'Bolsonaro perdeu oportunidade extraordinária no combate à pandemia', diz Temer
"Hoje ele seria um verdadeiro herói, não só para o Brasil, mas para a América Latina. Mas ele perdeu essa oportunidade."
© REUTERS / Adriano Machado (Foto de arquivo)
Política Temer
O ex-presidente Michel Temer (MDB) avalia que o presidente Jair Bolsonaro perdeu "uma oportunidade extraordinária" no combate à pandemia da covid-19. O emedebista avalia que Bolsonaro deveria ter chamado os governadores e os representantes dos demais Poderes no início da crise sanitária para unificar esforços contra a doença e na compra de vacinas.
"Eu acho que o presidente Bolsonaro perdeu uma oportunidade extraordinária", disse Temer na noite desta segunda-feira, 27, em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura. "Hoje ele seria um verdadeiro herói, não só para o Brasil, mas para a América Latina. Mas ele perdeu essa oportunidade."
No início do programa, Temer pediu um instante para fazer "uma breve reflexão", e lamentou o número de vítimas da pandemia, que se aproxima dos 600 mil no País.
Temer também disse, na entrevista, que não tem a intenção de se candidatar ao Executivo nas eleições do próximo ano, seja ao cargo de presidente da República ou mesmo de vice-presidente. Ele afirmou ainda que após os atos de 7 de Setembro, em que o presidente Jair Bolsonaro fez ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF), foi Bolsonaro quem o procurou.
"Eu confesso que isso não está no meu horizonte. Reconheço até que as mais variadas pessoas dizem 'olha, você poderia se apresentar, ajudou a distensionar o País'", disse ele. "Confesso que não está no meu horizonte sair candidato a presidente, muito menos vice."
Temer disse que o presidente Jair Bolsonaro telefonou a ele no dia 8 de setembro, às 20h, e perguntou o que ele havia achado sobre os atos do dia anterior. Na manifestação em São Paulo, Bolsonaro ameaçou descumprir decisões judiciais tomadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF - indicado à Corte por Temer.
O ex-presidente relatou ter dito a Bolsonaro que o presidente levou muita gente às ruas, mas que o que ele disse sobre Moraes fora "inadequado" para um presidente da República. Temer fez o relato ao ser perguntado sobre a entrevista de Bolsonaro à revista Veja, em que o presidente não deixou claro de qual dos dois havia partido a iniciativa do encontro entre eles e da carta divulgada por Bolsonaro após o encontro.
O emedebista enfatizou ter ficado preocupado com o movimento de caminhoneiros que ganhou força nos dias seguintes ao 7 de Setembro, e que relatou essa preocupação a Bolsonaro, para explicar por que o presidente deveria fazer um aceno pacificador ao Judiciário. "(Disse a ele) Isso (consequências de uma greve) não cai no colo de ninguém, cai no seu colo se houver desabastecimento", disse Temer.
O ex-presidente afirmou ainda que se surpreendeu com a reação à carta. "Eu me surpreendi com a repercussão, a bolsa disparou, o dólar caiu", disse. Temer afirmou que "não se arrepende" de ter feito a ponte entre Bolsonaro e Moraes se a pacificação perdurar.
Impeachment
Michel Temer avalia que não seria conveniente iniciar neste momento um processo de impeachment contra Jair Bolsonaro. Ele ressalta que a CPI da Covid pode concluir que o presidente teve "incúria" no combate à covid-19, o que eventualmente pode levar o Ministério Público a pedir o afastamento de Bolsonaro. Entretanto, Temer acredita que o momento não é o ideal para este processo.
"Se você me perguntasse um ano atrás, eu diria que talvez fosse o caso de começar um impedimento. Nesse momento, eu não acho adequado", disse ele, no Roda Viva,. Segundo Temer, o processo de impedimento é "traumático" e, com o mandato de Bolsonaro já em estágio adiantado, esse efeito se ampliaria.
Temer disse que o impeachment, por passar pelo Congresso, é um processo mais político do que jurídico e que, por isso, não consegue avaliar se Bolsonaro cometeu ou não crimes. "Não há condições para avaliar sobre o foco jurídico, porque o foco é sempre político", afirmou.
O ex-presidente ressaltou ainda que processos de afastamento de presidentes dependem de mobilização popular, o que aconteceu no caso da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), mas não no caso dele. "No tocante à senhora ex-presidente, houve as tais pedaladas, e convenhamos, havia muito povo na rua. E se me permite, quem decreta impeachment não é o Congresso Nacional, é o povo na rua. Eu sofri duas tentativas de impedimento. Por que não deu certo? Porque não havia povo na rua", disse.
Os pedidos que estão na Câmara, segundo ele, não devem prosperar porque já estão há tempos esperando análise. O emedebista, que foi deputado federal e presidente da Câmara, acredita que "não seria inútil" fixar um prazo para que o chefe da Casa, responsável por analisar pedidos de impeachment do presidente da República, fizesse essa análise. Ele lembrou que quando comandou a Câmara no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), analisou e arquivou pedidos de afastamento do tucano.
Terceira via
Questionado durante o programa sobre de qual lado ficaria após as eleições presidenciais de 2022 em caso de vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou do presidente Jair Bolsonaro, que lideram as pesquisas, Michel Temer disse que ficará do lado "do MDB". Segundo ele, a senadora Simone Tebet (MDB-MS) o procurou, oferecendo-se como candidata da chamada terceira via. "Eu tenho o maior respeito pela Simone", disse Temer. "Ela me visitou, e disse 'eu estou oferecendo o meu nome para a terceira via, mas se aparecer outra pessoa, eu me retiro'", afirmou o emedebista.