Sérgio Cabral amarga rotina judicial após liberdade e vê candidatura ainda distante
Cabral teve condenações anuladas, mas viu processos serem retomado
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Política Justiça
RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) - Se, em 2023, Sérgio Cabral vivenciou importantes reviravoltas, como voltar à liberdade, ver o afastamento do juiz Marcelo Bretas do cargo e quase virar enredo de escola de samba, em 2024 o ex-governador do Rio de Janeiro encarou uma rotina de decisões que pouco alteraram sua situação jurídica, insuficientes para a concretização do sonho de uma nova candidatura.
Cabral teve condenações anuladas, mas viu processos serem retomados. Voltou a prestar depoimento, já tem outro interrogatório marcado para 2025 e teve negado um pedido para que uma antiga confissão, que agora rejeita, fosse desconsiderada numa ação penal. Ele permanece com a tornozeleira eletrônica.
Cabral ficou seis anos preso preventivamente enquanto respondia a 37 ações penais, 35 relacionadas aos desdobramentos da Operação Lava Jato. Está em liberdade desde dezembro de 2022, mas permanece com um passivo de 33 processos criminais (32 da Lava Jato).
As penas, somadas, chegaram a ultrapassar os 400 anos de prisão. Com a anulação de sentenças e mudanças na dosimetria, elas agora atingem 274 anos.
O ex-governador é acusado de ter cobrado 5% de propina sobre os grandes contratos de sua gestão (2007-2014). As investigações apontaram contas com cerca de R$ 300 milhões no exterior em nome de laranjas, além de joias e pedras preciosas usadas, segundo o Ministério Público Federal, para lavagem de dinheiro.
Inicialmente, o ex-governador negava as acusações. Dois anos depois da prisão, decidiu confessar os crimes. No fim de 2019, fechou um acordo de delação premiada com a Polícia Federal, depois anulado pelo STF em maio de 2021. Após sair da prisão, voltou a negar as denúncias.
A principal aposta do ex-governador para se livrar da maior parte dos processos é a condenação definitiva de Bretas no CNJ (Conselho Nacional de Justiça).
O magistrado foi afastado em fevereiro de 2023 sob suspeita de irregularidades em sua atuação. Ele nega. Os três processos administrativos disciplinares estão na reta final.
Dois têm como origem delações premiadas de advogados que relataram supostas negociações irregulares do magistrado na condução dos processos.
O terceiro se refere a uma queixa do prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), de suposta atuação política na eleição de 2018 em favor do ex-juiz Wilson Witzel, vitorioso daquela disputa e afastado dois anos depois do governo do estado.
Grande parte dos processos de Cabral está paralisada aguardando a decisão do CNJ para avaliar os pedidos de suspeição de Bretas feitos pela defesa do ex-governador.
Outra aposta da advogada Patrícia Proetti, que o defende, é uma reclamação feita ao STF (Supremo Tribunal Federal), na qual questiona a competência de Bretas na Operação Calicute, a primeira contra o ex-governador na Justiça Federal do Rio de Janeiro.
O argumento é de que a denúncia inclui entre as acusações de corrupção o repasse de R$ 2 milhões ao MDB, antigo partido do ex-governador. Para a advogada, a inclusão desse fato deveria levar o processo para a Justiça Eleitoral.
Uma decisão favorável poderia, na avaliação da defesa, gerar um efeito cascata sobre as demais sentenças assinadas por Bretas. O pedido está há mais de um ano nas mãos do ministro Gilmar Mendes para ser analisado.
O magistrado afastado da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro é o responsável por 2 das 4 condenações já confirmadas em segunda instância. Elas integram o rol de decisões colegiadas que impedem, em razão da Lei da Ficha Limpa, o declarado desejo de disputar uma vaga na Câmara dos Deputados.
Outra condenação no mesmo estágio é a proferida pelo ex-juiz Sergio Moro, sobre o suposto pagamento de propina pela empreiteira Andrade Gutierrez em razão das obras do Comperj (Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro).
Em novembro, o ministro Dias Toffoli negou a anulação da sentença com base nos diálogos entre o ex-juiz e os procuradores da Lava Jato de Curitiba revelados pela Vaza Jato e que constam na Operação Spoofing. A defesa recorreu da decisão.
O quarto processo nesse estágio não tem relação com a Lava Jato. Trata-se da condenação por peculato pelo uso considerado abusivo de helicópteros do estado para viagens a Mangaratiba, onde tinha uma casa de veraneio. A defesa tenta sua anulação no STJ (Superior Tribunal de Justiça).
Enquanto busca decisões favoráveis em Brasília, alguns processos voltam a andar na Justiça Federal do Rio de Janeiro. São ações penais que tiveram os atos de Bretas anulados, mas foram redistribuídas para outros juízes.
Em outubro, o TRF-2 (Tribunal Regional Federal da 2ª Região) negou um pedido para que fosse retirado dos autos da Operação Boca de Lobo o depoimento em que Cabral confessava repasses mensais de R$ 150 mil ao ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB) -já absolvido da acusação. Ele prestou novo interrogatório em maio deste ano e negou a acusação.
"O processo deve seguir sua marcha para a frente, não podendo ficar ao sabor de eventuais mudanças de estratégia processual das partes. Não se justifica o desentranhamento de atos processuais válidos, realizados com respeito ao devido processo legal", decidiu o tribunal.
Cabral tem outro interrogatório marcado para fevereiro, na ação penal da Operação Fatura Exposta, que trata de supostos desvios na saúde. Ele chegou a ser condenado no processo, mas a sentença de Bretas foi anulada para que o caso fosse conduzido por outro juiz.
Os autos já contam com dois depoimentos do ex-governador à Justiça: um em que ele nega e outro em que confessa o recebimento de propina. Ele deve voltar a negar o crime.
Em paralelo à rotina judicial, o ex-governador tem mantido contatos políticos. Ele declarou ter prestado consultoria a candidatos nas eleições deste ano.
Nas rede sociais, Cabral tem alternado vídeos na academia, com suas recém-iniciadas aulas de boxe e fotos do período de governo. Também dá dicas de leitura e de séries de streaming. As publicações contam com o apoio de uma especialista em marketing digital.