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1ª entrevista pós-eleição: Haddad avalia chegada de Bolsonaro ao poder

Ex-prefeito de São Paulo considera que elite econômica do Brasil abriu mão de seu verniz ao eleger o candidato de "extrema direita"

1ª entrevista pós-eleição: Haddad avalia chegada de Bolsonaro ao poder
Notícias ao Minuto Brasil

10:30 - 26/11/18 por Notícias Ao Minuto

Política Declaração

Em sua primeira entrevista desde que saiu derrotado para o presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), o candidato pestista ao Planalto, Fernando Haddad, fez uma análise do que foi a campanha deste ano e falou sobre suas expectativas para o futuro.

Ao falar com a jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, destacou que já previa uma chegada da extrema direita ao cenário político nacional.

"Eu dizia: Existe uma onda que tem a ver com a crise [econômica] de 2008, que é a crise do neoliberalismo, provocada pela desregulamentação financeira de um lado e pela descentralização das atividades industriais do Ocidente para o leste asiático”, relembrou. "Os EUA estavam perdendo plantas industrias para a China. E a resposta foi [a eleição de Donald] Trump. Isso abriria espaço para a extrema direita no mundo. Mas a extrema direita dos EUA não tem nada a ver com a brasileira. Trump é tão regressivo quanto o Bolsonaro. Mas não é, do ponto de vista econômico, neoliberal. E o chamado Trump dos trópicos [Bolsonaro] é neoliberal", avaliou.

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O ex-prefeito de São Paulo abre um parêntese para dizer que se equivocou em um único ponto quanto à sua previsão. Eu imaginava [há dois anos] que o [João] Doria, que é essencialmente o Bolsonaro, fosse ser essa figura [que se elegeria presidente]. Achava que a elite econômica não abriria mão do verniz que sempre fez parte da história do Brasil. As classes dirigentes nunca quiseram parecer ao mundo o que de fato são", disse.

Questionado sobre por que não pensou em Luiz Inácio Lula da Silva, Haddad afirmou que, já naquela época, não sabia o que poderiam fazer com o ex-presidente. "Fazia a ressalva: eu não sei o que vão fazer com o Lula. Está claríssimo que, se não tivessem condenado o Lula num processo frágil, que nenhum jurista sério reconhece como robusto, ele teria ganhado a eleição. Eu fiz 45% dos votos [no segundo turno]. Ele teria feito mais de 50%", destacou.

Contestado pela jornalista sobre este raciocínio contrastar com a ideia de crescimento da extrema direita, o petista justifica. "O Lula tem um significado histórico profundo. Saiu das entranhas da pobreza, chegou à Presidência e deixou o maior legado reconhecido nesse país. Ele teria força para conter essa onda."

Sobre a posição de Ciro Gomes (PDT) de lançar candidatura própria e de não declarar apoio ao PT no segundo turno, Haddad considerou que ele "errou o diagnóstico".Não houve uma reunião entre o Ciro e o Lula. No final, [quando ficou claro que Lula não poderia concorrer], ele foi sondado por mim e por todos os governadores do PT. Eu sou amigo, gosto do Ciro. Mas ele errou no diagnóstico. E pode voltar a errar se entender que isolar o PT é a solução para o seu projeto pessoal. O PT elegeu uma bancada expressiva, quatro governadores, fez 45% dos votos no segundo turno, 29% no primeiro. É até hoje o partido de centro-esquerda mais importante da história do país."

O ex-prefeito também defendeu o PT do estigma de que não abre mão da hegemonia. "O PT é um player no sentido pleno da palavra. É um jogador de alta patente, que sabe fazer política. Sabe entrar em campo e defender o seu legado."

Ele também analisou o futuro governo Bolsonaro. "A durabilidade desse projeto depende de muitos fatores. Do quanto um eventual aumento da desigualdade no Brasil vai ser compatível com a agenda regressiva que mantém o governo no protagonismo do debate cultural do país. Haverá a tentativa de compra de tempo pela alienação de patrimônio público, seja o pré-sal ou as estatais. Com dinheiro, você ganha tempo para consolidar uma base política para promover as reformas liberalizantes."

Sobre Bolsonaro ser considerado uma ameaça à democracia, Haddad disse que "isso precisa ser bem compreendido".

"O [professor português] Boaventura de Souza Santos usa uma expressão interessante, 'sistemas híbridos', para pensar a realidade contemporânea. Ditadura e democracia eram conceitos bem definidos. Os golpes se davam de fora da democracia contra ela. Hoje, o viés antidemocrático pode se manifestar por dentro das instituições. Ele pode se manifestar na Polícia Militar, na Polícia Federal, no Judiciário, no Ministério Público. O projeto Escola Sem Partido é um projeto autoritário que está nascendo dentro da democracia. O STF pode barrá-lo. Os pesos e contrapesos de uma República moderna vão operar? Se não operarem, você tem o modelo híbrido, com o autoritarismo crescendo por dentro. Estamos já vivendo em grande medida esse modelo. Quando um presidente eleito vem a público num vídeo dizer que os estudantes brasileiros têm que filmar os seus professores e denunciá-los, você está em uma democracia ou em uma ditadura?", questionou o petista.

Fernando Haddad também falou sobre o ex-presidente Lula. "Eu acredito que o Lula pós-eleição está num momento mais difícil. Mas a capacidade de regeneração dele é grande. Já superou um câncer, a perda da esposa, a privação de liberdade."

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