Relação de Cabral e juiz Marcelo Bretas é de 'cordialidade tensa'
Enquanto o juiz alterna explicações de seus atos e repreensões "afáveis" e mais firmes, o ex-governador mostra veemência ao querer salvar sua imagem e seu governo
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Política Réu
O primeiro encontro entre o juiz Marcelo Bretas e o ex-governador do Rio Sérgio Cabral foi quase protocolar. Enquanto o peemedebista, preso desde novembro, respondia de forma monossilábica às perguntas de seu advogado, Luciano Saldanha, o magistrado se recostou na poltrona e, de braços cruzados, aguardou o fim do depoimento.
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Nos três encontros seguintes, tudo mudou. Cabral decidiu responder ao juiz e falou por quase cinco horas. Ele chegou a ser advertido pelo magistrado, responsável pelas 13 ações penais contra ele, a não transformar o banco dos réus num "palanque".
A relação entre ambos tem sido de "cordialidade tensa". Enquanto o juiz alterna explicações de seus atos e repreensões "afáveis" e mais firmes, o ex-governador mostra veemência ao querer salvar sua imagem e seu governo.
"Uma marca do nosso processo aqui no Rio é nos tratar com uma quase afabilidade. Vez por outra vemos em outros foros algum tipo de disputa, briga de juiz com réu, advogado, MP. Isso não é bom", disse Bretas, ao pedir a Cabral que evitasse classificar como "maluquice" a acusação do Ministério Público Federal, como fez num dos depoimentos à Justiça.
"Meu intuito foi mostrar minha indignação com uma afirmação que julgo não ser verdade", disse o governador.
O magistrado fluminense tem tentado evitar cenas como as ocorridas em Curitiba envolvendo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e Sérgio Moro, protagonistas de ríspidas discussões.
Por isso, Bretas também decidiu explicar a Cabral por que se julgava apto para analisar seus casos. A defesa do ex-governador arguiu suspeição em razão de uma entrevista ao "Valor Econômico".
Contudo, quando o ex-governador buscou retrucar, o magistrado o advertiu. "Não estamos debatendo isso aqui. Só quis fazer esse esclarecimento, porque acho que devo isso", disse o magistrado.
Em outro momento, o ex-governador criticou o fato de Bretas ter escrito em sua decisão que a arguição de suspeição era protelatória. "O sr. falou em protelação, sendo que eu estou preso há oito meses", disse ele. "Eu não lhe dou autoridade para discutir minha decisão comigo. Não vou discutir esse assunto com o sr.", disse Bretas, cortando o assunto.
Antes de responder às acusações, Cabral tem buscado descrever o que considera êxitos de sua gestão à frente do Estado. Bretas busca fazer interrupções quando as falas se alongam.
"Não podemos transformar isso aqui em algum tipo de palanque, como o sr. fez algumas vezes e eu deixei passar", disse o magistrado.
"Estou contextualizando. Não quero palanque. Já tive muitos palanques eleitorais e graças a Deus muito bem sucedidos aqui no Rio", respondeu o ex-governador peemedebista.
INGLÊS SOFRÍVEL
Nos diálogos, Bretas também tenta deixar o ambiente mais leve. Quando Cabral disse que seus pedidos ao empresário Eike Batista eram para projetos sociais, citou uma solicitação para a fundação da cantora Madonna.
"Vi uma gravação do sr. tentando falar inglês. Estava sofrível", comentou o magistrado, em referência a uma entrevista em que Cabral, aparentemente sob efeito de bebida alcoólica, relatava a conversa com a cantora ao lado da ex-presidente Dilma Rousseff, na Sapucaí.
"O sr. viu? Estava sofrível. Fiz tantas apresentações em inglês... Mas aquele dia eu estava animado. Vossa Excelência voltou agora do Caribe de férias. Toma um drinkzinho, uma festa, Carnaval carioca, estava recebendo a Madonna...", disse o peemedebista. Bretas franziu o cenho, indicando não ter gostado da resposta.
Sérgio Cabral deverá ainda prestar ao menos nove novos depoimentos ao juiz Marcelo Bretas. Com informações da Folhapress.