Bolsonaro volta a desafiar Supremo ao exaltar apoio militar
A conduta do presidente foi repudiada por integrantes dos Poderes Legislativo e por chefes de Executivo estaduais
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Política Desrespeitoso
BRASIL, DF (FOLHAPRESS) O presidente Jair Bolsonaro mais uma vez prestigiou pessoalmente uma manifestação em Brasília com ataques ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao Congresso, disse estar junto com as Forças Armadas "ao lado do povo" e deu recados intimidatórios.
"Peço a Deus que não tenhamos problemas essa semana. Chegamos no limite, não tem mais conversa, daqui pra frente, não só exigiremos, faremos cumprir a Constituição, ela será cumprida a qualquer preço, e ela tem dupla mão", afirmou Bolsonaro, em declaração transmitida ao vivo neste domingo (3) em rede social.
Um dia após ter se encontrado com os chefes de Exército, Marinha e Aeronáutica, o presidente afirmou que "temos o povo ao nosso lado, nós temos as Forças Armadas ao lado do povo, pela lei, pela ordem, pela democracia e pela liberdade".
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Além de incluir pautas autoritárias, de desrespeitar recomendações sanitárias em meio ao coronavírus e de voltar a atacar as medidas de governadores na pandemia, a manifestação apoiada por Bolsonaro foi marcada desta vez também por ataques ao ex-ministro Sergio Moro, que pediu demissão do governo com acusações ao presidente, e por agressões e ameaças a jornalistas.
A conduta do presidente foi repudiada por integrantes dos Poderes Legislativo e por chefes de Executivo estaduais, como João Doria (PSDB-SP) e Wilson Witzel (PSC-RJ). O presidente do STF, Dias Toffoli, não se pronunciou, e entre os ministros da corte as principais manifestações públicas foram para criticar agressões de bolsonaristas à imprensa.
O ministro Luís Roberto Barroso disse à Globonews que "não se deve lançar as Forças Armadas no varejo da política".
O pano de fundo da nova investida de Bolsonaro é sua irritação com as derrotas que vem sofrendo no Supremo. Com isso, ele busca respaldo entre os militares para reagir ao Judiciário. E tem recebido sinais de apoio nos bastidores, sobretudo em relação às decisões do tribunal que interferem em medidas do governo.
O presidente atacou nos últimos dias a decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes de barrar a nomeação de Alexandre Ramagem, amigo de sua família, para comandar a Polícia Federal, após a acusação de Moro de tentativa de interferência política na corporação. Neste domingo, disse que deve indicar um novo nome nesta segunda-feira (4).
Bolsonaro deixou o Palácio da Alvorada neste domingo e foi até a rampa do Planalto para acenar aos manifestantes, aglomerados, que gritavam "Fora Maia", entre outras coisas. Uma bandeira do Brasil foi estendida na rampa.O presidente disse querer "um governo sem interferência, que possa atrapalhar para o futuro do Brasil". "Acabou a paciência", disse. "É uma manifestação espontânea, pela democracia", afirmou.
Ele repetiu discurso de que estão destruindo os empregos no país. "É inadmissível." Segundo ele, o efeito colateral das medidas de isolamento pode ser mais "danoso" que o próprio coronavírus.
Um grupo de manifestantes se reuniu em frente ao Museu Nacional, em Brasília. Em seguida, foi organizada uma carreata em direção ao Palácio do Planalto. O ato promoveu aglomerações num momento que Brasil tem mais de 7.000 mortes pela Covid-19.
Embalados por palavras de ordem e cartazes com críticas a Moro, chamado de "canalha" e "moleque de Curitiba", apoiadores afirmavam que estão "fechados com Bolsonaro".Ao chegar em frente ao Congresso, o grupo deixou os carros e desceu em direção ao Palácio do Planalto diante da promessa feita por um dos organizadores de que Bolsonaro apareceria para vê-los.
Entre as mensagens dos cartazes havia "Armas para cidadãos de bem", "Fora Maia", "Fora Alcolumbre". Em frente ao STF, alguns gritaram "vamos invadir". "Olé, olé, STF é puxadinho do PT", afirmavam.
Em meio às críticas a Moro, feitas em um microfone de um caminhão de som, uma apoiadora gritou que o ex-juiz é aliado ao centrão. O grupo de partidos, formado por legendas como MDB, PP, PL, Solidariedade, DEM e Republicanos, tem feito tratativas de apoio a Bolsonaro e deve ganhar novos cargos no governo.
No sábado (2), Bolsonaro recebeu os chefes das três Forças Armadas e os generais que integram sua equipe ministerial, em encontro que não estava previsto na agenda oficial.A eles se queixou de estar com dificuldades para governar devido ao que ele chama de "constante interferência do Judiciário". Ele ameaçou fazer uma ruptura institucional, no sentindo de eventualmente descumprir determinações futuras da corte.
Segundo militares ouvidos pela Folha de S.Paulo, as declarações de Bolsonaro em ato deste domingo (3) transmitem essa mensagem. A ala fardada, embora costume atuar como "apagadora de incêndios" de atitudes mais extremadas de Bolsonaro, deu sinais de incômodo com decisões do Supremo.
Não há uma unanimidade, e o comandante do Exército, Edson Pujol, tem se mostrado refratário às atitudes do presidente. Mas outros generais da alta cúpula ainda mantêm um maior alinhamento ao Planalto e têm maior proximidade com o antecessor de Pujol, general Eduardo Villas Bôas, conselheiro de Bolsonaro.
Além da decisão que barrou Ramagem, incomodou o presidente a redução de prazo dada pelo decano Celso de Mello, para 5 dias, para que Moro fosse ouvido sobre acusações contra Bolsonaro. O depoimento ocorreu no sábado.
Entre militares, há um temor de que a corte imponha que o presidente mostre o resultado de seu exame para coronavírus. Bolsonaro diz não ter contraído a doença, mas se recusa a mostrá-lo. Aliados defendem que, mesmo se houver determinação da corte, ele mantenha o sigilo.Neste sábado, Bolsonaro ficou especialmente irritado com uma decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do STF. O magistrado barrou a ordem do governo brasileiro para expulsar diplomatas venezuelanos aliados a Nicolás Maduro do Brasil.
No despacho, o ministro alegou o cenário de pandemia do novo coronavírus para justificar sua decisão, a partir de orientação da PGR (Procuradoria-Geral da República).Nesta semana, o Itamaraty enviou documento à embaixada e aos consulados venezuelanos no país e listou 34 funcionários que deveriam sair do país –junto com seus dependentes– até este sábado.
Pouco mais de uma hora depois de a decisão do ministro ser divulgada, Bolsonaro chamou ao Alvorada os ministros Fernando Azevedo (Defesa), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Augusto Heleno, (Gabinete de Segurança Institucional) e Walter Braga Netto (Casa Civil).Além deles, estiveram presentes os comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica.
A Folha questionou a cúpula das três Forças Armadas sobre os motivos do encontro, a resposta foi unificada e transmitida pelo Ministério da Defesa. Em nota, disse que o encontro serviu para "fazer uma avaliação do emprego das Forças Armadas na Operação de Combate ao Coronavírus, além de avaliação de aspectos da conjuntura".Questionados, nem o Planalto nem os militares deram detalhes sobre quais seriam as ações sobre a pandemia.
Bolsonaro, enquanto isso, tem mantido discurso contrário ao isolamento social e segue promovendo aglomerações.
No sábado, ele visitou duas cidades de Goiás, Cristalina e Alexânia, onde cumprimentou apoiadores e gerou tumulto. Neste domingo, ele foi ao Palácio do Planalto cumprimentar manifestantes que se aglomeraram em frente à Praça dos Três Poderes para demonstrar apoio à sua gestão."
Sobre o ato com ataques ao Congresso e ao Supremo, situações do tipo podem vir a ser enquadradas nas definições legais de crime de responsabilidade. No caso do presidente, tentar ou cometer um crime dessa classe pode levar à perda do cargo, que ocorre por meio de um processo de impeachment.
A previsão legal para isso consta da Constituição e de uma lei de 1950. Pela legislação, cabe ao Congresso autorizar a abertura do processo de impeachment, e o julgamento que decide se houve crime de responsabilidade acontece no Senado. Hoje há cerca de 30 pedidos de impeachment de Bolsonaro em análise pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).