Freixo vê 'crime encomendado' de Marielle e cita grampos em telefone
Vinte dias após assassinato da vereadora e amiga, deputado diz estar acompanhando as investigações de perto, por meio de encontros a cada dois dias com delegado
© Tomaz Silva/Agência Brasil
Política Entrevista
Vinte dias depois do assassinato da vereadora Marielle Franco, o deputado estadual Marcelo Freixo falou sobre como tem sido os dias após a morte da amiga. "Tenho dormido mal, acordo muito à noite, minha cabeça não para de rodar. Lembro da cena da minha mãe abraçando a dona Marinete (mãe de Marielle) e dizendo "sei o que você está sentindo" (Freixo perdeu um irmão assassinado pela milícia em 2006). Senti meu peito rasgando (emociona-se)", comentou.
Freixo diz que tem acompanhado as investigações de perto, e que tem se encontrado pessoalmente com delegado de Homicídios, Fábio Cardoso, a cada dois dias. "Não falo mais nada pelo meu telefone, que tem mais grampo que varal de favela. Tenho contato permanente com o delegado Fábio Cardoso, da Homicídios. Nos falamos de dois em dois dias, pessoalmente. Quem trabalha com Direitos Humanos no Rio, infelizmente, trabalha com morte".
Para o deputado, em entrevista concedida ao O Globo, a morte de Marielle foi encomendada. "Mataram com profissionalismo, sabiam que as câmeras estavam desligadas, que podiam ficar duas horas dentro de um carro, com armas, sem medo de serem abordados. Há linhas de investigações que passam pela Câmara, mas não temos a menor ideia do motivo porque ela nunca sofreu nenhuma ameaça", avaliou.
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Com uma aparência bastante abatida, Freixo também afirmou se responsabilizar pelo que aconteceu. "É o que mais trabalho dentro de mim. Não fui morto não só porque sou homem branco. Depois da CPI das Milícias, ganhei visibilidade, fui muito ameaçado. Agora, tive que reforçar a segurança e tomar mais cuidado com a rotina. Enquanto não sabemos quem fez e qual a motivação do crime, viveremos com medo. Mas há uma gana de resposta. As denúncias sobre milícia triplicaram na Comissão de Direitos Humanos. O prefeito de Nova York ligou perguntando como poderia homenagear Marielle", destacou.
Questionado se, em algum momento, achou que fosse morrer, ele diz que sim. "Em 2011, quando mataram Patricia Acioli (juíza que mandou 60 PMs para a prisão), falei 'opa'. Existia uma lista na época da morte da Patricia, e eu estava no topo dela. Recebi da secretaria de Segurança uma relação de planos para me matar. Tinha gente oferecendo R$ 400 mil".
Ele também falou sobre as ameaças sofridas pelo ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), e sobra os ataques a tiros à caravana de Lula no Sul do país. "É barbárie! Sobre a caravana do Lula, é ruim a fala do Alckmin ("PT colhe o que planta") e do Doria ("o PT sempre utilizou da violência, agora sofreu da própria violência"). A social democracia não pode flertar com o fascismo. Tem que haver condenação, exigência de investigação", considerou.
Para ele, a morte de Marielle traz à tona o debate sobre os direitos humanos. "A morte da Marielle traz o debate de direitos humanos para um front que divide a sociedade entre democracia e barbárie. Não foi movida por ideologia, isso não é direita e esquerda. O que fizeram com ela depois da morte, dizendo que era isso e aquilo, a desembargadora, o xingamento ao padre... Isso é barbárie. O fascismo não é no campo da democracia, é a negação dela", pontuou.
O deputado também voltou a defender a legalização das drogas. "Sou a favor da legalização, é um debate mundial. A pergunta é quem vai controlar o comércio: o estado ou o crime? O caminho não é simples. A questão é redução de danos e saúde pública. Achar que vai legalizar as drogas, no dia seguinte as favelas vão estar empregadas e não vai haver mais violência é uma ilusão. É decisivo para o Brasil a reformulação das polícias", disse, para em seguida negar uma possível candidatura ao governo do Rio.
"Preciso ser candidato a deputado federal para superar a cláusula de barreira (norma que restringe o funcionamento do partido que não alcançar determinado percentual de votos). Há um desafio para que eu seja o mais votado e isso ajuda na disputa à prefeitura daqui a dois anos. Se eu não tiver cumprindo mandato, com essas ameaças que sofro, terei que sair do Brasil e não estou disposto. Vamos ver o que sobra da democracia depois das próximas eleições", completou.