Especialistas veem com cautela limite de mensagens no WhatsApp
O WhatsApp entrou na mira de questionamentos em vários locais do mundo como espaço de disseminação de desinformação
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O WhahtsApp anunciou a limitação do encaminhamento de mensagens para até cinco grupos de conversa (chats). Segundo a empresa, tal medida teve como objetivo reforçar o caráter da plataforma como espaço de trocas de mensagens privadas. A decisão foi uma reação para lidar com o que a companhia chamou de “questão do conteúdo viral”, ou seja, a difusão massiva de informações por pessoas e grupos.
“O WhatsApp avaliou com cuidado essa teste [de limite de encaminhamento] e ouviu o feedback dos usuários durante o período de seis meses. O limite de encaminhamento reduziu significantemente o encaminhamento de mensagens no mundo todo. Começando hoje, todos os usuários da última versão do WhatsApp podem encaminhar apenas cinco mensagens por vez, o que vai ajudar a manter o WhatsApp focado em mensagens privadas com contatos próximos”, informou a empresa por meio de nota ontem (21).
O WhatsApp entrou na mira de questionamentos em vários locais do mundo como espaço de disseminação de desinformação, conteúdos também chamados popularmente de “fake news” (no termo utilizado na língua inglesa). Na Índia, mensagens falsas reproduzidas em massa foram identificadas como fatores de estímulo a linchamentos de pessoas no ano passado. Em razão desse caso, o WhatsApp instituiu no país no ano passado este limite de cinco destinatários como um teste.
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No Brasil, a plataforma também foi questionada pelo papel nas eleições de 2018 em razão da grande circulação de conteúdos falsos. A missão internacional da Organização dos Estados Americanos (OEA) classificou o fenômeno da desinformação no pleito eleitoral como sem precedente.
Uma denúncia do jornal Folha de S.Paulo durante as eleições apontou que disparos em massa pela rede social teriam sido pagos por apoiadores do candidato eleito e atual presidente, Jair Bolsonaro. A campanha dele negou qualquer envolvimento. Frente à denúncia, o WhatsApp informou ter apagado milhares de contas envolvidas na difusão em massa de mensagens. A alegação foi encaminhada ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), dando origem a uma investigação. A defesa pediu o arquivamento da apuração. No processo, o WhatsApp afirmou não ter sido contatado pela campanha do PSL.
Ainda durante as eleições, a plataforma adotou duas medidas para os usuários brasileiros. Passou a identificar as mensagens encaminhadas com o termo em inglês (“forwarded”). Na mesma ocasião da redução dos destinatários para cinco na Índia, estabeleceu o limite de 20 no Brasil. Após o primeiro turno, com a avalanche de mensagens falsas na plataforma, o Conselho Consultivo do Tribunal Superior Eleitoral sobre Internet e Eleições se reuniu com a empresa para cobrar medidas. ONGs e especialistas já haviam indicado nesse momento a limitação de destinatários como um ponto para mitigar a difusão de desinformação.
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Para especialistas ouvidos pela Agência Brasil, a medida pode ajudar a conter a circulação de conteúdos enganosos, mas ainda é preciso avaliar se terá eficácia na prática para impactar a quantidade de desinformação enviada. Na opinião do coordenador de Tecnologia e Democracia do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio), Marco Konopacki, não há clareza se o novo limite vai conter de fato as chamadas "fake news".
Se pode ter algum efeito sobre usuários “comuns”, acrescenta o pesquisador, para agências de marketing digital que usam recursos automatizados de disparo em massa, como no caso da denúncia das eleições brasileiras, dificilmente o obstáculo será efetivo.
“Existem diferentes grupos com distintos interesses utilizando o WhatsApp para fins escusos, não simplesmente para distribuição de notícias falsas, mas aplicando poder computacional intensivo, com recursos de automatização e semi-automatização. Essas fontes automatizadas não se sujeitam a isso [os limites de encaminhamentos], pois têm base de números e enviam por meio delas”, explicou.
A diretora da agência de checagem de fatos Lupa, Cristina Tardáguila, também vê com cautela os impactos da decisão. “A gente precisa acompanhar. Vamos ver como vai ser a implementação. Observar se será mesmo o Brasil ao mesmo tempo, todos os telefones ao mesmo tempo ou alguma coisa escalonada para ver se não teremos algum tipo de desequilíbrio”, disse.
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Tardáguila foi uma das especialistas que defendeu medida nesse sentido durante as eleições, juntamente com outros professores. Para a diretora da Lupa, o debate de fundo é o uso do WhatsApp, uma plataforma inicialmente de mensagens privadas, para a difusão de conteúdos em massa. Outra mudança para reduzir essa condição de circulação em larga escala, acrescenta a diretora, seria a diminuição também das listas de transmissão, recurso que permite ao usuário enviar uma mensagem para 256 contatos de uma vez.
“Você tem a possibilidade de encaminhar uma mensagem para 256 pessoas, que podem também enviar para 256 e assim sucessivamente, tendo um sistema piramidal enorme. Isso precisa ser reavaliado. Quem é que precisa disparar mensagens para 256 destinatários?”, questiona. Ela acrescenta que o número de pessoas em grupos, hoje 256, também deveria ser limitado.
Segundo Cristina Tardáguila, o uso do WhatsApp para promoção de desinformação levanta questionamentos sobre como a proteção das mensagens pela criptografia, um dos recursos da plataforma, contribuiria para o fenômeno. “Não tenho opinião formada sobre isso. Mas criptografia é algo para poucas pessoas guardarem. No momento que você faz um broadcasting você está contando para muitas pessoas. Talvez ele possa não ser criptografado”, cogita.
O diretor do instituto de pesquisa Internet Lab, Francisco Brito Cruz, também avalia que a medida do WhatsApp tem como pano de fundo a tentativa da plataforma se afirmar como espaço de mensagens privadas frente ao uso para difusão massiva, especialmente de informações falsas. Ele acredita que a redução dos destinatários pode “estrangular um pouco o fluxo”, mas que é preciso ver como será a eficácia na prática. O pesquisador considera, no entanto, que, a despeito da circulação de conteúdos enganosos, o recurso da criptografia não deveria ser flexibilizado.
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“Quebrar criptografia pode trazer vulnerabilidade para as pessoas e deixar a plataforma mais insegura para todo mundo, o que cria risco de ser aproveitado para práticas de vigilância. Ela [a criptografia] não tem que ser vista como empecilho, mas como escolha que é importante e que a gente não pode jogar fora o ‘bebê com a água do banho’. Talvez uma das coisas mais importantes do WhatsApp seja a criptografia sob a perspectiva de segurança, de privacidade”, defende. Com informações da Agência Brasil.