, pouco antes, dos grupos de esquerda num único partido. Só esteve fora do poder duas vezes, 1993-94 e 2009-12.
Para o professor da Universidade de Tóquio, o escândalo inviabilizou a "governabilidade interna do LPD". Após a dissolução das facções envolvidas, há pelo menos nove candidatos disputando a presidência da legenda. "É como uma cobra cuja cabeça foi cortada e que agora está se debatendo, com pedaços do corpo também cortados."
Mais especificamente, "sem seu financiamento tão obscuro, a capacidade tradicional de governar do PLD diminuirá". Isso se reflete, por exemplo, "na inabilidade para decidir sobre aumento dos gastos com defesa" ou sobre a reforma política no país, que se tornou uma demanda popular.
Questionado sobre a Igreja da Unificação, cuja ligação com alas do partido foi outro escândalo, a partir de 2020, Makihara diz que "ela não desapareceu, de jeito nenhum". Citou candidatos que enfrentam dificuldades em seus distritos "exatamente por seus laços com ela".
Há quatro anos, durante um comício, Shinzo Abe foi assassinado por um jovem que afirmou tê-lo feito pelas ligações do ex-primeiro-ministro com a Igreja da Unificação, que teria levado sua mãe à insolvência financeira. O escândalo que se seguiu derrubou o gabinete da época e forçou o afastamento formal entre a igreja e o partido.
Dos 465 parlamentares a serem eleitos neste domingo, 176 serão representantes de 11 círculos eleitorais em que o país foi dividido. Outros 289 serão representantes de distritos específicos. Os resultados devem ser divulgados na manhã de segunda na Ásia, noite de domingo no Brasil.