Meteorologia

  • 22 NOVEMBRO 2024
Tempo
--º
MIN --º MÁX --º

Edição

'Acabou a época da patifaria', diz Bolsonaro em ato pró-golpe

E e gritou palavras de ordem como "agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada".

'Acabou a época da patifaria', diz Bolsonaro em ato pró-golpe
Notícias ao Minuto Brasil

00:01 - 20/04/20 por Folhapress

Política Irresponsável

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Em cima da caçamba de uma caminhonete, diante do quartel-general do Exército e se dirigindo a uma aglomeração de apoiadores pró-intervenção militar no Brasil, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou neste domingo (19) que "acabou a época da patifaria" e gritou palavras de ordem como "agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada".

"Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil", declarou o presidente, que participou pelo segundo dia seguido de manifestação em Brasília, provocando aglomerações em meio à pandemia do coronavírus.

"Chega da velha política. Agora é Brasil acima de tudo e Deus acima de todos."Todos têm que ser patriotas, acreditar e fazer sua parte para colocar o Brasil no lugar de destaque que ele merece. Acabou a época da patifaria. É agora o povo no poder. Mais que direito, vocês têm a obrigação de lutar pelo país de vocês", afirmou Bolsonaro, que tossiu e levou a mão à boca ao final do discurso.

Veja também: Barroso: é assustador ver manifestações pela volta do regime militar

"O que tinha de velho ficou para trás. Nós temos um novo Brasil pela frente. Todos no Brasil têm que entender que estão submissos à vontade do povo brasileiro", disse. "Contem com o seu presidente para fazer tudo aquilo que for necessário para manter a democracia e garantir o que a de mais sagrado, a nossa liberdade", completou o presidente.

A fala de Bolsonaro e sua participação nesse ato em Brasília, no Dia do Exército, provocaram fortes reações no mundo jurídico e político.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse ser uma "crueldade imperdoável com as famílias das vítimas" pregar uma ruptura democrática em meio às mortes da pandemia da covid-19.

"O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo. É mais trabalhoso, mas venceremos", escreveu Maia. "Em nome da Câmara dos Deputados, repudio todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição."

"Não temos tempo a perder com retóricas golpistas. É urgente continuar ajudando os mais pobres, os que estão doentes esperando tratamento em UTIs e trabalhar para manter os empregos. Não há caminho fora da democracia", afirmou.

O governador João Doria (PSDB) disse ser "lamentável" que o presidente "apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o AI-5". O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) também chamou de "lamentável" a participação de Bolsonaro. "É hora de união ao redor da Constituição contra toda ameaça à democracia."

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo, disse à coluna Mônica Bergamo, da Folha que "só pode desejar intervenção militar quem perdeu a fé no futuro e sonha com um passado que nunca houve". Gilmar Mendes, também do STF, disse que "invocar o AI-5 e a volta da ditadura é rasgar o compromisso com a Constituição e com a ordem democrática".

O presidente Nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, disse que "a sorte da democracia brasileira está lançada" e que está é a "hora dos democratas se unirem, superando dificuldades e divergências, em nome do bem maior chamado liberdade".

A escalada do tom de Bolsonaro ocorre em um momento de isolamento político do presidente. Reportagem da Folha de S.Paulo deste sábado mostrou que os adversários de Bolsonaro, e hoje ele os tem em todas as esferas de poder, desistiram de uma acomodação com o presidente.

A avaliação prevalente, ouvida pela reportagem nas cúpulas do Legislativo, do Judiciário e em estados, é a de um paradoxo: a fraqueza política de Bolsonaro só tende a acirrar sua agressividade no embate, o que ocorreu neste final de semana em Brasília.

No sábado, na rampa do Planalto diante da Praça dos Três Poderes, Bolsonaro afirmou que a política de enfrentamento ao novo coronavírus "mudou um pouco" desde a sexta (17) -quando houve a troca de Luiz Henrique Mandetta por Nelson Teich no Ministério da Saúde- e voltou a se queixar de prefeitos e governadores por adotarem medidas de isolamento social.

Bolsonaro também responsabilizou o STF (Supremo Tribunal Federal) por determinar que os demais entes federados têm poder para ordenar o fechamento de comércios. Neste momento do vídeo em que falou aos seguidores, Bolsonaro apontou o dedo para a sede do Supremo, do outro lado da praça.

Só na semana passada, o presidente criticou o Supremo Tribunal Federal, sugeriu que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, conspirava para derrubá-lo e ainda agudizou a crise do coronavírus ao demitir seu ministro da Saúde.

O presidente nega a gravidade da pandemia e promove passeios e aglomerações em Brasília, ao contrário do que recomenda a OMS. Bolsonaro demitiu seu então ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, por discordar de seu posicionamento técnico sobre a pandemia.

Além da gestão Bolsonaro, outros governos que ignoram a seriedade da doença são Turcomenistão, Nicarágua e Belarus.

Como mostrou a Folha de S.Paulo neste domingo, Bolsonaro tem intensificado estratégia de blindagem política para tentar evitar que os efeitos da pandemia sejam usados contra ele na disputa eleitoral de 2022.

O plano consiste, neste primeiro momento, na defesa pública de que o coronavírus se trata de uma adversidade pequena, que não justifica medidas restritivas que podem aumentar o desemprego no país.

A ideia é que, ao se antecipar agora sobre os impactos econômicos que são praticamente inevitáveis, o presidente explore, na corrida eleitoral, a retórica de que a sua postura era desde o início a mais acertada, mesmo que contrariando as recomendações das autoridades de saúde.

Neste domingo, além de Brasília, ocorreram manifestações em diferentes pontos do país, como Salvador, São Paulo e Manaus. Além de ataques ao Supremo e ao Congresso e de pedidos pela volta do regime militar, os manifestantes pediram a volta ao trabalho e a abertura do comércio.Houve discursos em defesa do isolamento vertical, quando só os grupos de risco ficam em isolamento. Em Brasília, no ato que teve a participação de Bolsonaro, a volta à normalidade e a reabertura do comércio também estiveram na pauta dos manifestantes.

No quartel-general do Exército, o grupo era formado por algumas centenas de pessoas, muitos com faixas pedindo um novo AI-5 e intervenção militar. Ao verem Bolsonaro chegar, os manifestantes se aglomeraram para ouvir o presidente.

Além de defender o governo e clamar por um novo AI-5 -o mais radical ato institucional da ditadura militar (1964-1985), que abriu caminho para o recrudescimento da repressão- os manifestantes aglomerados em frente ao quartel-general defenderam o fechamento do STF e miraram no presidente da Câmara, Rodrigo Maia .

As carreatas pelo país com apoio de Bolsonaro neste domingo ocorreram no momento em que o número de mortes pelo coronavírus chegou a 2.462 no Brasil. Em 24 horas, foram registrados 115 óbitos pela doença. Os dados foram divulgados neste domingo pelo Ministério da Saúde. Ao todo, são 38.654 casos confirmados.

O ministério, porém, afirma que a tendência é que o número real de casos seja maior, já que apenas pacientes internados em hospitais fazem testes e há casos que ainda esperam confirmação. Reportagem da Folha mostrou que equipes de atenção básica em várias cidades e estados afirmam que tem havido subnotificação.

As carreatas pelo fim do isolamento ocorrem no momento em que apoio à quarentena como forma de evitar a disseminação do novo coronavírus sofreu uma queda nas duas últimas semanas, mas ainda é majoritária entre os brasileiros.

Segundo o Datafolha, são 68% aqueles que dizem acreditar que ficar em casa para conter o vírus é mais importante, ainda que isso prejudique a economia e gere desemprego.No levantamento anterior do instituto, feito de 1º a 3 de abril, eram 76%. A pesquisa atual ouviu 1.606 pessoas na sexta (17) e tem margem de erro de três pontos percentuais.

Essa queda não se reverteu integralmente em apoio à afirmação contrária, de que vale a pena acabar com isolamento social em nome da reativação econômica. O índice dos que concordam com isso oscilou positivamente de 18% para 22%, enquanto aqueles que não sabem foram de 6% para 10% no período.

O debate, visto por especialistas tanto em economia como em saúde como desfocado e politizado, tem pautado polêmicas envolvendo Jair Bolsonaro (sem partido).Depois de minimizar a gravidade da Covid-19, a comparando a uma "gripezinha", o presidente passou a insistir no foco do impacto econômico das quarentenas.

No cálculo, está o temor de que a recessão que provavelmente seguirá a emergência sanitária do Sars-CoV-2 solape seu apoio em cerca de um terço do eleitorado.Em oposição, governadores como João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ), assumiram a linha de seguir as recomendações internacionais de saúde, priorizando o isolamento.

O resultado é uma queda de braço que marca a organização do combate à pandemia no Brasil e já deixou vítimas políticas no caminho.

Luiz Henrique Mandetta perdeu o cargo de ministro da Saúde na quinta (16), entre outros motivos, por não concordar com as diretrizes de Bolsonaro sobre o isolamento social.O Supremo Tribunal Federal interveio e decidiu na quarta (15) que os estados e municípios têm liberdade para impor as restrições que decidirem durante a crise.Isso contrariou o presidente Bolsonaro, que se queixou de estar de mãos atadas na questão. Ele queria editar decreto obrigando a reabertura do comércio. Manteve o tom na sexta (17), quando sugeriu que as pessoas desobedecessem as ordens locais.

AS PROJEÇÕES DO PRESIDENTE

FANTASIATese: Após a confirmação do primeiro caso de Covid-19 no Brasil, Bolsonaro disse que o coronavírus era "muito mais fantasia" e se tratava de uma "gripezinha"Realidade: Até o momento, mais de 2 milhões de pessoas foram contaminadas pelo coronavírus e mais de 150 mil morreram por causa da doença no mundo

GRIPESTese: O presidente defendeu que outras gripes virais mataram mais do que o total de pessoas que o coronavírus levaria a óbito e que, portanto, não fazia sentido reagir com histeria à pandemia mundialRealidade: De 2010 a 2019, 1.645 pessoas morreram infectadas no Brasil pelo vírus que causa a gripe nos meses de janeiro a abril. Até agora, o novo coronavírus já provocou mais de 2.000 mortes

CHINATese: Bolsonaro afirmou que os efeitos da pandemia estão superdimensionados e disse que na China, primeiro epicentro da doença, o coronavírus estava "praticamente acabando"Realidade: O número de diagnósticos da doença tem caído na China, mas na sexta-feira (17) foram registrados 357 novos casos

QUARENTENA VERTICALTese: Na tentativa de evitar que recaia sobre seu governo a culpa por um aumento do desemprego, o presidente defendeu a adoção de uma quarentena vertical (apenas para os grupos de risco da doença) e criticou o isolamento horizontal. "A dose do remédio não pode ser excessiva", disseRealidade: A maior parte das unidades da federação, no entanto, seguiu a orientação do Ministério da Saúde e manteve o isolamento horizontal

HIDROXICLORIQUINATese: Na tentativa de reverter um desgaste em sua imagem, Bolsonaro passou a defender a prescrição da hidroxicloroquina, usada para tratar o lúpus e a artrite reumatoide, em pacientes em estágios iniciais do coronavírus. A rede bolsonarista chegou até mesmo a apelidar a substância de "remédio do Bolsonaro"Realidade: As pesquisas científicas apontam que a substância tem demonstrado resultados satisfatórios, mas seu efeito ainda não é conclusivo. Um estudo chinês apontou que a hidroxicloroquina não tem apresentado resultados melhores que os cuidados que costumam ser prescritos para o tratamento da doença

PICOTese: Bolsonaro disse no último dia 12 que parecia que o vírus "estava começando a ir embora"Realidade: Só na sexta-feira foram registradas 217 mortes pelo coronavírus. A previsão do Ministério da Saúde é que o quadro mais agudo ocorra entre maio e junho

Campo obrigatório