Maia sobe tom contra Bolsonaro mas deve deixar impeachment na gaveta
A discussão a respeito do impeachment voltou à tona na semana passada depois que Bolsonaro voltou a colocar sob suspeita a lisura das eleições.
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Política BOLSONARO-IMPEACHMENT
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), subiu o tom contra Jair Bolsonaro (sem partido), mas a abertura de um processo de impeachment do presidente da República está descartada. Os pedidos já feitos, contudo, não deverão ser arquivados. Ficarão na gaveta à espera do próximo chefe da Casa.
Até o final da semana passada, já haviam sido protocolados cerca de 60 pedidos.
Se Maia decidisse abrir um processo nos últimos dias à frente da Câmara, seu sucessor teria de, obrigatoriamente, levar o caso adiante a partir de fevereiro, quando os trabalhos do Legislativo serão retomados.
Maia, porém, disse a aliados que não vai abrir nem arquivar nenhum processo. Além de entender que não há ambiente político, o atual presidente da Câmara não quer dar espaço para que apontem oportunismo de sua parte às vésperas de voltar à planície do plenário.
Por outro lado, o deputado não vê espaço para arquivar os pedidos, medida que o tornaria ainda mais alvo dos críticos que insistem que ele tome uma medida mais dura contra Bolsonaro.
A conduta destoa, por exemplo, de medidas do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Antes de deixar o comando dessa Casa, Alcolumbre arquivou todos os 38 pedidos de impeachment de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e do procurador-geral da República, Augusto Aras.
Com a decisão de Maia, os pedidos vão continuar na gaveta do gabinete da presidência da Câmara, que é disputada por Arthur Lira (PP-AL), aliado de Bolsonaro, e Baleia Rossi (MDB-SP) -apadrinhado de Maia em uma aliança que envolve 11 partidos, incluindo siglas da oposição.
O número de pedidos de impeachment deverá aumentar nos próximos dias.
O presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz, vai levar o tema para discussão no Conselho Federal da entidade. "Colocamos em andamento o processo interno", afirmou ele à reportagem.
No último sábado (9), Maia fez críticas contundentes a Bolsonaro nas redes sociais. Em meio às disputas pelo comando da Câmara e sobre a vacina contra a Covid-19, o deputado chamou Bolsonaro de covarde.
"Bolsonaro é covarde", escreveu Maia ao compartilhar uma notícia segundo a qual Bolsonaro teria culpado o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, pelo atraso da vacinação no Brasil.
Horas depois, em nova publicação, Maia escreveu: "Bolsonaro: 200 mil vidas perdidas até agora. Você tem culpa".
Ao jornal Folha de S.Paulo o presidente da Câmara foi além e afirmou que Bolsonaro é irresponsável. "Não podemos mais aceitar um ministro que não entende de saúde e um presidente irresponsável que nega o vírus."
"Todos estamos cansados disso, desse negacionismo e dessa irresponsabilidade. Está na hora de uma reação forte de todos nós, brasileiros, contra a irresponsabilidade do governo", afirmou Maia.
Neste domingo (10), o presidente da Câmara não quis se manifestar. Por outro lado, apoiadores do governo, inclusive os filhos de Bolsonaro, foram às redes sociais disseminar notícias falsas como a filiação de Maia ao PSOL.
A possibilidade de impedimento de Bolsonaro também estremeceu a relação do PT com Baleia Rossi.
A presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), cobrou publicamente o emedebista por causa de uma declaração dada por ele em entrevista à Folha de S.Paulo publicada neste domingo.
Baleia disse que não vê o impeachment de Bolsonaro como caminho e que o processo de afastamento do presidente "não é bom para o Brasil".
"Não há nenhum compromisso, como muitos falam, de abertura de impeachment. É uma mentira. [Dar início] é uma prerrogativa do presidente da Câmara, mas nós precisamos, ainda mais neste momento em que a pandemia dá sinais de crescimento, de estabilidade", disse Baleia, na entrevista.
"Dar resposta a crimes do Executivo é o item 3.6 do compromisso de Baleia Rossi com a oposição. Inclui analisar denúncias de crimes do presidente da República, mesmo que não haja acordo para aprovar impeachment", escreveu Gleisi, em uma rede social.
"Ao negar o que tratamos e fechar essa possibilidade [de abertura de impeachment], Baleia perderá votos no PT", completou a deputada.
Baleia telefonou para a presidente do PT para tentar contornar a situação. Ele também foi às redes sociais para se explicar.
"Falei com a presidente Gleisi agora há pouco. Ressaltei que vou honrar cada compromisso firmado com os partidos de oposição, o que inclui usar todos os instrumentos constitucionais em defesa da democracia. Antecipar juízos agora não ajuda. O que disse à Folha mantém os princípios do que pactuamos", escreveu.
A reportagem não conseguiu falar com a presidente do PT após a publicação de Baleia.
Candidato apoiado por Bolsonaro, Lira também foi às redes sociais para se posicionar contra a abertura de um processo de impeachment.
"Sempre digo que ninguém pode se comprometer ou torcer por um impeachment. Ele é um remédio institucional amargo. E é fruto de uma conjunção de fatores e não uma decisão unilateral do presidente da Câmara. Ainda bem que Rodrigo Maia e seu candidato agora passaram a concordar comigo", afirmou o deputado do PP e líder do centrão.
A discussão a respeito do impeachment de Bolsonaro voltou à tona na semana passada depois que o presidente da República voltou a colocar sob suspeita a lisura das eleições com urnas eletrônicas sem apresentar provas.
Ele disse ainda que, caso não haja voto impresso em 2022, no Brasil ocorrerá algo pior do que a invasão do Congresso dos Estados Unidos por radicais incitados pelo presidente Donald Trump, ídolo de Bolsonaro.
"Se nós não tivermos o voto impresso em 2022, uma maneira de auditar o voto, nós vamos ter problema pior do que os Estados Unidos", disse Bolsonaro a apoiadores na última quinta (7).
No próximo ano, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), responsável por organizar as eleições no Brasil, estará sob o comando do ministro Alexandre de Moraes. Integrante do Supremo, ele é um dos principais alvos de críticas da ala radical bolsonarista dentro e fora do Congresso.
Moraes é responsável pelo inquérito que apura a divulgação de notícias falsas por aliados do presidente e, por isso, alguns deles defendem publicamente o impeachment do ministro.