Anistia Internacional critica pena de morte para tráfico
Relatório alerta que decisões de vida ou morte foram deixadas nas mãos de promotores —e não de juízes.
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Mundo em cingapura
Em estudo divulgado nesta quarta-feira (11), a Anistia Internacional fez críticas à aplicação da pena de morte para crimes de tráfico de drogas em Cingapura.
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A investigação da ONG, baseada em extensas análises de documentos judiciais, resultou no relatório "Cooperate or Die" ("cooperar ou morrer", em tradução livre).
Reconhecendo que as reformas do direito penal que entraram em vigor em janeiro de 2013 diminuíram o número de pessoas condenadas à morte, o relatório alerta que, por outro lado, elas foram insuficientes e deixaram decisões de vida ou morte nas mãos de promotores —e não nas mãos de juízes.
A legislação cingapuriana prevê como única pena possível para o crime de tráfico de drogas a pena de morte. Na prática, isso significa que o juiz não pode levar em consideração circunstâncias atenuantes relativas aos fatos (quantidade pequena, por exemplo) ou ao autor.
O relatório aponta ainda para o fato de que, muitas vezes, a legislação não diferencia o tráfico da mera posse de substâncias ilícitas.
Chiara Sangiorgio. conselheira da Anistia Internacional sobre pena de morte, disse que "Cingapura está se iludindo se pensa que a pena de morte é uma ferramenta eficaz para reduzir as taxas de criminalidade".
"Cingapura desempenha um papel de protagonismo, tanto na Ásia quanto no resto do mundo. O governo deve sair do impasse gerado por essas reformas para acabar com a pena capital de uma vez por todas", declarou.
COOPERAÇÃO PREMIADA
A principal alteração introduzida pelas reformas foi a possibilidade de condenação a uma pena alternativa à de morte para os suspeitos de crime de tráfico que se dispusessem a colaborar com a polícia. Para a Anistia Internacional, a mudança, aparentemente positiva, acabou por produzir uma injustiça.
Para que o acusado tenha direito à pena alternativa, ele deve provar que atuou apenas como mero "transportador" das drogas e o promotor do caso deve emitir um documento atestando a sua cooperação com as autoridades. Segundo a ONG, esse ponto é problemático porque os promotores têm total liberdade para emitir ou não esses atestados.
Os advogados de defesa não podem estar presentes nos interrogatórios de seus clientes que decidirem cooperar e são apenas informados da decisão sobre a emissão ou não do documento; o mesmo acontece com os juízes dos casos. A possibilidade de recurso dessas decisões é extremamente restrita. O promotor não é obrigado por lei a explicar os motivos de sua decisão nem a indicar que tipo de cooperação o acusado realizou.
Dessa forma, conclui o relatório, o Ministério Público de Cingapura pode unilateralmente decidir quais suspeitos terão direito a serem condenados a uma pena diferente da pena de morte.
CASTIGOS FÍSICOS
Aqueles que conseguem provar que eram apenas "transportadores" e que obtêm o atestado de cooperação com a polícia escapam da pena de morte obrigatória. Alternativamente, eles podem ser condenados à prisão perpétua e a 15 golpes de bengala.
A Anistia Internacional condena a pena de castigo corporal em seu relatório, afirmando que ela é contrária ao direito internacional, assim como a aplicação da pena de morte para crime diferente de homicídio doloso.
DEFESA PRECÁRIA
A partir dos dados oficiais disponíveis para o período entre 1º de janeiro de 2008 e 30 de setembro de 2017, a Anistia Internacional constatou que 23% dos condenados à pena de morte por tráfico de drogas eram estrangeiros.
O relatório indica que o alto índice pode ser causado pelo fato desses acusados desconhecerem a língua local e dependerem dos esforços das embaixadas de seus países para se defenderem judicialmente.
Nos anos 90, Cingapura liderou o ranking mundial de número de executados por crimes em relação à população total do país, segundo um relatório publicado pelas Nações Unidas em 2001.
Após uma condenação à pena de morte, a possibilidade de recurso é ínfima, alerta o estudo. Somente são aceitos recursos que se baseiam em erro judicial, e, além disso, exige-se sólidas evidências da defesa. Com informações da Folhapress.