Paraguai vê consenso contra aborto e união gay
O país paraguaio é a única nação do Mercosul a proibir a união homossexual em qualquer hipótese
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Mundo América do Sul
Em fevereiro, pela primeira vez na história um filme paraguaio ganhou o Urso de Prata do Festival de Berlim. "As herdeiras", de Marcelo Martinessi, foi premiado nas categorias novas narrativas e melhor atriz, para Ana Brun, que estreou no cinema aos 68 anos.
O ineditismo não foi o único impacto da conquista. A relação de 30 anos de Chela, personagem de Brun, e Chiquita (Margarita Irún) levantou um tabu no país às vésperas das eleições presidenciais.
O choque se viu em 22 de março, na homenagem no Senado ao cineasta e à atriz premiados, em que a maioria dos 45 membros da Casa deixou o plenário para não formar quórum.
A senadora Zulma Gómez, do Partido Liberal, saiu da sessão dizendo em guarani: "Só falta agora que os viados venham se casar aqui".
O Paraguai é o único país do Mercosul a proibir a união homossexual em qualquer hipótese. Na América do Sul, está ao lado de Bolívia, Peru e Venezuela –só são superados pela Guiana, onde a homossexualidade é crime.
No caso do aborto, só permite em caso de risco de morte da mãe, excluindo situações aprovadas no Brasil, como estupro e má formação do feto. Se seguidas as declarações dos presidenciáveis, isso não deve mudar até pelo menos 2023.
Mario Abdo Benítez, do governista Partido Colorado, encampou o discurso contrário desde o início. Já o liberal Efraín Alegre se declarou contra o aborto, mas mudou em relação ao casamento homossexual durante a campanha.
Em seu programa de governo, chegou a cogitar a aprovação de direitos para uniões do mesmo sexo, como herança. Mas chega às urnas a favor da proibição, contrariando seu parceiro de coalizão, a esquerdista Frente Guasú.
Como tampouco os nanicos assumiram a defesa das causas, tanto feministas como pessoas LGBT ficaram em dúvida sobre quem escolher –o voto é obrigatório no Paraguai.
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O ativista Sergio López, da ONG SomosGay, vê a mudança de Alegre como eleitoreira. Para ele, a sociedade está muito mais favorável às reivindicações dos LGBTs do que em épocas anteriores.
"Entendemos esses discursos que saem nesta época de eleições como uma discussão forçada. A sociedade não é mais tão conservadora como o que se mostra na política eleitoral."
Ele, que se casou na Argentina, não consegue regularizar a união. "Somos cidadãos que temos as mesmas obrigações que os outros, pagamos impostos, mas não somos reconhecidos pela legislação."
Constituição limita 'casal' à união de homem e mulher. A lei é o principal amparo dos grupos contrários ao aborto e ao casamento gay. Diferentemente da brasileira, a Constituição paraguaia delimita casal como aquele formado por homem e mulher, e estabelece a proteção da vida desde a concepção.
A advogada de direito penal familiar Dannia Ríos, que lida com casos de abuso infantil, diz que há outras alternativas ao aborto no caso de estupro de uma vulnerável.
"Devemos intensificar a pena aos estupradores, mas não condenar à morte sem sentença. O que se deve fazer é acompanhar a vítima desde o início, de forma integral, e oferecer a alternativa de dar a criança em adoção."
Foi o caso de uma menina de 11 anos de Assunção estuprada pelo padrasto em 2014 e que teve o filho. O caso levou a críticas de organizações como a Anistia Internacional e a Human Rights Watch.
Sobre o casamento homossexual, ela alega temer o ensino às crianças. "Se a união de pessoas do mesmo sexo fosse legalizada, seria o mesmo que considerar como algo correto, como algo bom, que deva ser ensinado às crianças. É a isso que nos opomos."
Ríos é candidata a deputada entre uma série de postulantes que tenta se eleger ao Congresso com o lema de defesa da família e da vida.
Quase um mês após o evento no Senado, Martinessi disse achar positivo que seu filme tenha levantado discussão.
"Ficamos surpresos com a exposição que teve em uma sociedade que nunca debate esses temas", disse ele. "Tomara que isso sirva para aumentar a reflexão sobre uma classe política muito voltada ao passado e em um país perdido politicamente." Com informações da Folhapress.