Ex-governador de São Paulo, Laudo Natel morre aos 99 anos
Natel governou São Paulo em duas gestões na ditadura militar (1964-1985).
© Reprodução/São Paulo FC
Política LAUDO-NATEL
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - O ex-governador de São Paulo, empresário e dirigente esportivo Laudo Natel morreu na manhã desta segunda-feira (18), aos 99 anos. A causa da morte não foi divulgada.
O São Paulo Futebol Clube, que foi dirigido por Natel, comunicou o falecimento nas redes sociais e disse lamentar a partida de seu patrono.
"Nosso eterno agradecimento a uma das figuras mais importantes da história de nosso clube pelas décadas de amor incondicional às nossas cores", afirmou. O clube decretou luto de três dias.
Laudo Natel (1920-2020) governou São Paulo em duas gestões na ditadura militar (1964-1985), mas sua influência política desapareceu com a ascensão de seu ex-secretário Paulo Maluf - que o derrotou na convenção da Arena que indicou o candidato do partido a governador, em 1978.
Sua carreira política começou tarde e foi impulsionada, em grande parte, por seus êxitos nos negócios. Filho de um administrador de fazendas, Natel nasceu em São Manuel (SP), em 14 de setembro de 1920.
Quando seu pai morreu, em 1937, ele desistiu de tentar estudar direito e começou a trabalhar como funcionário do Banco Noroeste, em Pirajuí (SP). Lá conheceu sua mulher, Maria Zilda - com quem teria dois filhos, Ivan e Maurício.
No Noroeste ele se tornou amigo de Amador Aguiar, gerente da agência de Lins (SP), com o qual trabalhou como subcontador. Quando o Bradesco foi fundado, em 1943, na cidade de Marília (SP), Amador foi convidado para dirigir o banco, e convenceu Natel a acompanhá-lo.
Mudou-se para São Paulo em 1945, quando a sede do Bradesco foi transferida para a capital e no ano seguinte tornou-se sócio do São Paulo Futebol Clube.
Natel estudou economia na USP e, em 1950, tornou-se um dos diretores do Bradesco. Dois anos depois, assumiu também o Departamento de Finanças do São Paulo.
Convenceu a diretoria do clube a vender seu terreno no Canindé para quitar suas dívidas e iniciar a construção do estádio do Morumbi, com projeto do arquiteto Vilanova Artigas.
Segundo Natel, o Morumbi (que custou cerca de US$ 70 milhões) foi integralmente pago por meio de campanhas, sorteios, venda de cadeiras cativas e de títulos patrimoniais. Mas o clube também recebeu recursos da Prefeitura de São Paulo (em 1956) e do governo estadual (de 1956 a 1958), que somaram US$ 3 milhões.
Em 1958, Natel foi eleito presidente do clube. Passou também a assumir diversos cargos em organismos empresariais - como diretor da Associação Comercial de São Paulo e do Sindicato dos Bancos de São Paulo.
Em 1961 foi convidado para ser candidato a vice-governador, no ano seguinte. Na época as eleições para governador e vice eram separadas. O governador Carvalho Pinto (PDC) lançou seu ex-secretário José Bonifácio Coutinho Nogueira. Como candidato a vice, a coligação lançou Natel.
A eleição ao governo se polarizou entre Jânio Quadros (PTN) e Adhemar de Barros (PSP), que venceu por pequena margem (1.249.414 votos a 1.125.941). Mas, para vice, Natel ganhou com 1.200.807 votos, contra 944.604 de Faria Lima (vice de Jânio) e 543.411 de Teotônio de Barros (vice de Adhemar).
Após a posse, Natel se aproximou do governador - que apoiou abertamente a deposição do presidente João Goulart, em 1964. Em 1965, ainda como vice de Adhemar, Natel concorreu à Prefeitura de São Paulo pelo PR, mas perdeu para o janista Faria Lima: este teve 452.162 votos, contra 198.222 de Natel.
Após vários desentendimentos com o governo federal, Adhemar teve seu mandato cassado em 5 de junho de 1966. O general Castello Branco permitiu a posse de Natel, com a condição de que este aceitasse os nomes indicados pelo Planalto para a Secretaria de Fazenda (Delfim Netto) e para o comando da Força Pública (João Baptista Figueiredo).
Natel concordou e assumiu no dia 6 de junho. Ficou no cargo até 31 de janeiro de 1967. Nesse período, reuniu as 11 usinas hidrelétricas de São Paulo na Cesp (Companhia Energética de São Paulo) e melhorou as finanças estaduais.
Findo seu mandato, Natel se preparou para disputar a próxima eleição para o cargo, intensificando suas idas ao interior. Mas as eleições para governador continuaram sendo feitas de forma indireta, e na prática a decisão cabia ao presidente.
Em 1969, quando ainda presidia o São Paulo, ele convidou o general Costa e Silva para a inauguração do estádio do Morumbi, em 1970. Com a doença e morte do presidente, o general Emílio Médici assumiu o cargo.
Laudo decidiu convidá-lo: "Eu fiquei até em dúvida se devia convidar o Médici, porque já tinha convidado o Costa. Depois eu raciocinei: não estou convidando propriamente a pessoa, estou convidando o presidente. Então ele veio".
Segundo Natel, os assessores de Médici temiam que ele fosse vaiado: "O Morumbi estava lotado, e eu quis que ele entrasse comigo dentro do estádio. A segurança dele, o pessoal de assessoria temia que ele pudesse ser vaiado. Falei: 'Presidente, pode entrar tranquilamente porque eu não posso ser vaiado hoje, e o senhor vai entrar comigo'. Ele entrou e, para sua surpresa, foi uma ovação. Cento e dez mil pessoas de pé, aclamando".
Na opinião de Natel, esse fato contribuiu para sua escolha como governador, em 1970: "Não sei se ele se impressionou também um pouco com isso, o fato é que um dia recebo um telefonema dele e dizia: 'Olha, eu tô lhe convidando pra ser governador de São Paulo e não quero que o senhor agradeça essa indicação porque eu cheguei ao seu nome, eu estou lhe convocando pra repartir comigo uma responsabilidade'. E assim me tornei governador".
Na realidade, apesar de contar com a rejeição do governador Abreu Sodré, Natel tinha o apoio de dois antigos auxiliares, que estavam com Médici: Delfim, então ministro da Fazenda, e Figueiredo, que chefiava o Gabinete Militar.
Natel deixou o cargo de diretor-gerente do Bradesco e assumiu o governo em 15 de março de 1971. Na sua segunda gestão, unificou a malha ferroviária paulista na Fepasa, criou a Sabesp, a Cetesb e a Unicamp, inaugurou as primeiras estações do Metrô de São Paulo e investiu na ampliação das rodovias -setor a cargo de seu então secretário de Transportes, Paulo Maluf.
Tentou articular a prorrogação do mandato de Médici, mas fracassou. Com a posse de Ernesto Geisel na Presidência, em 1974, não teve nenhuma influência na escolha de novo governador -Paulo Egydio Martins.
Em abril de 1978, porém, após a definição do general João Baptista Figueiredo como novo presidente, o presidente Ernesto Geisel permitiu que seu sucessor escolhesse o candidato do Planalto ao governo de São Paulo. Figueiredo indicou Natel. Contrariado, o governador Paulo Egydio não o apoiou.
Confiante na indicação do Planalto, Natel praticamente não fez campanha: seus assessores logo recolheram um abaixo-assinado com o apoio de 876 convencionais.
Enquanto isso, seu ex-secretário Paulo Maluf fez questão de visitar todos os delegados da Arena no Estado. Na convenção do partido, realizada em 4 de junho de 1978, Maluf derrotou Natel por 617 votos a 589.
Natel recorreu à Justiça, alegando que Maluf era inelegível porque era acionista da Fiação e Tecelagem Lutfala, empresa que estava sob intervenção. Mas o recurso foi derrotado no Tribunal Superior Eleitoral por 4 votos a 2.
Aliados de Natel acreditavam que Geisel poderia usar o AI-5, ainda em vigor, para cassar Maluf, mas o presidente nada fez - e Maluf foi eleito governador, indiretamente, em 1º de setembro de 1978.
Em 1982, Natel ainda tentou ser indicado candidato a governador de São Paulo pelo PDS, mas foi derrotado na convenção do partido por Reynaldo de Barros, que tinha o apoio de Maluf.
Depois disso, dedicou-se apenas a suas atividades no setor privado, como diretor da Companhia Sul-América de Seguros.